Uma das grandes “novidades” de 2014 foi o facto da coligação entre o PSD e o CDS não ter acabado. Os portugueses passaram três anos a ouvir os “senadores” e “politólogos” (adoro esta palavra) a prever o fim da coligação. Alguns no PSD e no CDS também não acreditaram que ela chegasse ao fim. Aparentemente, vai chegar. Até o PS trocou de líder antes da coligação terminar.
Apesar de não se terem confirmado as previsões que apontavam para um fim prematuro, entende-se o cepticismo em relação à capacidade de sobrevivência da coligação entre o PSD e o CDS. Em primeiro lugar, nas três tentativas anteriores, nunca terminara uma legislatura. E pelo meio houve ainda uma tentativa na oposição que nem às eleições chegou. Além disso, esta coligação governou no período mais difícil da política portuguesa desde 1975. Sem dinheiro para distribuir – basicamente o programa de todos os governos portugueses entre 1986 e 2009 – e com a obrigação de diminuir salários e pensões. Entre Setembro de 2012 e o início de 2014, foi raro o mês sem manifestações ou protestos nas ruas de Lisboa e de outras cidades do país. As greves tornaram-se um hábito nacional e até o Tribunal Constitucional fez oposição ao governo.
A própria coligação vacilou no início de 2013, com duas demissões em dois dias dos seus ministros mais importantes. Só não caiu por causa da determinação do Primeiro Ministro e do sentido de responsabilidade dos dirigentes do CDS que acabaram por perceber que os tempos não eram normais. Para se aguentar até 2015, a coligação derrotou a sua própria história, os tempos difíceis que enfrentou e a oposição de muitos, incluindo entre os seus.
Mas há outra maneira de explicar o sucesso alcançado pela coligação PSD/CDS: observar o que se passa nos países europeus onde existem governos de coligações semelhantes ao português – ou seja, deixo de lado as grandes coligações entre direita e esquerda. Comparando com o Reino Unido, a desconfiança entre os conservadores e os liberais – nalguns sectores de ambos os partidos chega mesmo ao ódio – torna a relação entre os sociais-democratas e os populares um caso de grande proximidade. Na Alemanha, na anterior coligação CDU-Liberais, os últimos mudaram de liderança a meio da legislatura por causa do desgaste imposto pelo seu parceiro – ou melhor, parceira (Angela Merkel). Na Holanda, a última coligação de centro-direita (antes do actual governo) não chegou ao fim da legislatura; tal como na Dinamarca.
Observando exemplos à esquerda, em França, a coligação entre os socialistas e os Verdes não resistiu à mudança de PM e de políticas económicas em Março do ano passado. Os exemplos externos, quer entre a direita como na esquerda, confirmam igualmente o sucesso da coligação entre o PSD e o CDS.
As negociações para uma futura coligação entre os dois partidos serão difíceis e demoradas. A tendência natural dos partidos políticos é concorrerem sozinhos às eleições; caso contrário, a sua existência não faria sentido. Mas os tempos políticos continuam a ser extraordinários; e a governabilidade do país será um dos temas centrais do debate político.
Há duas certezas que devem servir de ponto de partida. Nenhum partido terá maioria absoluta sozinho. Para o PS, a facto da única maioria absoluta ter sido conquistada com Sócrates a líder será fatal. Em segundo lugar, o PS não fará coligações à sua esquerda. Com o PCP e com o BE, é impossível. Os pequenos ‘partidos unipessoais’ já começaram uma campanha que os destruirá antes mesmo de existiram. Rui Tavares criou um partido para integrar um governo do PS. Daniel Oliveira, mais antigo que o camarada Tavares, considera que tem o mesmo direito, e criou um movimento. Mas a Joana Amaral Dias, convencida que tem melhor imagem – e tem razão – também quer estar num governo do PS, e criou outro partido. Esta competição de vaidades e egos vai contribuir para o PS não alcançar uma maioria absoluta, mas impedindo ao mesmo tempo uma maioria de esquerda.
Restam assim duas maiorias possíveis. A renovação da actual maioria. Será muito difícil, mas ainda é possível. Pelo menos, só será possível se os dois partidos mostrarem aos portugueses que acreditam numa nova maioria. Se ainda acreditarem, renovam a coligação. Se já tiverem desistido, concorrem sozinhos às eleições. Nesse caso, o CDS passará para a oposição e o PSD será o parceiro menor de um governo de bloco central.