Para alguns a pergunta foi como uma armadilha, para outros tão difícil como caminhar com uns sapatos de salto alto. Cem homens portugueses foram fotografados para a revista Máxima com uns stilletos desenhados por Luís Onofre em defesa da igualdade de género, e agora que o projeto vai ser colocado em molduras, numa exposição que inaugura dia 8 de março no Centro Cultural de Belém, em Lisboa, deixámos dez desses homens manterem o que tinham calçado mas lançámos-lhes a questão: o que mais admiram nas mulheres?

“Admiro a capacidade de resistência e a capacidade de sofrimento, uma coisa que os homens têm muito menos”, começa por dizer João Tordo, não sabendo se essas características se explicam por “uma questão genética, histórica ou de sensibilidade”. “Admiro também a capacidade de se conseguirem organizar e fazer várias coisas ao mesmo tempo. As mulheres são mentalmente organizadas, enquanto os homens tendem a ser mais obsessivos. Como são mais obcecados, quando têm um problema qualquer, esse problema toma proporções cada vez maiores. Admiro ainda a capacidade para a empatia, uma qualidade importante para reconhecer o sofrimento alheio. Não só o sofrimento mas a alegria. As mulheres são muito mais atentas.”

Companheiro de profissão, o escritor Valter Hugo Mãe, talvez até por uma questão de apelido, não esquece o dom da maternidade: “Admiro que saibam o milagre dos filhos, que possam fazer duas coisas ao mesmo tempo e que, às vezes, me amem.”

Afonso Cruz, que se sentou num sofá qual Pensador de Rodin em saltos altos, para ser captado pela objetiva de Branislav Šimončík, não faz uma distinção de qualidades entre os sexos mas é sensível à questão da beleza feminina: “Falando do carácter ou da alma, que me parece ser definitivamente mais importante, não creio que existam virtudes especificamente femininas. Ou seja, aprecio a bondade, a inteligência, a temperança, o humor, independentemente do género. Por isso, acho que o que mais admiro numa mulher é o corpo, com quem a Natureza (ou o Demiurgo, para quem crê) teve preocupações artísticas. Com os homens foi um bocadinho mais desleixada. Só para dar um exemplo: não precisávamos de pelos no peito.”

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As questões anatómicas foram sublinhadas por vários homens interpelados pelo Observador. Veja-se o jornalista João Miguel Tavares: “O que eu mais admiro nas mulheres? Isso é claramente uma pergunta armadilhada. Aquilo que verdadeiramente faz as mulheres serem mulheres são questões anatómicas dignas da maior admiração. Só que, infelizmente, elas não podem ser explicitadas sem um homem correr o risco de parecer deselegante e primário.
Qualquer resposta está, por isso, condenada ao fracasso. Por um lado, se eu disser que aquilo que mais gosto numa mulher são determinados detalhes da sua anatomia, serei imediatamente acusado de misoginia e de objetificação. Por outro lado, se disser que são determinados traços do seu carácter, serei imediatamente acusado de generalização abusiva e de promoção de estereótipos.
Ora, isto só pode significar uma coisa: que esta pergunta foi inventada por uma mulher. E é isso que eu mais admiro nelas: a capacidade que têm de nos empurrarem para becos sem saída, de onde só podemos sair derrotados, de cabeça baixa e rendidos aos seus ardis. Ah, as sereias…”

Ah, as saboneteiras, diz antes Kalaf, dos Buraka Som Sistema: “Admiro a forma ténue, o olhar e os gestos subtis que, sem necessidade de palavras, conseguem carregar uma força transformadora e me fazem querer ser um homem melhor. Admiro-lhes a perspicácia, a sensualidade e a beleza que se estende além dos atributos físicos. E seguindo a linha de pensamento do poeta Vinicius, que tão acertadamente afirmou ‘nádegas é importantíssimo. Grave, porém, é o problema das saboneteiras. Uma mulher sem saboneteiras é como um rio sem pontes’, nomeio as saboneteiras – termo brasileiro que identifica as pequenas cavidades entre o pescoço e os ombros, área cientificamente denominada de triângulo supraclavicular — como uma das partes do corpo feminino que mais admiro.”

Criado há um ano, no Dia Internacional da Mulher, 8 de março de 2014, para lutar pelos direitos femininos, o projeto da revista Máxima 100 Homens, Sem Preconceitos – Um Passo pela Igualdade, parece ter deixado marcas em todos os homens retratados, de músicos a cientistas, passando por atores, atletas, modelos e médicos – e não só nos pés apertados por sapatos em bico.

“O que mais admiro nas mulheres é o facto de não serem menos que os homens”, diz David Santos, mais conhecido pelo nome artístico que assume quando pega na guitarra e canta ao microfone — Noiserv.

Ljubomir Stanisic, apesar do ar guerreiro com que segura num gancho e domina um enorme atum na arca frigorífica do seu restaurante 100 Maneiras, reconhece uma força suprema ao outro sexo: “O que mais admiro numa mulher é o poder de dizer um não redondo — há poucas pessoas que têm coragem de dizer não. As mulheres são fascinantes exatamente porque são mulheres, não devem querer ser homens.”

Se não fossem mulheres, não seriam metades tão capazes de completar o sexo oposto, sugere o apresentador Manuel Luís Goucha: “O que mais admiro nas mulheres é o que me acrescentam enquanto homem.”

Pedro Lima, por sua vez, volta aos atributos femininos, mais precisamente à “beleza”: “[Admiro a forma] como acordam, como se movem, como respiram, como olham, como pensam, como agem, como sorriem, como choram, como sofrem, como sentem saudades… Como tornam a vida de todos nós mais bela.”

Uma qualidade sublinhada igualmente pelo também ator Pedro Teixeira, que remata: “O que mais admiro nas mulheres é a personalidade, a beleza, a garra, a força… O simples facto de serem mulheres.”

Para admirar estes e outros 90 homens com mais dez centímetros de altura, anote estas datas: 100 Homens Sem Preconceitos – Um Passo Pela Igualdade, inaugura dia 8 de março, às 18h00, no Centro Cultural de Belém. A exposição está aberta ao público entre 9 de março e 2 de abril, das 10h00 às 18h00, e é de entrada livre. Ao mesmo tempo, é lançado um livro com objetivos muito mais do que decorativos: todas as receitas angariadas com cada exemplar, assim como com a venda das fotografias expostas, reverte a favor da associação Laço, que trabalha na prevenção e apoio às mulheres com cancro da mama.

Porque também se pode admirar isto: as mulheres, juntamente com os homens, fazem as coisas acontecer.