As análises feitas aos oito reclusos que se sentiram mal na cadeia de Castelo Branco, alegadamente por causa de uma droga que consumiram, revelaram a presença de canabinoides, mas não da droga que inicialmente se suspeitava, a ketamina. Ainda assim, alertou uma especialista ao Observador, os reclusos poderão ter consumido um cocktail de drogas cujas análises nunca vão conseguir revelar.

Para a diretora dos Serviços de Planeamento e Intervenção do Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD) é “muito estranho” que os canabinoides tenham tido consequências tão graves nos reclusos. Recorde-se que todos eles necessitaram de ser ventilados e que um deles permanece em estado crítico. Graça Vilar desconhece as quantidades de droga ingerida pelos reclusos e até reconhece que, atualmente, há canabinoides com um “potencial de toxicidade enorme”.

No entanto, afirma, o mais provável é que os reclusos tenham tomado outras drogas. “Provavelmente teria outras misturas. Para haver necessidade de assistência cardiorrespiratória é porque a droga teve um efeito de destruição”.

“Por vezes em laboratório podem não concluir quais são as substâncias presentes no sangue”, diz Graça Vilar.

O consumo nas prisões é um reflexo do consumo de droga na sociedade. E, ultimamente, tem-se assistido ao aparecimento de uma grande “panóplia de canabinoides”, seja para diluir em chás ou, mesmo, para inalar. “As apresentações são completamente distintas e a sua intensidade muito maior com consequências ao nível neurocognitivo muito maiores”, refere. Perturbações de memória, dificuldades de atenção e de captação de atenção, perda de memoria recente, irritabilidade e ataques de pânico são alguns dos sintomas destas drogas.

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Episódios como o registado em Castelo Branco não são muito comuns em Portugal, onde há uma maior preferência pelos canabinoides, mas têm sido comuns noutros países europeus. Não quer dizer que não exista o consumo de outras drogas, como a ketamina – que inicialmente se suspeitou ter sido a droga consumida por estes reclusos.

A ketamina, explica Graça Vilar, é um anestésico que serve para anestesiar (nas doses adequadas) sem levar à perda de consciência. Quem o utiliza pode ter uma experiência “aterradora”, que advém das alterações da perceção, um efeito diferente dos alucinogénios. “Podem sentir coisas bizarras como coisas de baixo da pele ou atribuírem imagens a sons. Os indivíduos que a consomem podem também ficar com delírios”, refere a psiquiatra que, numa situação profissional, teve que lidar com um paciente que tinha consumido e que entrou numa agitação psicomotora com a qual ele próprio não conseguia lidar.

Drogas à distancia de um clique

Depois há uma série de outras substâncias que chegam a ser vendidas através da internet. O Observador encontrou um site de venda de estupefacientes cuja empresa tem sede na Holanda, mas cuja página está traduzida em várias línguas, nomeadamente em português. Nos avisos, alertam para o facto de venderem para uma série de países independentemente se ser ou não legal a venda nos países de destino. E desresponsabilizam-se de qualquer consequência legal ou, mesmo, na saúde do cliente.

“Muitos sites só dizem maravilhas destas substâncias, mas depois nem sequer especificam a sua composição. As pessoas nem sabem o que estão a consumir. E depois são drogas e descrições muito apelativas, que podem levar qualquer pessoa com predisposição a consumir a adquiri-las”, diz.

Os reclusos de Castelo Branco terão obtido a droga através de uma compra da internet. Desconhece-se, para já, o que compraram e onde. Uma das drogas disponibilizadas nestas páginas é o kratom, uma substância que imita os efeitos dos opiáceos, mas que a partir de determinada quantidade pode também ter efeitos estimulantes.

“É muito enganoso e não é só para os jovens, qualquer adulto predisposto a tomar. Mas mete medo”, alerta Graça Vilar.