Nas últimas eleições autárquicas, locais, o PS ganhou. Não foi António Costa quem ganhou, foi o PS. Todos os outros perderam. Uns mais, outros menos. Em termos locais, o PCP foi o maior perdedor, seguido do PSD. Não foi Pedro Passos Coelho quem perdeu, nem Jerónimo de Sousa. O CDS ganhou mais uma Câmara. Se estas eleições pudessem ser consideradas como nacionais, coisa que não podem por via do método de eleição, do tipo de candidatos, da profusão de diversas coligações, da existência de muitas candidaturas independentes – todas bem-vindas -, por haver programas locais em escrutínio e não propostas nacionais, o PS teria ganho.

De entre os derrotados, seria o PCP a ter a maior derrota (- 63.521 votos), logo seguido do CDS (- 17.762 votos) e, a grande distância, do PSD (- 2.904 votos). O BE e os “independentes” tiveram ganhos importantes. Se fosse feita a adição de PS, PCP e BE, estes teriam ganho com mais 623.174 votos do que a soma dos votos no PSD + CDS e coligações + independentes. A esquerda ganhou claramente, embora o PS só tenha tido mais 315.305 votos do que a soma de PSD, CDS e todas as coligações com estes e outros partidos. Assumindo que os “independentes” não serão todos, nada o indica, de esquerda, a vitória do PS, mesmo em modelo Frente Popular, não foi esmagadora e a derrota do PSD não foi uma hetacombe.

Em 2015, a vantagem da esquerda, pese embora terem sido eleições nacionais em que o PS teve menos 334.826 votos do que a PáF, foi de mais 662.046 do que a Páf (pouco mais do que os 623.174 votos acima de PSD/CDS e independentes das últimas eleições autárquicas). Ficou evidente, para quem persistir em leituras nacionais, que uma reedição da PáF, devidamente capitaneada e com o tempo que ainda falta até 2019, poderá voltar a ganhar eleições parlamentares, tal como ficou claro que a maioria absoluta será difícil para o PS. O PCP já está a pagar o preço de tudo o que ganhou com a maioria de esquerda, de que foi, até agora, o principal beneficiário por via das concessões aos seus sindicatos. Veremos se continuará a ser assim.

Ou seja, não é claro que tenha havido transferência significativa de votos do bloco de “direita” para o PS, havendo sobretudo movimentos de sentido de voto dentro da esquerda, com o PCP a perder. Em boa verdade, será o PCP quem mais assumirá as dores, algias crónicas e persistentes, do Governo que ainda temos, se continuar a trocar silêncio por concessões que nem lhe têm servido para angariar votos. Tem o esforço e o “seu” povo não lhe reconhece o mérito.

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Na sequência das eleições locais, admitindo uma leitura política autárquica e nacional, assumindo, como é seu apanágio, responsabilidades por algumas derrotas emblemáticas e considerando o que poderia ser melhor para Portugal, o Passos Coelho entendeu não se recandidatar à liderança do PSD e, consequentemente, a primeiro-ministro de Portugal. Tive ocasião de lhe expressar que entendia, em termos racionais, compreendia, no sentido empático do termo, mas não estava certo de que concordaria com a decisão. Principalmente porque a retirada política, sendo uma manobra de grande alcance estratégico a longo prazo, deveria ter ocorrido em novembro de 2015 ou só depois de um desfecho desfavorável em eleições legislativas, as que António Costa ainda só perdeu. Mais, sem desconsideração para nenhum dos eventuais novos líderes da oposição, nada permite afirmar que a “vida” política do PS fique mais difícil com nova liderança no PSD. Em especial se forçar um confronto eleitoral antes de 2019, o que não lhe deve ser concedido. António Costa ainda tem de experimentar as agruras do tempo.

Sobre Passos Coelho já se disse de tudo, quase sempre falsidades e alguns elogios. Pela minha parte, tendo tido a honra e a distinta satisfação de ter servido nos seus Governos, só me resta voltar a agradecer tudo o que fez por Portugal e desejar-lhe o melhor possível para o presente e futuro. É um homem invulgar, certamente com defeitos e qualidades, sem a presunção de ser infalível, elegante nas vitórias e nas derrotas, em suma, um grande Português.

Chegados aqui, o PSD tem de resolver três questões essenciais. Pessoas, ideias e aliados. As pessoas são essencialmente a singularidade do líder, já que as equipas, embora essenciais, estão sempre depois do cabeça de proa do partido, aquele em quem se vota e por cima de quem se despejam esperanças e se deposita confiança. Ora, sendo assim em todos os partidos, o PSD precisa de ter um chefe que seja líder, com capital mediático forte, imagem conhecida, sem esqueletos no armário, granjeador de confiança, simpático para um eleitorado alargado, com boa imagem, bem-educado e, já agora, com ideias claras e percetíveis pela generalidade dos eleitores. Acima de tudo tem de chamar às urnas aqueles que delas se afastaram. Não tenho dúvida que o PSD terá uma solução que cubra a maioria dos aspetos sumariados, sob pena de não chegar a causar mossa em António Costa. Mesmo quando este está muito longe de reunir todos os critérios atrás elencados, sendo até notória a ausência de vários deles no nosso primeiro-ministro.

Em termos de ideias há muito mais para saber além dos termos vagos da recentragem, do liberalismo e da direita ou esquerda. Já agora, para que se perceba e não se persista no erro que alimenta o imaginário das esquerdas e ressabiados, os Governos de Passos Coelho não foram neo-liberais, não destruíram o estado social e não impuseram sacrifícios injustificados aos Portugueses. Foram, isso sim, pouco complacentes com a teia de interesses que tem vivido à custa de todos nós e, talvez por isso, haja tanto “empresário” falido e alguns meliantes a queixarem-se do mal que o Governo PSD-CDS lhes fez.

Porventura nunca deveria o PPD ter mudado de nome para PSD. É certo que podemos encontrar muitas intenções sociais e democráticas no úbere do PSD mas não tenho como certo que exista a necessidade de co-existirem dois partidos da social-democracia (SD) em Portugal. Isto, se o PS tivesse continuado a ser o que deveria ser, o verdadeiro partido da SD. Com Costa, o PS é uma agremiação dos interesses pessoais de gente conotada com muitos setores e cujo único fito é viver e sobreviver à custa do Estado. É por isso que em torno do Governo social-comunista há comunistas políticos, casos do PCP e BE, e toda uma entourage de agentes económicos cuja intenção é ganhar o que puderem com a garantia de nunca perderem. Pessoas avessas ao risco, porque o Estado pagará o que correr mal.

Mas vamos assumir que o PS era SD. De um lado há comunistas, apesar de muito descaracterizados e cúmplices da destruição financeira dos serviços públicos, de que o SNS é exemplo. Do outro há a chamada ” direita” cuja denominação resulta da alternativa posicional à esquerda. Sucede que, apesar do uso comum dessa designação, em Portugal não há um verdadeiro partido que seja exclusivamente de direita democrática. Direita como há na França, em Inglaterra ou na Alemanha, não temos. Na Europa não há direita que se assemelhe, sequer, ao partido democrático dos EUA, o tal que é de “esquerda” e até já mereceu elogios, espantem-se as almas, do PCP português. Seria bom que a tivéssemos para que os sociais democratas pudessem ser isso mesmo e o PSD, justamente denominado de PPD pudesse ser aquilo de que os Portugueses precisam. Com Pedro Passos Coelho (PPC), o PSD estava no caminho certo, mesmo que nos queiram fazer acreditar no contrário. Patético, o discurso de que PPC não era líder da oposição. Era tão líder e tão temido que os do “costume” não descansaram até o verem sair de cena.

Voltemos às ideias. O PPD (PSD se insistirem nessa nomenclatura) tem de ser claro quanto à intransigente defesa do serviço público, usando todos os sectores da sociedade e da economia, e não apenas dos “serviços públicos”. Nessa esfera, a saúde e educação deverão ter a primazia. No caso da primeira, deverá alinhar todas as políticas públicas para a promoção do bem-estar, tal como, no caso da segunda, nunca poderá alienar-se de que o progresso social e económico depende da educação, não apenas da informação e conhecimento. Na defesa da saúde não poderá compactuar com lóbis industriais, mesmo que estes se apresentem como “indispensáveis” para a economia. Na defesa de uma educação livre, abrangente e promotora dos valores morais e civilizacionais, não deverá assumir a miopia de que o ensino privado só pode ser exclusivo de quem tem dinheiro para o pagar.

O PPD tem de ser um partido defensor de valores éticos e em linha com uma liberdade que não pode ser motivo para a imposição de coisas que a sociedade e a moral maioritariamente rejeitem. Nesse sentido, deverá lutar pela defesa dos valores Portugueses, no seu contexto mundial, e do seu património cultural e linguístico. Tem de valorizar o Estado e a sociedade com um sentido de meritocracia que, no entanto, não poderá deixar de zelar pelos menos afortunados ou capacitados. Não poderá continuar a defender um sistema de impostos que, de tão progressivo, esmaga a classe média e aumenta a diferença entre os que pagam, uma minoria, e os que auferem, todos. Não será xenófobo mas não terá de ser permissivo na política de emigração. Pugnará por uma justiça célere, igual para todos, mas nunca ligeira ou apenas indulgente. Não poderá confundir a necessidade de recuperar e reabilitar com um sistema penal desajustado da gravidade dos crimes. Nunca aceitará a morte como pena. Será um partido defensor da vida e da sua qualidade.

Não poderá descurar a segurança interna, valorizando quem por ela vela, nem a projeção de uma defesa externa essencialmente voltada para as garantias de paz nas nossas áreas territoriais continentais e marítimas. Será, como tem sido, Europeu e Ocidental na práxis e nas alianças. Defenderá, como agora, o EURO, a UE e a NATO. Não pode ser uma versão ligeira do PS mas não deixará de acudir à sustentabilidade do Estado Solidário, exatamente aquele de que o PS hoje não cuida. Não poderá esgotar-se em princípios programáticos vagos, como o humanismo ou personalismo, precisando de se afirmar através de ideias concretas que todos possam perceber. Terá de ser, como foi no tempo da Tróika, um partido de ação e não de contemplação. Não pode ser, nunca mais, um partido do politicamente correto. No fundo, já é quase tudo isto e não será por defender a iniciativa privada e recusar ceder ao facilitismo que se lhe pode chamar, ao PSD que Passos Coelho liderou, um partido de direita.

Com este quadro de centro-direita (centro, porque com fortes preocupações pela promoção do bem-estar de toda a sociedade, e de direita, porque não confunde a proteção dos mais fracos com o esbulho fiscal da classe média e a igualização pela mediocridade), o PPD/PSD terá de concorrer, em 2019, em coligação com o CDS que também é PP. Só assim, num país onde a esquerda compra a sua popularidade com insultos e ofertas de perdões e isenções fiscais, poderá haver alternativa à Frente Popular que o PS não hesitará em refazer se dela precisar e o PCP quiser. O BE quer o que tiver de querer.

Alguns militantes do CDS e, provavelmente, uma parte dos seus dirigentes acharão que existe uma possibilidade de coligação pós-eleitoral com o PS. Poderá haver e será, sem dúvida, ideologicamente melhor do que a solução atual. Claro que terá manifestações nas ruas, mas isso também ocorrerá com uma maioria absoluta do PS e com a agravante de que o PS é dado a ceder à demagogia. A realidade é que o CDS terá muita dificuldade em recuperar um grupo parlamentar, como aquele que agora tem, se concorrer sozinho. Um bom resultado em Lisboa, nas condições em que ocorreu, não lhe garante nada no todo nacional.

Não milito em nenhum partido mas estou certo de que depois da austeridade da esquerda, combinada com “devoluções” pífias de rendimentos e temperada com populismo e manipulação da informação, vai ser preciso agrupar todos os que desejem voltar à prosperidade sustentável e sair do espectro de novo resgate. Bloco central? Já o defendi e pode ser fundamental na elaboração de grandes acordos programáticos para prazos longos. O que não quer dizer que com o PS que temos, nada social-democrata, com a atual direção e a sua propensão para o “radicalismo” travestido de esquerda, isso seja desejável ou até mesmo possível. O objetivo deve ser afastar António Costa do poder, ainda que reconhecendo a dificuldade em o atingir.