No Credito Emiliano (Credem) há com certeza cofres com ouro, mas a sala onde até se passava um serão agradável é outra — a que armazena centenas de milhar de rodas de queijo parmesão. Desde 2013 passaram por lá cerca de 430 mil queijos avaliados, nesse ano, em mais de 200 milhões de euros. É uma quantidade massiva de tentação mas é importante não pecar: estes queijos são a garantia dos empréstimos concedidos a centenas de produtores do verdadeiro Parmigiano-Reggiano.

Emilia-Romagna, a região italiana onde ficam cidades como Bolonha, Parma ou Modena, é a única onde se produz o verdadeiro Parmigiano-Reggiano, mas com a crise económica cerca de 100 produtores — 20% do total — fecharam as portas entre 2008 e 2011. Este empréstimo do Credem quer ajudar a combater as dificuldades dos produtores locais.

Um parmesão muito sensível

Para que uma roda de cerca de 40 quilos atinja o valor de 770 euros tem de envelhecer no mínimo dois anos com muita atenção às condições de armazenamento: temperatura controlada, tem de ser virada e batida com martelos de metal, e a sua textura tem de ser conferida por especialistas.

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Depois de um ano de envelhecimento, o queijo deve ser avaliado para receber o selo que lhe dá o nome Parmigiano-Reggiano — e tão só este selo já faz o valor comercial disparar. Se chumbar no teste, só poderá ser chamado queijo italiano, como qualquer outro. E há muita coisa que pode correr mal: o queijo pode transpirar, criar bolhas ou inchar ao ponto de rachar — o que acontece a cerca de 1% dos queijos no banco, e a 10% dos queijos quando tratados pelos próprios produtores, revela o estudo Credem: Banking on Cheese, da Universidade de Harvard.

Neste espaço de dois anos, os queijos não rendem dinheiro aos produtores, e as despesas adensam-se na manutenção contínua do produto e no tratamento do gado. Ao entregarem os seus queijos ao banco — no primeiro ano de vida, quando valem apenas cerca de 7 euros a peça — os produtores recebem dinheiro que investem no negócio e libertam-se dos custos de maturação com a garantia de que, nas salas do Credem, queijos vulgares se tornam preciosos.

Turin, ITALY:  Picture taken 26 october 2006 in Turin of the logo of Parmigiano Reggiano at the Salone del Gusto. The Slow Food movement kicks off its second world gathering, with delegates from 150 countries, pledging to "sow the seeds of virtuous globalization" by finding ways to promote quality food, sustainable agriculture and biodiversity.  AFP PHOTO / FILIPPO MONTEFORTE  (Photo credit should read FILIPPO MONTEFORTE/AFP/Getty Images)

Este é o selo que se procura.

Por causa do armazenamento em massa, é mais barato para o banco responder a todos os muito específicos requisitos de envelhecimento do Parmigiano-Reggiano. A garantia de que o queijo vai envelhecer em ótimas condições torna estes empréstimos ainda mais atrativos para os produtores, que na maior parte das vezes recuperam os queijos já com selo de qualidade.

Este tipo de empréstimo “faz com que o Credem seja visto como um banco que se preocupa com a comunidade, com a região e com os seus produtores”, disse à Forbes Nikolaos Trichakis, professor em Harvard e que conduziu o estudo. “Em Itália as pessoas não gostam muito de empréstimos. Associam à usura e aos agiotas, desde o tempo do Shylock, do Mercador de Veneza. Muita gente ainda vê os bancos dessa maneira. Por isso, quando um banco consegue ter esta infraestrutura ao dispor da comunidade, tem valor”, explica.

Queijos até ao teto, como há centenas de anos

Para diminuir os custos de produção e tornar o negócio mais estável, os pequenos produtores podiam fundir-se, mas “permanecem separados por tradição”, diz o professor. “A maioria destas famílias produz queijo há séculos e tem orgulho no que faz, rejeitando tornar-se parte de uma grande industria.” Este tipo de crédito é igualmente antigo: acontecia no tempo dos Medicis e caiu depois em desuso, mas voltou pelo Credem em 1953.

Nos dois grandes armazéns do banco italiano, onde braços mecânicos viram os queijos em prateleiras altas a perder de vista, há uma constante monitorização do estado dos queijos, o que equivale a dizer, uma constante avaliação do seu valor comercial. “Para o banco não tem praticamente risco nenhum”, diz Trichakis. “Eles têm a garantia na sua posse durante todo o processo de envelhecimento. Quando encontram algum problema — como bolhas, por exemplo — eles dizem ‘isto não vale tanto como pensámos’ e imediatamente chamam os produtores”. Neste ponto o próprio banco vende os queijos, mas se tudo correr bem, no final do empréstimo, são os produtores a reaver as peças e a vendê-las eles próprios no mercado, o que acontece na maioria das vezes.

Entrar nos armazéns de Parmigiano-Reggiano e ver o padrão de rodas amarelas a repetir-se até ao teto é realmente, neste caso, como ver dinheiro ou ouro. Em todos os aspetos: a segurança já foi reforçada porque estes armazéns já foram assaltados várias vezes. Em 2009 contaram-se três, e da última saíram 570 rodas por um túnel.