A tragédia de Pedrógão Grande pôs a descoberto um grande consenso nacional. Políticos de todas as cores, comentaristas de todos os quadrantes, são unânimes num ponto: é obrigação do Estado garantir a segurança dos seus cidadãos. Quem não o afirmou explicitamente, disse-o implicitamente. Todos. Até no Observador.

Este consenso nacional reflete uma teoria muito bonita: que o Estado existe para assegurar a justiça e promover o bem comum. No entanto a prática é outra. Em que ponto na história da humanidade, quando e onde?, é que o Estado pôs o interesse das populações acima dos interesses de Estado ou do dos dirigentes do Estado? Sempre que fiz esta pergunta, pondo em cima da mesa 20 ou 50 euros para quem me desse uma resposta convincente, voltei a por a nota no bolso. Se nunca aconteceu no passado, porquê tanta fé que possa acontecer no futuro?

Teorias erradas têm consequências nefastas. Quem pensa que o Estado existe para promover o bem-estar e segurança do povo sente-se tranquilo e descura a sua própria proteção. Cuidados simples que o povo tinha quando o Estado não chegava “lá” caem no esquecimento. Ajuda mútua e solidariedade comunitária que funcionavam quando e “Estado Social” não existia ficam fora de moda. E quem fica pior somos (quase todos) nós.

Desgraçadamente quando uma bonita teoria falha na prática a culpa nunca é da teoria. Na nossa mitologia nacional o Estado é um númen benfazejo, omnipresente e omnipotente. Esta mitologia é ensinada nas escolas, publicitada na televisão e declamada no parlamento. Em casa passa de pais para filhos. Consequência: fiéis à teoria, quando algo corre mal, uns exigem mais Estado, outros pedem melhor Estado. Mas a proposta é sempre errada: Estado.

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Que alternativas existem? Conheço duas.

Para os mais religiosos temos Jeremias 14, 5: “Maldito o homem que põe a sua confiança noutro homem e conta na força humana e cujo coração vive distante do Senhor!” Por “homem” leia-se “rei”, ou “António Costa”, ou “Estado”…

Para os mais seculares recordo um princípio do bushido: “Não tenho Senhor…” Por “Senhor” leia-se “Estado”, ou “médico”, ou “Estado Social”, ou “polícia”, ou “SIRESP”, ou “bombeiros”… Mas terminemos: “Não tenho Senhor: a autodefesa é o meu Senhor”.