António Costa ficou chateado. Um poucochinho, sem nada ter a ver com as vitórias eleitorais de António José Seguro. Ficou aborrecido pelo facto de os portugueses não alcançarem a real dimensão do ato. Ser obrigado a uma despesa desnecessária. Contratualizar uma avença com o melhor amigo. Como se a amizade não dispensasse o dinheiro.

Gastar dois mil euros mensais do erário público. Um desperdício, apesar de a austeridade ter sido oficialmente enterrada quando tomou posse como primeiro-ministro. Por mais que o Orçamento, que é uma lei, não pareça confirmar essa situação.

Se tivesse contratado o amigo não faltaria quem o acusasse de compadrio. Como Diogo Lacerda Machado, o amigo do peito, estava a trabalhar por amor à camisola – que no caso era a do Governo – criticam-no na mesma.

Deve ser por isso que há governantes que se queixam do povo que lhes calhou em sorte. Um elemento coletivo de impossível substituição.

Gente que não percebe o valor – ou será o preço? – da amizade. A disponibilidade para dar uma mãozinha na gestão de alguns dossiês. Coisa de pouca monta. A questão de reverter a privatização da TAP. O problema dos lesados do GES. A ponte entre os espanhóis do CaixaBank e os angolanos – ainda que no feminino e no singular – da Santoro.

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Tudo sem o mínimo conflito de interesses. Que culpa tem ele de Portugal ser um País pequeno? Um País onde todos – ou quase – são obrigados a negociar com todos.

E a reação dos partidos? Parecem feitos uns com os outros. Já esperava a reação do PSD e do CDS-PP. Uns especialistas em colocarem pedras no caminho do Governo. Esses não demoraram a vir para a praça pública. Queriam saber tudo ao pormenor. Falavam de transparência. A ladainha da oposição. Depressa esquecida dos problemas internos.

Mas os aliados?! A princípio ainda ficaram calados. Uma bela forma de manifestar solidariedade. Sol de pouca dura.

No caso do Bloco de Esquerda não demoraram as acusações de sobranceria. Como se a história portuguesa recente não estivesse repleta de ajudas decorrentes da amizade. Desinteressada, obviamente.

O Bloco até chegou ao ponto de falar de um consultor sombra do Governo. Um exagero, qualquer que seja o sentido dado à palavra «sombra».

No caso do PCP, ocupado nas jornadas parlamentares por terras de Trás-os-Montes, demorou tanto tempo a reagir ao facto como Jesus a ressuscitar. Três dias. Nem mais nem menos. Um acaso num partido pouco propenso a essas situações.

E veio logo falar em necessidade de explicações. Como se houvesse alguma coisa a necessitar de ser esclarecida!

Os comunistas lembraram o interesse nacional. Como se a ajuda sem compensação monetária não representasse uma mais-valia para os interesses do País!

Com aliados destes quem é que precisa de opositores? É claro que não lhes vai oferecer duas bofetadas. Até porque teriam de ser três. Outra vez o raio do número! Até parece perseguição.

Por agora, é preciso continuar a ser diplomata. Sorrir às contrariedades. Cada vez mais convicto da novidade que representa.

Aprendeu a transformar a derrota em vitória. Propuseram-se expulsá-lo do Largo do Rato. Subiu as escadarias de São Bento.

Viu-se obrigado a fazer uma avença. Responsabilidade de outros. Aqueles que leram os livros que apregoam que a democracia é um regime caro.

Ele vive noutra circunstância. Está mais à frente. Sabe que basta ter amigos bem preparados, altruístas ou patriotas. Uma forma revisitada de mecenato. A democracia representativa nunca mais será a mesma.

Um dia o País irá perceber. Depois a União Europeia. A seguir o Mundo.

Professor universitário e politólogo