Aproximam-se as eleições legislativas e está em causa a natureza das forças partidárias que irão governar o país assim como a estabilidade política necessária para Portugal prosseguir a tarefa de ajustamento económico-financeiro que nos permita crescer minimamente dentro do quadro da moeda única europeia. Ora, como as sondagens eleitorais repetidamente anunciam, os dois principais concorrentes – Coligação PSD+CDS e PS – continuam empatados (resultados dentro da margem de erro http://www.pedro-magalhaes.org/de-maio-a-setembro/). Ambos estão longe de se aproximar de uma «maioria absoluta». Portanto, mesmo que a Coligação ganhe as eleições, temos de nos preparar para o facto de o PS vir a formar governo.

E porquê? Porque o PS já afirmou claramente que nunca deixará passar o orçamento previsto pelo actual governo PSD+CDS e conta com os votos do PCP e do BE para bloquear a Coligação. É provável aliás que, no caso de a Coligação ser nomeada pelo Presidente da República (PR) para formar governo, o PS se junte ao PCP e ao BE para rejeitar o programa da Coligação, fazendo assim cair o governo quando a Assembleia da República não pode ser dissolvida nos primeiros seis meses.

Assim, o PR está obrigado a nomear o segundo partido mais votado, o PS, o qual necessitará obrigatoriamente de apoio maioritário do parlamento e isto significa que o PCP terá de votar a favor do PS e, se for preciso, o BE também. Presume-se que a Coligação votará contra. Claro que, no caso de o PS ter a maioria absoluta, não precisa do apoio explícito da sua «esquerda». Mas se o PS tiver apenas a maioria relativa, o PCP e o BE já terão de se abster perante o programa do PS e, possivelmente, deixar passar o seu orçamento com todas as «linhas vermelhas» do corporativismo esquerdista. O importante é que o PS não recusará o apoio do PCP, possivelmente sem este entrar para o governo, mas dando-lhe os votos para o PS tomar o poder, conforme de resto António Costa sempre se declarou disposto a fazer na Câmara de Lisboa e já sucedeu anteriormente. Não afirmou Costa afirmou explicitamente ser contra a exclusão do PCP do chamado «arco da governação»?

Teríamos então uma inesperada «frente popular» directa ou indirectamente no poder na União Europeia. Não deixa de ser uma perspectiva inquietante para um país que pretende ficar no «euro» sem problemas constantes, como o PS promete. Só que tanto o PCP como o BE e os seus ideólogos não pensam noutra coisa que não seja sair do «euro» e iniciar o desmantelamento de uma UE detestada por todos os soberanistas, digam-se eles de esquerda ou de direita.

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Por exemplo, a melhoria da notação da Standard & Poor’s ocorrida há dias arrisca-se a voltar para trás, com os custos que isso acarretaria ao nível da dívida pública, perante a chegada da «frente popular»! E daí pode deduzir-se o resto: de trambolhão em trambolhão, como na Grécia. Basta estar atento aos «slogans» patrioteiros do Bloco e do PCP contra a Europa, para nos apercebermos do que está em jogo com a chegada ao poder da «frente popular», não só no plano económico e financeiro, mas mais decisivo do que isso: no plano político da democracia.

É mais uma herança do regime socrático que nos persegue. Com a crise financeira e a intervenção dos credores estrangeiros provocada pelo despesismo clientelar do PS, do qual a esquerda parlamentar não deixou de beneficiar ao nível do emprego público, o fosso ideológico entre as elites partidárias cavou-se sem remédio desde 2009, quando Sócrates perdeu a maioria parlamentar e Cavaco persistiu em confiar-lhe o poder, com todas as consequências que se viram até ao actual processo judicial contra o antigo primeiro-ministro.

A solução normal para o empate eleitoral inscrito em todas as sondagens, num país europeu que pretende respeitar o Tratado Orçamental, é só uma: um «bloco central» como aquele que permitiu a Portugal ultrapassar a anterior bancarrota de 1983-1985 e entrar para a CEE, a qual abriu finalmente a porta à modernização do país. É o que o PR tem explicado mas o abismo ideológico que se cavou entre o PSD e o PS continua a torná-lo impossível, pelo menos para António Costa e a tribo socrática que hoje o cerca, dentro e fora do partido, perorando dia e noite na comunicação social. Infelizmente, esse «bloco central» parece excluído. Paradoxalmente, a eventual vitória da Coligação sem maioria afasta a solução que seria normal em qualquer país minimamente civilizado. O desespero socialista levá-lo-á a alianças que desembocarão numa «frente popular» tão acirrada como a de 1974-75.

Pergunto se é isso que a maioria do país quer: um salto no escuro ideológico que só nos poderá custar mais biliões em cima dos que já pagámos? Nesta situação, o desempate fica nas mãos dos abstencionistas zangados com todos os partidos. A única garantia contra a «frente popular» seria, efectivamente, a maioria absoluta da Coligação. Não querendo o eleitorado dar o poder a quem, melhor ou pior, nos tirou do buraco e ganhou respeito lá fora, resta aguardar a performance do PS e dos seus aliados, esperando pela eleição presidencial a fim de serem convocadas novas eleições parlamentares. Mas também isso está longe de ser certo neste momento. Os custos do divisionismo deste sistema partidário anquilosado, que não representa a maioria das pessoas, esses seremos sempre nós a pagá-los.