António Costa ganhou categoricamente e, agora, os corações socialistas enchem-se de esperança por um recomeço. Goste-se ou não e diga-se o que se disser, este é um dos momentos-chave da legislatura. Tudo irá mudar daqui para a frente? Bem, alguma coisa mudará. Mas a grande mudança é só esta: a pressa.

Seguro, há tempos, chegou a perguntar qual era a pressa. Chegou mesmo a rejeitar um cenário negocial, proposto por Cavaco Silva, que lhe garantiria eleições legislativas antecipadas. Só que a pressa que Seguro teve a menos tem Costa a mais. Nada os distingue mais do que isso: enquanto Seguro tardou em convencer que pode chegar a primeiro-ministro, Costa tem uma tremenda ambição de governar e montou um projecto que, sem ideias ou propostas, conseguiu ser apelativo aos socialistas e simpatizantes só porque tresanda a poder.

Hoje, ficou claro que é mesmo isso que os militantes querem – poder. Resultado: a pressão sobre o Governo e os partidos da maioria irá aumentar muito com Costa na primeira linha. Até porque, nestas coisas, quanto mais depressa melhor – há que aproveitar o efeito mobilizador de uma vitória tão clara no partido para começar a guerra das legislativas.

Ora, sendo esta questão a grande diferença entre Seguro e Costa, a dúvida é se, agora que pretende ganhar o país, o lisboeta mudará o partido no essencial: na incapacidade do PS de propor uma alternativa realista. Sem querer estragar a festa socialista, tudo indica que não: é que foi precisamente pela ausência de ideias claras e de alternativas às (más) alternativas de Seguro que a campanha de António Costa se notabilizou.

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Até pode ser interessante discutir as várias implicações práticas da vitória de António Costa – em termos de expectativas eleitorais, de potenciais coligações caso o PS vença as legislativas, de capacidade em unir o partido em torno de si ou da reacção dos partidos da actual maioria perante um novo adversário. Mas o que interessa realmente ao país é outra coisa: se António Costa quer mesmo ser primeiro-ministro, terá de responder às perguntas difíceis a que, habilmente, se foi esquivando nestes últimos meses. Qual é a sua posição em relação ao Tratado Orçamental e ao euro? E o que pensa sobre a reestruturação da dívida? Como pensa fazer baixar o défice sem recorrer à austeridade e que dados apoiam a exequibilidade da sua solução de pôr a economia a crescer mais? E, por fim, como pretende defender o Estado Social sem o reformar?

São perguntas difíceis, mas para as quais Costa precisará de resposta. Quer queira, quer não queira. É que qualquer debate com Passos Coelho ou Portas será travado no plano dos números, do concreto, dos tratados e da realidade. E por mais que os socialistas não gostem das soluções do Governo, elas têm uma lógica. Nem que seja uma lógica matemática: identificam-se os problemas, assume-se o custo das soluções e os números batem certo. Não gostar dessas contas não legitima alternativas irrealistas. O problema dos socialistas europeus, perante a necessidade de inverter as políticas de endividamento, foi esse. O problema de Seguro foi esse. E o problema de Costa será esse.

As ilusões trazem sempre desilusões. A ideia resume bem este percurso de 4 meses de Costa, desde que assumiu a candidatura à liderança do PS. Nos próximos tempos, o entusiasmo da vitória poderá fazer esquecer as desilusões, mas não é certo que deixem de surgir. Afinal, querer ganhar é importante, mas não é tudo.