O Moreirense nunca venceu o Benfica. O melhor que conseguiu, para o campeonato, foi um par de empates, o último dos quais em 2004. Nas últimas visitas a Lisboa e ao Benfica, em três, perdeu as três. Mais, o Moreirense ainda não venceu um só jogo nesta Liga: perdeu contra o Arouca e contra o Estoril. E a Luz encheu-se. O augúrio (e a estatística que fez o augúrio ser bom) era de vitória. E em casa “manda” o Benfica, que não perde na Luz, para o campeonato, há 51 jogos. São mais de três anos sem saber o que é a derrota diante dos seus. Mas a temporada não começou bem. A digressão pelas Américas na pré-temporada não foi feliz, a Supertaça também deu em derrota, o campeonato arrancou com uma goleada, ao Estoril, que veio minorar um começo de jogo tremido, e a derrota contra o Arouca, em Aveiro, trouxe de volta a desconfiança sobre Rui Vitória.

Benfica: Júlio César; Nélson Semedo, Luisão, Lisandro López e Eliseu; Samaris, Pizzi, Nico Gaitán e Victor Andrade; Jonas e Mitroglou.
Moreirense: Stefanovic; Sagna, André Micael, Danielson e Evaldo; João Palhinha, Filipe Gonçalves e Vítor Gomes; Ohemeng, Rafael Martins, Iuri Medeiros.

Ou o Benfica chegava dominador, sacudindo a pressão. Ou a pressão de vencer, dê lá por onde der, apoderar-se-ia dos encarnados. E apoderou-se. A bola como que queimava. Até da canhota de Gaitán, que trata a redondinha como ela gosta de ser tratada, volta e meia saía um passe transviado, uma recepção frouxa. O Moreirense não entrou pressionante, não entrou de peito feito na Luz, a bola até era mais do Benfica, mas Miguel Leal teceu uma teia que foi controlando, pouco a pouco, os fogachos das águias.

Danielson, o central, era o “Luisão” de Moreira de Cónegos, era ele quem controlava a defensiva do Moreirense, quem dava ordens, agora sobe este, agora sobe aquele. No meio-campo, João Palhinha, vindo do Sporting e de Alcochete, era um faz-tudo, e fazia de tudo por travar tudo. À frente dele, Vítor Gomes, o capitão, era quem pressionava a saída de bola do Benfica. Tanto pressionava, tão à frente, que chegou a fazê-lo ao lado do ponta-de-lança Rafael Martins.

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E por falar em Rafael Martins, foi dele a primeira ameaça à baliza de Júlio César. Foi aos seis minutos. Filipe Gonçalves desmarca o brasileiro em velocidade, sobre a direita, mas demasiado sobre a direita, tanto que Rafael, pressionado por Lisandro López, e cada vez mais distante da área, teve de rematar logo dali, e o remate saiu fraco, para uma defesa de Júlio César, à segunda. Mas o aviso estava dado.

O Benfica demorou a responder. E respondeu por Vitor Andrade. Mas para falar desta jogada é preciso falar de Jonas. O “pistolas”, com Lima a seu lado, na época passada, era o “9”. Hoje, com Rui Vitória, ganhou um “meio”: é mais “9,5” que “9”, e joga mais recuado… no meio-campo ofensivo. Mitroglou é o ponta-de-lança, mas, talvez sem ritmo, talvez sem entrosamento com os colegas, dá-se muito à marcação, e foi presa fácil para Danielson e companhia. Mas voltando ao “pistolas”. Aos 15′ vem procurar a bola longe, bem longe da área, e desmarca o garoto Vitor Andrade (que esta noite sentou Ola John e ascendeu ao onze). Vitor vê Jonas a correr em direção à área, hesita se lhe há-de voltar a devolver bola ou se não, mas Jonas está tão afastado do lugar onde ganhou o tal epíteto de “pistolas”, que Vítor não pôde esperar mais, e rematou, de fora da área, em direção à baliza. Saiu perto do poste esquerdo de Stefanovic, mas foi para fora.

Vitor Andrade remata, mas também assiste. Aos 21′, encostado à esquerda, viu Mitroglou na área, pôs lá a bola, o grego saltou com Danielson, não ganhou a disputa — mas atrapalhou o corte –, e a bola sobrou para Gaitán. El Mago estava na área, mas de costa para a baliza. Como não é por acaso que o apelidam assim, e como só havia uma forma de rematar, Gaitán saltou e rematou, acrobático, de bicicleta. Ao lado.

Lembram-se do Rafael Martins? O Rafael foi terceiro melhor marcador da Primeira Liga em 2013/14, ao serviço do Vitória de Setúbal, com 15 golos. Foi para Espanha, para o Levante, mas não foi lá o goleador que por cá se mostrou. Chegou na quarta-feira a Moreira de Cónegos, treinou na quinta, voltou a treinar na sexta-feita e marcou no sábado. 1-0. Vítor Gomes, o tal que pressionava alto, roubou a bola a Pizzi, prossegue com ela, corre, corre mais um pouco, viu Rafael Martins a desmarca-se nas costa de Lisandro López, e foi mesmo para lá que endossou a bola. Samaris vinha nas costa do brasileiro, mas não quis fazer grande penalidade, e deixou-o rematar. E ele rematou. Forte, cruzado, e bateu Júlio César.

Os adeptos não estavam contentes. Uns apoiavam, que o tempo mais do que chegava para dar a volta à coisa, outros, descrentes de Vitória e da vitória, assobiavam. O remate de Jonas, aos 36′, depois de combinar à entrada da área com Pizzi, saiu ao lado do poste direito de Stefanovic. Foi o último remate do Benfica na primeira parte, e isso também não ajudou a afastar o descontentamento.

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Pizzi e Vitor Andrade não voltaram do intervalo. O português fez um jogo de sinal menos. O brasileiro tentou agitar as águas, mas nem sempre bem. Entraram Gonçalo Guedes e Talisca. Mas nada melhorou. O Benfica tinha mais bola, mas nem sempre lhe dava o melhor seguimento. Aos 56′, Mitroglou viu-se com ela na entrada da área, o passe foi de Jonas, rodopiou para a esquerda, para a canhota, que é a sua melhor bota, e rematou cruzado. Stefanovic defendeu.

O Moreirense já mal atacava, mal se via, mas sentia-se confortável a defender, e o Benfica não causava sobressaltos de maior. Causou aos 68′. E que sobressalto. Um sobressalto no Moreirense e na barra. Gaitán cruzou da esquerda para a área, Mitroglou saltou sozinho, teve tempo para escolher onde ia colocar a bola, escolheu o canto superior esquerdo, mas Stefanovic também, ainda lhe tocou, e desviou-a para a barra e da barra seguiu para fora.

Não era a noite do grego. Mas era a noite do outro ponta-de-lança que esta época chegou à Luz. Raúl Jiménez. Entrou aos 73′, marcou aos 75′. Precisou de brevíssimos dois minutos para fazer o que o grego não fez num jogo inteiro. Precisou de somente dois minutos para não falhar o que Mitrouglou falhou pouco tempo antes. O centro voltou a ser de Nico Gaitán desde a esquerda, Jiménez não saltou sozinho, teve que se desmarcar, fugir ao central André Micael, e fez o empate. 1-1. E o Benfica cresceu no jogo.

O resultado virou-se do avesso um minuto depois, aos 76′. Não entrava a bem, entrava à bomba. E a bomba saiu do pé direito de Samaris. Mitroglou recebeu a bola na área, foi pressionado por Danielson, que o empurrou dali para fora, o grego viu-se sem ângulo de remate e acossado nas costas pelo central do Moreirense, cruzou a bola para trás, para fora da área, e Samaris, que vinha longe a encher o pé, rematou para o 2-1. Stefanovic ainda lhe tocou, mas o remate, forte, não deu hipóteses de defesa.

A Luz ebulia. Mas ebuliu por pouco tempo. O Moreirense empatou aos 84′. Cardozo é um apelido que soa a golo na Luz. E voltou a soar. Mas agora foi Ramón, o Cardozo de Moreira de Cónegos, o “tacuarita”, como lhe chamam no Paraguai. Vítor Gomes centrou para a área, uma bola que veio da esquerda do ataque, Emmanuel Boateng, de palmo e meio, saltou entre os grandalhões Luisão e Lisandro, ninguém cortou a bola, esta sobrou na confusão para Cardozo, que empatou. O golo foi mal validado, pois Ramón Cardozo estava em fora de jogo. 2-2.

O Benfica queria vencer. Mas não foi um jogo feliz na Luz. Os passes não saíam. Os remates saíam, mas ao lado. O nervoso era mais do que muito, mais do que miudinho. Nico Gaitán era, com a saída de Eliseu, um defesa-esquerdo de ocasião, e quis a ocasião que fosse daquele lado, daqueles pés, que saísse o cruzamento para o golo da vitória. O argentino centrou de canhota para a área, como o tinha feito com Mitroglou, que falhou, como o fez com Jiménez, que empatou, e como fez, novamente, com Jonas. O “pistolas”, ao abandono na área, sem ninguém que o marcasse, rematou, de primeira e com classe, de pé esquerdo para o 2-1. Fim de jogo. Fim de tremideira. O Benfica venceu, mas não há coração benfiquista que aguente tanto sofrimento. Um sofrimento talvez desnecessário, pois as camisolas esquisitas do Moreirense (sem ser nos golos) mal se viram esta noite.