Os familiares já choravam a morte do soldado Vadim Kostenko e preparavam-se para sepultar este jovem de 19 anos que morreu na Síria, mas o Kremlin ainda dizia não saber de nada. Só depois das redes sociais e da imprensa divulgarem a notícia é que o Ministério da Defesa da Rússia reconheceu que ele se “suicidou devido a corte de relações com a namorada”. Repete-se a “guerra híbrida” realizada por Vladimir Putin na Ucrânia.

A propaganda e os porta-vozes do Kremlin e do Ministério da Defesa da Rússia reagem com a palavra “boato” a todas as informações difundidas por organizações internacionais ou pela oposição síria de que os ataques da aviação russa provocaram a morte de dezenas de pessoas e a destruição de aldeias que nada têm a ver com o Estado Islâmico.

Algumas das notícias dos bombardeamentos são apresentadas com tantos pormenores e com a ajuda de mapas e gráficos que já foram comparados a boletins meteorológicos.

O grupo de investigação britânico Bellingcat estudou os vídeos e mapas publicados pelo Ministério da Defesa da Rússia depois do início da operação militar na Síria e concluiu que a maior parte dos ataques aéreos tiveram como alvo não os territórios ocupados pelo Estado Islâmico, mas sim os que estão nas mãos do Exército Sírio Livre, que combate o regime de Bashar Assad e que, segundo Serguei Lavrov, chefe da diplomacia russa, não constitui um grupo terrorista. Algo que os militares russos desmentem.

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A organização internacional Human Rights Watch acusou a aviação russa da morte de 59 civis no norte da província de Homs e de 46 membros de uma só família na aldeia de Hantu, mas os militares de Moscovo continuam a afirmar que durante os mil bombardeamentos apenas atingiram “alvos militares”.

O Kremlin também desmente todas as informações de que estão a ser transferidas tropas especiais que combateram no Leste da Ucrânia para a Síria (os “homenzinhos verdes”).

Depois de todos os fiascos económicos em 15 anos de poder absoluto, o Presidente Putin parece ter encontrado nas suas aventuras militares a “ideia nacional” que tanto procurava. Passaram a ter sentido as palavras do czar Alexandre III que afirmava que “a Rússia tem dois aliados: o Exército e a Marinha”. O próprio Putin considera-se “uma pomba com asas de aço” e recorda um princípio da sua infância: “quando não se pode evitar a rixa, temos de ser os primeiros a bater”.

Segundo a imprensa russa, as fábricas de bombas passaram a trabalhar em turnos para que elas não faltem na Síria e a propaganda militar e a onda patriótica parecem aumentar de forma proporcional.

Pode ser ainda mais popular fazer a guerra na distante Síria do que na vizinha Ucrânia. Por isso, Vladimir Putin tem uma popularidade próxima dos 90%, sendo seguido na lista por Serguei Choigu, ministro da Defesa.

No entanto a operação na Síria não será breve, nem barata, e, por isso, esperamos para ver até onde aguentará o esforço militar e económico da Rússia. A guerra só traz popularidade enquanto é vitoriosa e é feita com as baixas mínimas. Se a situação económica russa se continuar a degradar, colocar-se-á a questão de até quando é que os russos estarão dispostos a sacrificar a manteiga por canhões.

Saltikov-Chedrin, conhecido escritor russo do séc. XIX, considerava que “se na Rússia começam a falar de patriotismo, fique a saber que algures roubaram alguma coisa”. Já Viatcheslav Pleve, ministro do Interior da Rússia no início do século XX, afirmou que, “para travar a revolução, precisamos de uma pequena guerra vitoriosa”. Pois.