“Alunos e famílias não acreditam que estudar compense” era o título de uma notícia de ontem no Público. O artigo baseava-se num estudo encomendado pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e de autoria de Diana Aguiar Vieira, psicóloga e investigadora no Instituto Politécnico do Porto. O estudo já está disponível e tem todo o aspecto de ser cuidadoso e bem feito. Não posso opinar mais, porque, na verdade, ainda não tive tempo para fazer mais do que uma leitura diagonal; para já, reajo apenas à notícia. E nela o que mais me chama a atenção é o facto de muitos estudantes do 12º acharem que não vale a pena tirar um curso superior.

Estas expectativas negativas relativamente ao impacto que tirar um curso tem na nossa vida surpreende-me não só porque me parece óbvio que, havendo escassez de recursos humanos qualificados, o prémio salarial terá de ser elevado, como também porque me parece que a experiência de todos nós mostra que, em regra, pessoas com mais qualificações conseguem melhores empregos. Obviamente que, como toda a gente, conheço excepções, mas são excepções.

Os dados que existem sobre o assunto são claros. Trabalhadores com licenciatura não só têm mais facilidade em encontrar emprego como também ganham mais. Os números da OCDE para 2015, publicados no “Education at a Glance” em 2017, dizem-nos que em Portugal o prémio salarial de um licenciado, relativamente a quem acabou o secundário, é de 69%. Este é apenas um exemplo; muitos outros indicadores apontam no mesmo sentido.

Pode-se sempre argumentar que a relação de causalidade está mal definida. Por exemplo, é razoável argumentar que são as pessoas mais produtivas aquelas que vão estudar para o ensino superior e que se não tivessem ido teriam, na mesma, remunerações mais elevadas. Ou seja, em vez de haver uma relação causa-efeito entre tirar um curso e ser mais bem tratado no mercado de trabalho, há simplesmente uma causa comum: são os mais produtivos que tiram cursos superiores e que são premiados pelo mercado. Mas, mesmo aceitando o argumento anterior como razoável, a verdade é que é incompleto. Há todo um conjunto de profissões que está vedado a quem não tem formação académica adequada — juízes, engenheiros, professores, médicos, etc. Tudo profissões que têm remunerações acima da média.

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Além dos indicadores estatísticos e dos estudos da OCDE, que, naturalmente, ao fazerem comparações entre dezenas de países não estudam com enorme profundidade um país individual, existem bons estudos para Portugal sobre este assunto. Um dos últimos, com um conjunto de investigadores (Hugo Figueiredo, Miguel Portela, Carla Sá, João Cerejeira, André Almeida e Diogo Lourenço) que garante a sua qualidade, foi promovido pela Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS) e tem como título Benefícios do Ensino Superior.

Este estudo da FFMS tem a vantagem de se debruçar não só sobre indicadores pecuniários mas também sobre outros indicadores de qualidade de vida. Relativamente ao lado financeiro (e deixando claro que se está apenas a falar de salários de trabalhadores por conta de outrem), os resultados confirmam os de outros estudos, mas vão um pouco mais além. Por exemplo, mostram que o prémio salarial de quem tem uma licenciatura ou mestrado em Ciências, Tecnologias, Engenharias e Matemática é maior do que o de quem tem o título académico em outras áreas.

Relativamente ao lado não financeiro, os autores recorreram a dados do European Social Survey, inquérito europeu aplicado a cada 2 anos, em que Portugal participa desde 2002. Parte dos resultados não surpreende. Por exemplo, os licenciados revelam estar mais satisfeitos com o tipo de emprego que têm e até com a vida que levam de um modo geral. Revelam também que os licenciados levam um estilo de vida mais saudável, que são mais tolerantes (menos racistas, menos xenófobos e menos homofóbicos) e com níveis de participação cívica mais elevados.

Estes resultados são interessantes e importantes mas, talvez, não surpreendentes. Mas há alguns que o são — pelo menos a mim surpreenderam. Por exemplo, à pergunta sobre se se sentem seguros ao andar sozinhos à noite, os licenciados revelam que se sentem mais seguros que as restantes pessoas. Também atribuem menores probabilidades à possibilidade de serem assaltados bem como de serem vítimas de um crime violento. Os licenciados mostram também confiar mais nas outras pessoas (bem como nas instituições).

A figura abaixo, retirada do estudo referido, ilustra os mecanismos pelos quais o ensino superior contribui directa e indirectamente para o bem-estar de cada pessoa. Talvez seja demasiado complexa para a explicar num artigo de opinião, pelo que fica como um desafio ao leitor para que leia o estudo completo. Deixem-me só realçar que, de acordo com os autores, apenas metade do impacto do ensino superior no bem-estar resulta directamente do aumento do rendimento. A outra metade resulta de outros factores, como os efeitos na saúde, na confiança interpessoal e na percepção de segurança.

A mensagem final é simples: se quer ser feliz, estude.

Modelo estrutural – satisfação com a democracia e participação eleitoral (Fonte: Figura 3.24 do estudo citado)