Dahala Khagrabari é um enclave rodeado por um enclave, que está rodeado por outro enclave, que por sua vez está rodeado por outro estado. Confuso? Bem, comecemos ao contrário, de fora para dentro. O Bangladesh, país vizinho da Índia, tem pequenas “ilhas” de território indiano. Num desses pequenos pedaços de Índia, existe um pedaço ainda mais pequeno de território bangladeshiano, que por sua vez volta a ter território indiano no interior – a região conhecida por Dahala Khagrabari.

Estes 111 territórios indianos no Bangladesh e os 51 territórios bangladeshianos na Índia ficaram enclausurados no país “errado”, sobretudo depois do fim do colonialismo britânico na região em 1947, refere o jornal The Hindu, mas também devido aos caprichos de grandes senhores da região, refere o Washington Post. Mas isso agora é passado. Esta sexta-feira, chegou ao fim uma disputa de mais de 70 anos pela definição de fronteiras entre os dois países vizinhos e as mais de 50 mil pessoas “sem cidadania” destes territórios vão poder escolher em que país querem viver.

Nenhum dos cidadãos dos enclaves bangladeshianos na Índia optou por pertencer ao Bangladesh. Já nos enclaves indianos no Bangladesh, 979 das 37 mil pessoas preferiram pedir cidadania indiana, comunicou Akhteruzzman Azad, representante do governo no distrito de Kurigram no Bangladesh, citado pelo The Hindu.

Mapa esquemático do enclave Cooch Behar, na fronteira da Índia com o Bangladesh (Nota: Norte está à esquerda e este no topo da imagem) - Jeroen/Wikimedia Commons

Mapa esquemático do enclave Cooch Behar, na fronteira da Índia com o Bangladesh. A laranja enclave indiano no Bangladesh e a verde enclave banglashiano na Índia (Nota: Norte está à esquerda e este no topo da imagem) – Jeroen/Wikimedia Commons

A partir de agora, os antigos habitantes dos enclaves terão os mesmos direitos que os restantes cidadãos – escolas onde inscrever os filhos, hospitais onde receber cuidados médicos ou, simplesmente, ter acesso à eletricidade. Não se repetirão situações como a de Asma Bibi, habitante de um enclave bangladeshiano na Índia citada pela BBC, que teve de mentir no hospital aquando do nascimento dos filhos mais velhos – teve de dar o nome um casal indiano. “Os meus filhos mais velhos receberam o nome de outras pessoas como pais quando nasceram. Oficialmente não sou o pai deles”, lamenta o marido, Shahjahan Sheikh.

Até uma simples ida ao mercado podia ser um problema, refere o Washington Post. Uma pessoa que vivesse num enclave pertencente a um dos países precisava de um visto para sair do enclave e ir ao país vizinho (onde estava inserido o enclave), mas para conseguir esse visto teria de ir a uma grande cidade do país de origem, coisa que só poderia acontecer se atravessasse ilegalmente o território onde se encontrava o enclave.

Dahala Khagrabari era o único enclave de terceiro grau, mas enclaves de primeiro, e até segundo grau são comuns, segundo o Washington Post. Existe por exemplo Llívia, nos Pirinéus, um território espanhol dentro de França e as 24 porções que compõem o Baarle-Hertog são território belga na Holanda.

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