É um momento decisivo para Rui Tavares e companhia. Este fim de semana, os 385 candidatos do Livre/Tempo de Avançar, que juntou o historiador aos ex-bloquistas Ana Drago e Daniel Oliveira, vão a votos em eleições primárias para decidir quem avança para as legislativas como candidato a ocupar uma vaga no Palácio de São Bento.

A definição do programa eleitoral só deverá acontecer quando as listas já estiverem fechadas, mas, até lá, a candidatura Livre/Tempo de Avançar quer pôr todos os partidos anti-austeridade a assinar um documento conjunto, a que chama “Agenda Inadiável”, com vista “à construção de uma nova maioria parlamentar”.

O documento “está em construção” e “não está fechado” a novos contributos, explica Renato Carmo, da comissão coordenadora da candidatura, em declarações ao Observador. Mas propostas como a renegociação da dívida pública, o fim das privatizações e o reforço do Serviço Nacional de Saúde são trunfos de que a candidatura não abdicará. Mas há mais, muito mais.

Rui Tavares e Ana Drago querem, por exemplo, eliminar as taxas moderadoras do SNS, reduzir as propinas e as custas judiciais, tornar o abono de família uma prestação universal, reduzir o IVA cobrado na restauração para 13% e garantir a todos os portugueses o acesso básico a água, gás e eletricidade – medida que será financiada através de um subsídio cruzado suportado pelos maiores consumidores. Ao todo, são dez prioridades e 50 propostas do Livre/Tempo de Avançar. Conheça algumas delas aqui.

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1. Devolver a política aos cidadãos, garantir direitos fundamentais

  • Referendar novos tratados ou alterações aos tratados da União Europeia – O Livre/Tempo de Avançar quer tornar o sistema político português “mais transparente” e mais aberto “à iniciativa da sociedade civil”. E para isso, propõe, entre outras coisas, que se façam referendos a “qualquer novo tratado, ou [à] alteração substancial aos tratados existentes”.
  • Expandir a agenda de direitos fundamentais – Rui Tavares e Ana Drago defendem também o “acesso à adoção plena” por parte de casais do mesmo sexo. Além disso, querem alargar e tornar as técnicas de Procriação Medicamente Assistida às mulheres solteiras e a casais de mulheres.
  • Democratizar a cultura: Reforçar o investimento na Cultura é uma das apostas da candidatura cidadã. Nesse linha, o Tempo de Avançar propõe o regresso – com competências alargadas – do Ministério da Cultura e a atribuição até ao final da legislatura de 1% da receita orçamental à Cultura. Este foi um dos pontos que foi acrescentado à primeira versão do documento, revelou Renato Carmo.

2. Libertar o Estado da Captura Privada

  • Suspender as privatizações, as concessões e as parcerias públicoprivadas – A coligação eleitoral Livre/Tempo de Avançar quer que todos os partidos anti-austeridade se juntem para colocar um travão às privatizações. “Todos os processos de privatização e concessão em curso ou planeados devem ser suspensos. Os processos de privatização realizados durante a vigência do memorando devem ser auditados, visando esclarecer a sua legalidade, avaliar os seus efeitos e averiguar possíveis mecanismos de reversão. Defendemos uma auditoria aos contratos de parcerias público-privadas, apreciando a sua legalidade, designadamente para o efeito de uma eventual resolução“, pode ler-se do documento.
  • Desprivatizar a Administração Pública e o serviço público – Os contratos de privatização na Administração e setor públicos “devem ser revistos, tendo em vista a cessação dos [contratos de prestação de serviços] que são redundantes em relação a capacidades que devem existir na Administração Pública”, defende a candidatura cidadã.
  • Promover um sector financeiro mais transparente e ao serviço da economia – Se chegarem a São Bento, os candidatos do Livre/Tempo de Avançar vão bater-se por um maior escrutínio do setor bancário, dizem. “Os bancos e as empresas não financeiras de um mesmo grupo económico deverão ser segregados. As transferências de capitais entre o setor bancário e paraísos fiscais, que não divulguem de forma transparente os beneficiários, deverão ser proibidas pela União”.

3. Renegociar a dívida pública para recuperar

  • Reestruturar a dívida para relançar a economia – A reestruturação e renegociação da dívida pública são há muito duas bandeiras assumidas por Rui Tavares e Ana Drago. O Livre/Tempo de Avançar defende que Portugal deve procurar junto com outros parceiros europeus a “resolução multilateral do problema das dívidas públicas na Zona Euro”. E, como sabem que o caminho será tudo menos fácil, os candidatos a candidatos deixam o aviso: “Portugal não pode aceitar o bloqueio do acesso dos bancos ao financiamento do BCE ou ameaças de exclusão da zona euro. O Estado português deverá estar política, técnica e financeiramente preparado para lidar com cenários e contingências adversas“;
  • Recuperar os juros pagos ao Eurosistema –  Na mesma linha,  e “a exemplo do que foi acordado em 2012 para a Grécia”, Rui Tavares, Ana Drago e companhia defendem que “os juros pagos por cada país desde 2013 devem ser reembolsados, descontadas as provisões, a cada um dos Estados”.

4. Resgatar as pessoas e as empresas

  • Constituir um fundo de resgate para indivíduos, famílias e PME – Com o mote “as pessoas devem estar à frente das dívidas”, o Livre/Tempo de Avançar está disposto a apostar na criação de um “fundo de resgate” público, financiado “por contribuições das instituições financeiras”, que seja responsável por, entre outras coisas, “negociar e comprar créditos de pessoas e pequenas empresas aos seus credores”. O objetivo é encontrar uma solução para dívida privada das famílias e das pequenas e médias empresas (PME).
  • Resolver dívidas de crédito à habitação – Rui Tavares e Ana Drago propõem, ainda, que seja possível aos devedores que não consigam saldar ou renegociar a sua dívida ao Estado, lhes seja permitido entregar o imóvel como forma de se libertarem da dívida (dação em cumprimento). Mas antes de ser alterada a lei nesse sentido, todas as execuções das casas de habitação dos devedores devem ser suspensas temporariamente, defendem.

5. Acabar com a precariedade, dignificar o trabalho, proteger o emprego, garantir as pensões

  • Restabelecer a justiça salarial – Outra das bandeiras já assumidas pela candidatura cidadão é “o aumento gradual do salário mínimo nacional”. Embora não avance com valores concretos para já, Livre/Tempo de Avançar defende que se institua um “um limiar de pobreza salarial de cerca de 530 euros“, que servirá como linha vermelha para o salário mínimo nacional a fixar em 2016 – “em caso algum [o salário mínimo] deverá ser inferior” a 530 euros, defende. Por outro lado, “devem limitar-se as atribuições excessivas de bónus e de outras formas de remuneração extraordinária de cargos públicos”, acrescentam ainda. No que diz respeito aos cortes nos salários da Administração Pública dos últimos anos, Rui Tavares e Ana Drago pensam que “devem ser revertidos“. 
  • Garantir contratos com direitos para quem trabalha por conta de outrem – O Livre/Tempo de Avançar quer também apertar a malha “ao falso trabalho independente” e “ao abuso nos contratos a termo, nas bolsas e nos estágios”, assim como combater “as más práticas das empresas de trabalho temporário”. O Objetivo, diz a candidatura cidadã, é promover e potenciar os “contratos efetivos de trabalho, sem redução dos níveis líquidos de remuneração e com normal inserção numa carreira profissional“.
  • Estabelecer como regra as 35 horas – Rui Tavares e Ana Drago não excluem a hipótese de ver aumentado o  limite estabelecido para a jornada semanal de trabalho para as 40 horas, desde que haja uma compensação a nível da remuneração salarial. A regra, dizem, deve ser as 35 horas.

6. Cumprir a Constituição no sistema fiscal: “uma repartição justa dos rendimentos e da riqueza”

  • IRS – Em matéria de impostos, o Livre/Tempo de Avançar propõe uma série de medias para “diminuir as desigualdades” entre os portugueses mais ricos e os com menos possibilidades. Nessa linha, defende, primeiro, o aumento do número de escalões e a revisão das respetivas taxas, com o objetivo de diminuir as taxas dos escalões inferiores e agravar a tributação dos rendimentos muito elevados”; segundo, eliminar a sobretaxa e a taxa adicional de solidariedade; e, por fim, eliminar também o quociente familiar introduzido em 2015, “que tem uma natureza regressiva, substituindo-o por deduções pelo número de filhos e outros dependentes”.
  • Tributação das Empresas – No que diz respeito às empresas, os promotores da candidatura cidadã querem que Portugal lidere na Europa o combate aos paraísos fiscais e às fugas aos impostos. “A situação de alguns países da União Europeia funcionarem como paraísos fiscais destinados a promover a deslocalização das sedes de empresas de outros Estados-membros é inaceitável e deve merecer do Estado Português uma rejeição total. Para atenuar os efeitos dessa situação, devem considerar-se como tendo direção efetiva em Portugal – e por isso aqui sujeitas a IRC – todas as empresas relativamente às quais seja possível apurar, mesmo indiciariamente, uma vinculação maioritária ao nosso país (considerando o efetivo lugar de decisão e tendo em conta o território gerador de rendimento). Esta alteração abrangeria grande parte das empresas que hoje fazem parte do PSI 20“, defendem. A candidatura cidadã quer também tributar a “a transmissão onerosa de partes sociais ou instrumentos equivalentes”. No entanto, no caso de haver reinvestimento, os autores da Agenda Inadiável propõem a exclusão da tributação de uma parcela até 50%”.
  • Tributação do património – Nas “sucessões e doações deve eliminar-se a isenção de imposto de selo que incide sobre as transmissões a favor do cônjuge, filhos e pais, com valor líquido superior a €500.000,00, as quais devem ficar sujeitas à taxa geral de 10%“, defende o Tempo de Avançar. Os fundos de investimento imobiliário também não terão vida fácil e deverão ver eliminadas as isenções a que estão sujeitos em sede de IMI.
  • A Tributação do Consumo – A restauração também não será esquecida. Rui Tavares e Ana Drago defendem a redução da taxa de IVA para os 13%. Ao mesmo tempo, “o IVA deve ser progressivamente alargado a toda a fileira da construção civil, deixando a aquisição de casas novas de ser tributada em sede de IMT e ficando sujeita a uma taxa de IVA reduzida”. Já a “transmissão das habitações de luxo seria agravada em IVA ou em imposto de selo“, defendem.

7. Redistribuir para combater as desigualdades sociais

  • Garantir os provimentos básicos de água, gás e eletricidade – Esta é uma das medidas de maior destaque.”Os quantitativos mínimos de água, eletricidade e gás devem ser providos gratuitamente, defende o Livre/Tempo de Avançar. Esses quantitativos mínimos deverão ser definidos, entre outras coisas, de acordo com as recomendações internacionais e a medida será financeiramente suportada através de um “subsídio cruzado por parte dos maiores consumidores através do estabelecimento de tarifas progressivas por patamares de consumo doméstico per capita”, explicam os autores da proposta.
  • Restabelecer o acesso ao Rendimento Social de Inserção (RSI) – Ao mesmo tempo, Rui Tavares e Ana Drago defendem uma marcha atrás completa na reforma do RSI. “Devem (…) retomar-se os ponderadores e o valor de referência para a formação desta prestação anteriores às reformas do RSI de 2010 e 2012“.
  • Combater a pobreza nas crianças e nos jovens – Como forma de travar o aumento da pobreza infantil e ajudar as famílias a suportarem as despesas, o Livre/Tempo de Avançar defende o regresso do abono de família “como prestação universal”.
  • Combater a pobreza e a exclusão social dos idosos – Já que no diz respeito aos idosos, os organizadores da candidatura cidadã defendem a criação de uma “rede de cuidadores que prestem serviços domiciliários aos idosos e “o acesso a residências sénior em condições de qualidade e com custos proporcionais ao valor dos rendimentos”.
  • Eliminar as taxas moderadoras do SNS, reduzir as propinas e as custas judiciais  –  Por último, no que ao combate às desigualdades diz respeito o Tempo de Avançar defende a eliminação das taxas moderadoras no Serviço Nacional de Saúde (SNS), a redução das propinas do ensino superior e a redução das custas judiciais. “Estas taxas têm privado muitos portugueses do direito à saúde, à educação e à justiça”, pode ler-se no documento.

8. Melhorar os serviços públicos criando emprego

  • Saúde – Ainda na Saúde, Rui Tavares e Ana Drago querem “reforçar o Serviço Nacional de Saúde“, recrutando “novos profissionais ” que sejam capazes de suprir as “atuais carências em todas as instituições do SNS”. O objetivo final é devolver ao SNS a capacidade de cumprir com “os tempos de resposta” previstos por lei, de desenvolver uma “política de prevenção da doença, de promoção da saúde e da qualidade de esperança de vida” capaz e de desenvolver, também, uma política de administração de saúde de proximidade.
  • Justiça – O Livre/Tempo de Avançar defende, igualmente, um reforço dos recursos dos tribunais de forma a “garantir uma justiça célere e acessível a todos”. Para os autores da proposta, a revisão do mapa judiciário português conduzida pelo atual Executivo “degradou as condições de acesso das populações à
    justiça”. Como tal, tem de ser “reavaliada e corrigida“, defendem.
  • Educação – Na área da Educação, a candidatura cidadã propõe, entre muitas outras coisas, o fim dos exames nacionais do quarto e sexto ano, privilegiando sempre a avaliação contínua dos estudantes portugueses e, ao mesmo tempo, a reavaliação das subvenções aos colégios privados, “limitando-as a territórios ou ofertas específicas, em que transitoriamente suprem uma carência local da
    rede pública”.

9. Apoiar o investimento e a criação de emprego nas micro, pequenas e médias empresas

  • Melhorar as condições de acesso das PME ao financiamento – O auxílio às pequenas e médias empresas (PME) foi um dos pontos que foi reforçado em relação à versão inicial do documento, como explicou Renato Carmo da comissão coordenadora da candidatura ao Observador. Nessa linha, o Livre/Tempo de Avançar defende que a Instituição Financeira de Desenvolvimento (Banco de Fomento), criada em outubro de 2014, mas que nunca “entrou em funcionamento”, deve “iniciar urgentemente a sua atividade”, operando de forma “descentralizada” e “orientado para o financiamento do investimento das PME em condições mais favoráveis que as oferecidas pela banca comercial“.
  • Apostar na qualificação dos empresários e quadros de gestão – A pouca qualificação e falta de preparação dos gestores e dos empresários portugueses é outra das preocupações da candidatura cidadã. “Devem incentivar-se parcerias das universidades e institutos politécnicos com associações empresariais, com o objetivo de melhorar a qualificação de empresários e quadros, com especial enfoque nos que atualmente exercem estas funções”, pode ler-se no documento.

10. Apostar nos territórios e na economia local

  • Reorganizar as redes de serviços públicos – Para combater aquilo que dizem ser a “desertificação rural”, a “desvalorização dos recursos do território (terrestre e marítimo)” e as “dificuldades na afirmação
    das cidades médias e das economias locais”, Rui Tavares e Ana Drago propõem, entre outras coisas, “a criação de uma unidade técnica para a avaliação integrada das medidas de racionalização das redes de serviços públicos e das políticas de descentralização de competências da administração central”. O objetivo é perceber é avaliar a real necessidade e os impactos para o território de encerrar determinado serviço. “Nem mais um serviço público deve ser encerrado sem ser avaliado o impacto na desigualdade social e territorial“.
  • Lançar um programa de recuperação da infraestrutura ferroviária – Outra das propostas do Tempo de Avançar, passa por apostar na recuperação da infraestrutura ferroviária através dos fundos comunitários. “Deve ser reprogramada a utilização dos fundos do quadro comunitário de apoio, dando prioridade à
    recuperação e reinvestimento na rede ferroviária. Deve ser dada prioridade à construção da ligação ferroviária entre o porto de Sines e a Europapode ler-se na proposta de “Agenda Inadiável” da coligação Livre/Tempo de Avançar.