A única contribuição portuguesa para as ciências da educação é um curto poema didáctico do poeta Nicolau Tolentino de Almeida (1740-1811).   A história conta-se depressa:  desaparece um colchão numa família monoparental;  a mãe, naturalmente preocupada, inquire quanto ao seu paradeiro;  a filha observa que não se perdeu grande coisa; a mãe atira-se à cara e ao penteado da filha; de dentro do penteado o colchão aparece.

Este método antigo de educação, baseado na presença de espírito e na iniciativa, produz resultados.   Devia na opinião do vate ser usado com mais frequência.  A observação empírica do modo como famílias nem todas monoparentais lidam hoje com os seus mais novos sugere com efeito que a utilização do método antigo poderia em muitos casos obviar problemas.  Tais problemas, quando não são contidos cedo, são responsáveis por perturbações na geral convivência humana, e por uma distorção no mercado de colchões.  A situação corrobora aliás a opinião dos melhores autores clássicos segundo a qual a escassez de oferta determina uma certa ansiedade na procura.

O método dominante, que se opõe ao método antigo, consiste em dialogar até que apareça o colchão.  Num primeiro momento os pais entabulam conversações para que se estabeleça uma relação de confiança; são conversações que persuadem as crianças de que nenhumas conversações as farão alguma vez restituir aquilo que desapareceu, comer aquilo que ficou no prato, responder a quem lhes perguntou qualquer coisa, ou simplesmente deixar de exprimir a sua garrulice por meio de uivos característicos.   Confortadas as crianças pela certeza de que nada se seguirá desta troca de palavras, os pais aludem depois com tacto à substância do problema;  as crianças fazem-se desentendidas, nomeadamente porque, apesar de ainda muito novas, já não acham que os problemas tenham substância.

O método dominante também se baseia na observação empírica; em particular baseia-se na observação empírica do comportamento da espécie dos especialistas em crianças, que percebem com astúcia que de quanto mais demorada resolução forem os problemas mais será necessário que os pais em desespero a si recorram.   Têm assim interesse profissional em fomentar o diálogo, em detrimento das formas mais tradicionais de aspereza doméstica.  Desaconselham por essa razão aos pais o vernáculo expressivo, os gestos vivos, e o arremesso de objectos.

Faltando-lhes o sopro épico da grande poesia da violência doméstica (por exemplo a poesia homérica), os especialistas em crianças são regra geral abençoados pelos dons da prosa e da compreensão.  Especializaram-se em compreender por escrito o que querem realmente dizer aqueles que se recusam a falar connosco.  Fazem-no sem parcimónia em todas as boas publicações periódicas, e mesmo em algumas más; e em várias não-periódicas. Durante o dia, os seus pequenos clientes visitam-nos, acompanhados pelos pais lavados em lágrimas.   Ao sair dos consultórios são observadas protuberâncias nas suas cabecitas: são os colchões.

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