As declarações de David Cameron, Boris Johnson e Michael Gove após o referendo britânico, na passada sexta-feira, merecem elogio enfático. O tom moderado e o apelo à unidade, reafirmando as tradições de abertura da democracia britânica à Europa e ao mundo, tocaram a tecla certa. E apontaram aquela que deve ser agora a prioridade: re-unir os euro-atlantistas numa conversação suave, mas também franca e directa, que possa assumir tranquilamente a vontade dos eleitores britânicos expressa no referendo.

Precisamos de recordar que o que nos une — a aliança euro-atlântica das democracias ocidentais — é muito mais importante do que o que nos separa. E que é essa união de fundo que deve permitir uma troca tranquila de pontos de vista. Sabemos que eles são diferentes e essa diferença deve poder ser assumida aberta e respeitosamente. Só a partir dessa conversação será possível encontrar os caminhos para re-unir a aliança euro-atlântica.

Um modesto passo para promover essa re-união começará hoje à tarde e prolongar-se-á até quarta-feira à noite, no hotel Palácio do Estoril — o hotel dos aliados anglo-americanos durante a II Guerra. Trata-se da 24ª edição anual do Estoril Political Forum, promovido pelo Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica.

O tema central deste ano (escolhido em Junho do ano passado) é “A democracia e os seus inimigos: novas ameaças, novas possibilidades”. O encontro é promovido em associação com o International Forum for Democratic Studies, de Washington, a NATO, a Fundação alemã Konrad Adenauer e várias universidades europeias e americanas — incluindo o consórcio Europaeum, com sede em Oxford, que reúne dez das mais antigas universidades europeias (Bolonha, Cracóvia, Leiden, Madrid, Munique, Oxford, Paris-Sorbonne e Praga, entre outras). Os Embaixadores em Lisboa da Alemanha, Espanha, EUA, Israel, Itália, Polónia e Reino Unido, bem como o nosso Embaixador na NATO, estarão também em diferentes momentos do Encontro.

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Como é habitual no Estoril Political Forum, todas as sensibilidades políticas democráticas estão presentes. Há conservadores, democratas-cristãos, liberais, sociais-democratas e socialistas democráticos. No plano europeu, há federalistas e anti-federalistas, europeístas e euro-cépticos. Entre os britânicos, há proeminentes defensores do “Leave” (por exemplo, John O’Sullivan, antigo conselheiro político de Margaret Thatcher), e proeminentes defensores do “Remain” (como Timothy Garton Ash, que apresentará o seu recente livro Free Speech). José Manuel Durão Barroso, hoje director do Centro de Estudos Europeus do IEP-UCP, será o orador principal no painel dedicado ao futuro da União Europeia, na tarde de terça-feira.

Esta variedade não é acidental. Ela exprime um dos propósitos fundamentais destes Encontros Internacionais de Estudos Políticos, desde o seu início em 1993, no Convento da Arrábida: contribuir para uma cultura política ocidental de compromisso e moderação, fundada na defesa sem compromisso da liberdade e responsabilidade pessoal.

Esta foi também uma das principais lições de vida que nos deu Maria Barroso, que nos deixou há um ano, logo após estar connosco no Estoril Political Forum de 2015. A ela é dedicada a sessão de abertura, hoje pelas 14h30, sob a presidência da Reitora da Universidade Católica e do Presidente da Câmara Municipal de Cascais. Manuel Braga da Cruz, antigo Reitor da Católica, recordará a apresentação de Maria Barroso que ele próprio proferiu quando o IEP-UCP lhe atribuiu o Prémio Fé e Liberdade, no Estoril Political Forum de 2012.

Contrariando a dramatização que tem sido feita dos resultados do referendo britânico — errónea, ainda que parcialmente compreensível — esperamos que no Estoril possa ser dado um pequeno contributo para acalmar as paixões e promover o diálogo euro-atlântico.