Talvez seja a altura de desistirmos, pormos as mãos no ar e reconhecermos que tudo está fora do nosso controlo.

Tudo.

Já não vale a pena preocuparmo-nos com a possibilidade de Donald Trump ganhar as eleições americanas, porque já não há nada que possamos fazer agora, se é que alguma vez houve alguma hipótese de a Europa levar os Trumpetistas a serem razoáveis, especialmente depois do Brexit. Só podemos aguardar o resultado.

Já não vale a pena preocuparmo-nos com a possibilidade de Lisboa se tornar um parque temático, porque Lisboa já é um parque temático, uma grande feira popular para os turistas. Temos agora uma loja circense da sardinha no Rossio – muitas latas, mas com uma só variedade de sardinha –, um frango gigantesco de 10 metros da Joana Vasconcelos — pelo menos não tem crochet… ainda – e muitas linhas de eléctrico novas ou recuperadas, que ameaçam ser as vias de circulação de uma nova frota de eléctricos ao estilo do fim do século XIX, para os turistas terem uma experiência “eléctritástica”: “Venha a bordo para viajar no mundo das “Natas e sardinhas!!” (sim, estou a caricaturar, mas esperem e ainda vamos ver isto…). Em suma, já vivemos em Lisboalândia e não há nada que possamos fazer para o evitar. Mas tudo acabará em bem, a cidade há-de desenrascar-se organicamente… por isso, não vale a pena preocuparmo-nos.

E também não vale a pena preocuparmo-nos com o Web Summit. Sim, o equivalente de 10 navios de cruzeiro cheios de pessoas estarão na cidade durante uma semana, mas teremos 10 cruzeiros de dinheiro a inundar a cidade. Sim, o Parque das Nações (durante o dia) e o centro de Lisboa (à noite, o Web Summit vai transportar aqueles 10 cruzeiros de pessoas para o centro) estarão num caos durante a semana, mas talvez algumas coisas boas possam sair desse caos, mesmo se a única coisa boa for que nos vai distrair do Orçamento do Estado ou do facto de o investimento estrangeiro estar a evaporar-se desde a última eleição.

O que me traz ao artigo hilariante do Guardian que entreteve a internet durante a semana passada. Tornou-se mesmo viral por duas razões. Uma das razões foi o costume do “ah, que bom! Há estrangeiros a dizer coisas boas sobre Lisboa, que o mundo vem para Lisboa, e que Lisboa pode ser o próximo Silicon Valley… que bom!!”. A outra razão foi “O que é isto? O que é que isto quer dizer?”, como também é costume.

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O artigo avançou a ideia de que Lisboa pode ter potencial para atrair muitos geeks e muitas empresas de “tech”, à procura de “rendas baixas”, de sol e de praias de surf.

Talvez o jornalista – que é o correspondente do Guardian em Madrid – tenha dado um salto de fim de semana a Lisboa, e não saiba que o investimento que vinha de fora vem cada vez menos, e que por isso é pouco provável que muitas empresas se desloquem para Lisboa, tal como é pouco provável que alguém em Lisboa possa sair do escritório e estar a fazer surf 15 minutos depois.

É o costume. Entre os milhares e milhares de participantes do Web Summit há muitos (muitos) jornalistas. Seria bom que alguns deles ficassem por cá como “correspondentes em Lisboa”, a ver se o mundo deixava de ser informado sobre Portugal apenas por jornalistas de passagem, sem experiência e sem saber do país.

Traduzido do original inglês pela autora. Lucy Pepper é autora do livro “Como não morrer de fome em Portugal” (Objectiva).

Web Summit is not in Lisbon, but in Lisbonland

Maybe the time has come for us to just put up our hands and accept that it is all out of those very hands.

It’s everything.

There is no point anymore worrying about Trump beating Hillary, there’s nothing we can do about it now, if, indeed, there ever was any way that Europe could persuade the Trumpettes to see the light, especially after Brexit. All we can do now is sit back and watch.

There is no point anymore worrying about Lisbon turning into a theme park, because it has already happened, what with the Fantastical Circussy World of the Sardine on Rossio – which, I hear, has one kind of sardine, but differing tins – or Joana Vasconcelos’ monstrous 10 metre tall chicken – at least she hasn’t crocheted it… yet – or all the new and recuperated tram lines across the city which no doubt will be home to a fleet of new faux 19th C trams for “TramTastic! Jump aboard and travel through a world of “Natas” and sardines!!” (that last bit, I’m making up, but let’s see, huh?). We live in Lisboalândia, now, and there isn’t a damn thing any of us can do about it. It will all work itself out in the end, organically, so what the hell.

Likewise, there is little point worrying about Web Summit. Yes, the equivalent of 10 cruise ships will be in town for the week, but that’s 10 cruise ships’ worth of extra cash flooding the city. Yes, Parque das Nações (during the day) and the city centre (at night – Web Summit will be bussing 10 cruise ships worth of people into town each night) will be utter chaos for a week, but good things can come out of chaos, if only if it gives us something to talk about for a while instead of boring things like the Budget, or the fact that outside investment has dried up since the last election.

Which brings me to this hilarious article from the Guardian that was doing the rounds all last week. It went viral for two reasons. One viral strain went “oh how nice, people from outside are saying nice things about Lisbon and they are saying that the world is coming to Lisbon and that Lisbon might be the next Silicon Valley… hooray!”. The other viral strain went “WHAT?”

The article posited that Lisbon, with all its “cheap rents, sun and surf, has the potential for a whole bunch of tech geeks and companies to up sticks and base themselves here.

To be fair, the journalist is the Guardian’s Madrid correspondent and possibly popped over for a weekend, and doesn’t know that international investment has all but dried up, and so it is extremely unlikely that many tech firms are going to up sticks, as unlikely as the idea of getting to the surf within 15 minutes of finishing your morning’s work.

Same old, same old. Web Summit’s thousands and thousands of participants include many journalists, so maybe one or two of them might stay here and becoming an actual “Lisbon correspondent” for some newspaper or other, instead of the world being informed about Portugal by visitors.

Lucy Pepper is the author of “Como não morrer de fome em Portugal” (Objectiva)