Nos últimos meses, a Rússia tem assistido a uma mudança da elite política em sectores importantes da vida estatal como nos serviços de espionagem, nos serviços de segurança, no aparelho presidencial ou na direcção de algumas regiões da Federação da Russa. Uma luta de lacraus pela sobrevivência política ou uma renovação de elites políticas?

Desta vez, Vladimir Putin decidiu substituir Serguei Ivanov por Anton Vaino no cargo de chefe da Administração do Presidente da Rússia, um dos cargos mais influentes da hierarquia do Kremlin.

A primeira surpresa é o novo cargo que Ivanov, homem saído do KGB e de São Petersburgo, pois alguns vaticinaram o seu nome para o cargo de primeiro-ministro e até para substituto de Putin à frente do país. Contudo vai ser apenas “representante especial do Presidente para questões ecológicas e transportes”, o que constitui uma brusca despromoção.

“Mas que cargo é este ‘representante especial do Presidente para questões ecológicas’? Representante onde? Representante da Federação da Rússia junto do dióxido de carbono e das florestas chuvosas da Amazónia?”, ironizou Alexei Navalni, um dos mais críticos opositores de Putin ao comentar a decisão do Presidente.

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Outros comentadores, porém, não excluem que a demissão se deveu ao cansaço psicológico de Ivanov, principalmente depois de um dos seus filhos ter morrido afogado durante umas férias no Dubai em 2014.

O politólogo Igor Bunin vê neste processo uma tentativa do Presidente russo se rodear de políticos mais jovens e enérgicos: “Penso que Vladimir Vladimirovitch, que viveu na era de Brejnev, se recorda do quadro do velho e doente Brejnev cercado de velhos e doentes membros do Bureau Político. Por isso quer estar rodeado de jovens enérgicos. Tanto mais que as eleições estão à porta”.

Os russos irão de facto escolher uma nova Duma Estatal, câmara baixa do Parlamento Russo, em Setembro próximo e Putin quer evitar qualquer tipo de surpresa, nomeadamente manifestações de protesto contra a falsificação dos resultados como as que ocorreram em 2011.

“O Presidente quer evitar a gerontocracia e, ao mesmo tempo, renovar a direcção do país com pessoas em quem confia. Essas pessoas são, por exemplo, o recente nomeado Dmitri Kotchnev, agora chefe do Serviço de Segurança (FSO) da alta nomenclatura política e que ocupou esse cargo sendo apenas coronel. Outro nome é Anton Vaino, chefe da Chancelaria Presidencial. São pessoas para quem o Presidente não é um velho camarada, mas uma figura sagrada”, considera o analista político Alexei Makarkin.

Anton Vaino é estoniano, filho de Karl Vaino, o último dirigente comunista da Estónia. Nascido em Tallinn em 1972, estudo no prestigiado Instituto de Relações Internacionais de Moscovo e fez toda a sua carreira na Rússia. Em 2002, depois de passar pela embaixada russa em Tóquio, começou a trabalhar nos serviços protocolares do Presidente da Rússia e fez carreira aí, salvo quando foi exercer funções protocolares no governo russo no tempo em que este foi dirigido por Putin (2008-2012). É considerado um aluno de Evgueni Primakov, antigo primeiro-ministro e ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia e, por isso, alguns analistas consideram que um dos seus objectivos será melhorar as relações com o Ocidente.

“Putin cria conscientemente uma nova camada de dirigentes que, a médio prazo, deverão resolver as tarefas da reestruturação da economia”, considera o politólogo Evgueni Mintchenko, sublinhando que Vaino pertence à “camada dos jovens tecnocratas que devem a sua carreira pessoalmente a Putin”.

P.S. Nos últimos dias, as relações entre a Rússia e a Ucrânia agravaram-se muito. Moscovo acusou Kiev de pretender organizar atentados terroristas na Crimeia, o que os dirigentes ucranianos consideraram “calúnia pura” e uma tentativa de justificar o reinício da guerra entre os dois países.