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  • "Vamos continuar a falar"

    A quarta e última Conferência Constituinte organizada pelo Observador chegou ao fim. Em jeito de despedida, António Barreto deixou uma mensagem de esperança e um repto. Primeiro, “com cautelas e algumas sorte, é possível que a Constituição possa ser melhorada. Há uma luzinha, há alguma esperança” de que isso seja possível.

    O segundo, e que serve também de mote ao Observador, é o desafio colocado por António Barreto para que esta discussão não fique por aqui. “Vamos continuar a falar. Vamos continuar a pensar. A única coisa que os políticos mais surdos temem e que as pessoas falem e tenham uma opinião”.

    Boa tarde e muito obrigado por nos ter seguido.

  • No que diz respeito às competências reais do Presidente da República, Gonçalo Almeida Ribeiro reconheceu que, de facto, “existe um desfasamento e uma discrepância entre a enorme legitimidade e os poderes” do Chefe de Estado. Mas levantou algumas dúvidas sobra a ideia de Braga da Cruz de transformar a eleição do Presidente da República numa eleição indireta, pois, argumentou, tal poderia significar uma afastamento “perigoso” em relação às expectativas específicas da sociedade portuguesa e o modo como os portugueses vêm e entendem a figura do Presidente.

  • Rui Ramos também pegou neste ponto, sobre a falta de legitimidade democrática. O historiador reconheceu que “os simples mecanismos eleitorais”, por si só, “não dão essa representação” que os cidadãos esperam. Mesmo os governos legitimamente eleitos podem resultar “de uma sensação de falta de escolha, que não elimina esse distanciamento e alienação” entre eleitores e eleitos. 

    O historiador concorda com a ideia exposta por Rui Vilar de “reformar gradualmente o que vai sendo possível reformar”. No entanto, Rui Ramos acredita que “isso não resolve o problema do consenso que é necessário – e não existe – para conduzir essas mesmas reformas”. Ou seja, mesmo esse processo gradual de transformação está sequestrado pela falta de sentido de compromisso dos partidos políticos.

     

  • Nesse sentido, Braga da Cruz voltou a insistir na necessidade de rever a lei eleitoral. “Isto só se resolve através da lei eleitoral. Não vejo maneira de obrigar os partidos a abrirem [os seus limites], sem mexer na lei eleitoral. Mas é um processo muito complexo e que comporta vários problemas. [No entanto], é fundamental reforçar a legitimidade cidadã neste recrutamento político”, defendeu o professor e doutor em Sociologia Política.

  • Manuel Braga da Cruz, desafiado a pronunciar-se sobre o crescente distanciamento entre eleitos e eleitores e a falta de legitimidade que a classe política tem assumido aos olhos dos cidadãos, começou por reconhecer que essa falta de legitimidade é um problema enraizado nas máquinas partidárias. “O recrutamento político é cada vez mais feito pelos partidos. E os partidos, desculpem-me a expressão, estão-se borrifando conjunto dos cidadãos”.

     

  • Termina assim a primeira ronda de intervenções. O debate é agora aberto à plateia.

  • O caminho até à revisão constitucional faz-se de pequenos passos

    “É necessária uma grande pedagogia e um processo que não dará, certamente, resultados a curto prazo” que permita criar uma “sociedade mais informada e mais capaz” de discutir e avaliar as questões constitucionais. Só assim, defende Rui Vilar, o poder político – bloqueado e indiferente à discussão sobre as fragilidades da Lei Fundamental – será chamado a responder. Será sempre uma discussão e “um processo gradualista” reconhece.

    Rui Vilar, que também defende uma revisão da Constitucional, acredita que o “tal momento constituinte” de que falava Rui Ramos só surgirá muito provavelmente no aniversários dos “50 anos da Constituinte”, ironizou. De uma forma “pragmática”, o ex-governante defende que esse caminho até ao momento constituinte seja preenchido por alterações graduais em matérias como a justiça, os direitos económicos e Segurança Social, por exemplo.  

  • É a vez de Rui Vilar, ex-ministro Ministro dos Transportes e Comunicações do I Governo Constitucional. O jurista começa a sua argumentação por dizer que “o mal-estar que existe em relação ao sistema político e em relação às instituições europeias, leva-nos muitas vezes a pensar que mudando as leis mudaríamos os protagonistas”. Esse não deve ser o princípio, defendeu.

  • Consenso político improvável - os partidos não abdicam dos seus trunfos

    Rui Ramos concorda com os anteriores oradores: a revisão constitucional seria viável, mas é, neste momento, altamente improvável. E explica: “Os partidos que estiveram envolvidos nas revisões constitucionais e, também, nos trabalhos da Assembleia Constituinte, parecem-me hoje envolvidos em conflitos que os levam a não querer abrir mão daquele trunfo que é não colaborar com o outro partido“. 

    O historiador continua: se em 1982, a revisão foi possível porque existia ainda “um inimigo comum” – a força militar, hoje esse inimigo comum já não existe; se em 1989, a revisão constitucional foi motivada pelo “projeto europeu”, hoje essa motivação já não existe. “Será que vamos ter essa outra pressão que o leve a esse entendimento?”, questionou Rui Ramos. 

  • “Esse novo momento constitucional significaria que os grandes protagonistas da vida política” estariam disponíveis para tomar uma “decisão” no sentido de “estabelecer um consenso” que permita adaptar a Constituição a “um mundo que mudou muito”, afirmou Rui Ramos, lembrando, por exemplo, o processo de integração. Só este “verdadeiro sentido de compromisso”, acredita o historiador, permitirá proteger “o primeiro regime que nos permitiu ter eleições verdadeiramente livres em Portugal”.

  • “Creio que estaríamos no momento de enfrentar esta situação de quase vazio ou confusão constitucional”, defendeu Rui Ramos. Ainda assim, o historiador acredita que esse combate deve ser travado com sentido de compromisso entre as várias forças políticas.

  • Rui Ramos toma a palavra. E começa por pegar num ponto levantado por Braga da Cruz: o “distanciamento” entre as pessoas e o texto da Constituição, por vezes “muito obscuro” e pouco compreensível. “As pessoas não sabem o que é ou não constitucional”, sublinha.

  • O regresso à "tradição bicameralista" para travar os problemas de legitimidade e poder

    Manuel Braga da Cruz acredita que o país enfrenta neste momento um problema de legitimidade e de poder. E dá o exemplo do cargo de Presidente da República. “Nós temos um problema de excesso de legitimidade na forma do cargo de Presidente da República”, que depois não se espelha no “poder real” e nas competências do Chefe de Estado.

    Nesse sentido, Braga da Cruz defende uma “mudança do sistema eleitoral” que altere não só os poderes e o modelo de eleição do Chefe de Estado, mas também o sistema de eleição da Assembleia da República. 

    E traça o caminho: “Precisamos de pessoalizar o voto; precisamos de dar a possibilidade aos portugueses de escolherem não apenas os partidos, mas os seus representantes; precisamos que o monopólio partidário seja combinado com a vontade dos portugueses; precisamos que os partidos não mandem tanto nos deputados; precisamos de promover um sistema que garanta a estabilidade governativa; [e] precisamos de corrigir as fragilidades do sistema proporcional”. 

    Mais: o professor e doutor em Sociologia Política, defende o regresso “à tradição bicameralista portuguesa”.

  • É a vez de Manuel Braga da Cruz. O especialista em Sociologia Política partilha da opinião de Gonçalo Almeida Ribeiro: embora defenda a revisão constitucional, é muito improvável que tal aconteça. “Não existe o consenso político” necessário para se levar a cabo uma verdadeira proposta de revisão constitucional.

  • Gonçalo Almeida Ribeiro terminou a sua intervenção dizendo estar pouco otimista em relação a uma eventual revisão constitucional.

  • O jurista destaca também um terceiro e quarto sintomas da patologia: “a intoxicação constitucional”, que cria demasiados entraves ao legislador ordinário, e a “captura da discussão” sobre a Constituição, que limita profundamente o debate.

  • Um segundo “sintoma patológico” da Lei Fundamental, considera Gonçalo Almeida Ribeiro, é a “saturação constitucional” que hoje afeta a Constituição. O jurista lembrou as várias revisões e alterações feitas ao Texto Fundamental, em processos muitas vezes pouco transparentes e que enfraqueceram a eficácia e a legitimidade da Constituição.

  • Uma Constituição doente: o "bloqueio constitucional"

    Gonçalo Almeida Ribeiro, membro da equipa técnica do projeto Nova Constituição, toma a palavra. O jurista começa por defender que a Constituição de 1976 assenta numa lógica de “campo de trincheiras”, no fundo, porque tentou acomodar duas visões políticas e ideológicas antagónicas. O resultado? Aquilo que Gonçalo Almeida Ribeiro considera ser hoje um “bloqueio constitucional”, que trava qualquer tipo de consenso político em torno de uma eventual revisão constitucional.

  • “Estou convencido que não haverá uma revisão Constitucional, pelo menos profunda”. António Barreto acredita que “o consenso político” necessário à revisão da Constituição “hoje não existe ou é muito difícil” entre os principais partidos.

  • O ex-governante, também ele deputado constituinte, considera que a Constituição está “hoje fora de tempo”. Mas fez questão de lembrar que, durante os anos que se seguiram à Revolução dos Cravos, foi uma “obra-prima” que permitiu travar qualquer tipo de tentativa “despótica” dos que queriam tomar o poder. Ou seja, para António Barreto, a Constituição nascida em 1976 permitiu proteger a jovem democracia portuguesa.

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