A União Soviética deixou praticamente de existir no dia 19 de Agosto de 1991, quando um grupo de comunistas ortodoxos fizeram a última tentativa de salvar o regime através do afastamento de Mikhail Gorbatchov do cargo de Presidente da URSS. Porém, o regime caiu, mas deixou metástases que se continuam a revelar hoje no mundo.

People stand on a barricade in front the Russian White House in Moscow on August 21, 1991. Russia marks on August 19-22, 2011, the 20th anniversary of the abortive 1991 coup against then Soviet president Mikhail Gorbachev. Tanks rolled through Moscow towards the Russian White House, where Boris Yeltsin, leader of the Soviet-era Russian republic at the time, gathered his supporters after denouncing the coup from the roof of a tank, which resulted later in the collapse of the Soviet empire.   AFP PHOTO/ ALEXANDER NEMENOV        (Photo credit should read ALEXANDER NEMENOV/AFP/Getty Images)

Barricadas junto ao edifício do Parlamento russo na sequência da tentativa de golpe militar de 19 de Agosto de 1991. (Alexander Nemenov/AFP/Getty Images)

Acompanhei os acontecimentos de perto e parecia estar a assistir a algo semelhante ao 25 de Abril de 1974 em Portugal, quanto tudo parecia ser esperança e o sonho estava ao virar da esquina. Acompanhei a “revolução das rosas” na Geórgia, a “revolução das tulipas” na Quirguízia e assisti a acontecimentos semelhantes na Ucrânia, durante a “revolução laranja” de 2004, e, como se costuma dizer, “quanto maior é a borracheira, pior é a ressaca”.

Na Rússia, a ressaca começou com a liderança de Boris Ieltsin, depois deste ter realizado o seu sonho de derrubar Gorbatchov e tornar-se senhor absoluto do novo país por ele criado, e continua ainda hoje com o seu sucessor: Vladimir Putin, aquele dirigente que prometeu, há quase 17 anos atrás, modernizar o país, mas pouco mais fez do que envolver o seu país em duas guerras sem fim (Síria e Ucrânia) e substituir os oligarcas pelos amigos cleptocratas.

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Na Ucrânia, a ressaca também não está a ser menos suave. Os ucranianos acreditavam que teriam um lugar na Europa e, depois da primeira desilusão após a “revolução laranja”, vieram para a rua com o mesmo objectivo dez anos depois e o resultado continua a ser o mesmo: um país governado por dirigentes com poucos escrúpulos e corruptos e uma União Europeia sem vontade de dar a mão à Ucrânia, embora não se canse de fazer promessas verbais.

As metástases soviéticas estão também bem presentes em Angola, onde se realiza, por estes dias, o congresso do MPLA, que de movimento de libertação se transformou num clube de pilhadores do seu próprio país. Maioritariamente dirigido por políticos formados na URSS, os dirigentes angolanos aprenderam bem a lição de olha para o que eu digo, mas não para o que eu faço. As palavras pronunciadas por José Eduardo dos Santos, eterno presidente “eleito”, por exemplo, “um dos nossos grandes problemas é o de que temos boas ideias, bons projetos, bons programas, mas quando entramos para a fase de implementação dos mesmos os resultados ficam muitas vezes longe do que se esperava”, podiam ter sido pronunciadas em qualquer congresso do Partido Comunista da União Soviética como constatação do problema.

O mesmo se pode dizer das receitas para os problemas. JES afirma: “É preciso percebermos porquê. Isto acontece porque falta muitas vezes rigor e disciplina nas nossas atitudes e comportamentos. Se nós aumentarmos o rigor, a disciplina e a nossa eficácia poderemos fazer muito mais e em menos tempo”.

Ora, na realidade, o problema é a cleptocracia do próprio Presidente, da sua família e de alguns dos seus próximos. É uma banalidade dizer, mas repito: Angola poderia ser um país próspero, mas não o é porque os dirigentes desse país não se preocupam com o seu povo, mas consigo próprios.

Metástase soviética é também a presença de representantes do Partido Comunista Português no congresso do MPLA. Para o PCP, o facto de esse movimento oprimir o povo angolano é menos importante que o “internacionalismo proletário”, que, na era soviética, se traduzia na “venda da alma” a Moscovo por uns milhões de “malditos” dólares americanos. E hoje?

Quanto à presença de representantes de outros partidos, trata-se de uma atitude ainda mais repugnante. Claro que se justificam com as relações económicas, políticas com o país-irmão, sendo Paulo Portas o representante máximo dessa lengalenga demagógica, mas há limites para tudo. Seguindo esta lógica, não posso deixar de estar de acordo com José Ribeiro e Castro, antigo líder do CDS, quando ironiza: “[Um futuro] congresso do CDS talvez venha a contar também com a presença de delegações do Partido Comunista de Cuba, do Partido do Trabalho da Coreia do Norte, do Partido Comunista do Vietname, da FRELIMO, da Frente Polisário e do Partido Comunista da China – tudo delegações estrangeiras cuja presença em Luanda é destacada pelo influente ‘Jornal de Angola’ ao lado da do CDS-PP”.

Apenas acrescento que os partidos portugueses presentes no congresso do MPLA não se devem esquecer do congresso do partido do Presidente da Guiné-Equatorial, país que faz parte da CPLP.

É insensato esquecer que José Eduardo dos Santos e o seu regime não são eternos e a história costuma pregar-nos grandes partidas. Isabel dos Santos até pode vir a suceder ao pai no trono, mas os regimes ditatoriais terminam por vezes das formas mais inesperadas: Ceaucescu ou Kadhafi que o digam. Depois da morte do ditador, a guerra dos lacraus é implacável e o resultado poderá ser o mais inesperado.

Por isso, não coloquem os ovos todos no mesmo cesto, principalmente quando já se sabe que ele está podre…