O Supremo Tribunal de Justiça julga esta quinta-feira a juíza da Relação do Porto Joana Salinas, pelo crime de peculato, por utilizar verbas da Cruz Vermelha Portuguesa (CVP) para pagar a advogadas que, alegadamente, faziam projetos de acórdãos.

A decisão de pronunciar a desembargadora foi tomada em meados de abril último pela 3.ª Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), depois de o Ministério Público (MP) ter acusado Joana Salinas Calado do Carmo Vaz e a advogada Alexandra Valente Novais da prática, em coautoria, de crimes de peculato (utilização indevida de dinheiro) num caso ligado à contratação de duas advogadas, para a elaboração de acórdãos do Tribunal de Relação do Porto.

Segundo os autos a que a agência Lusa teve acesso, Alexandra Valente Novais, também pronunciada por um crime de peculato, concordou estudar os processos da Relação do Porto que estavam distribuídos à juíza, a qual, na qualidade de presidente da delegação de Matosinhos da Cruz Vermelha Portuguesa determinou, a 25 de outubro de 2012, que aquela advogada fosse contratada pela CVP, com uma avença de 1.500 euros mensais, pagamento considerado como contrapartida pelo acordo assumido.

Joana Salinas, juíza auxiliar da Relação do Porto desde 16 de julho de 2007 e juíza desembargadora do mesmo tribunal desde 03 de julho de 2010, já tinha registado dois processos disciplinares (instruídos em maio de 2009 e janeiro de 2010), por atrasos na elaboração de acórdãos e pelo elevado número de processos que tinha pendentes há mais de seis meses ou há mais de um ano.

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Os autos referem que, em data não concretamente apurada, mas anterior a 19 de outubro de 2012, Joana Salinas decidiu solicitar, sucessivamente, aos advogados Alexandra Valente Novais, Luís Miguel Campos e Joana Cardoso Pereira que estudassem os processos que lhe estavam distribuídos ou que lhe viessem a ser distribuídos pela Relação do Porto. Luís Campos não aceitou tal proposta.

Indicam ainda os autos que Joana Salinas, aproveitando-se do cargo que ocupava na CVP, decidiu utilizar dinheiro da instituição de utilidade pública para proceder ao pagamento dos serviços prestados por Alexandra Valente Novais, arguida que recebeu, como contrapartida, a quantia mensal de 1.500 euros, a qual seria paga pela delegação de Matosinhos da CVP.

Quanto aos restantes advogados, Luís Campos não aceitou a proposta e Joana Pereira colocou o assunto à apreciação de outros dois sócios do seu escritório de advogados, tendo resolvido aceitar em nome da sociedade, fixando o valor de 100 euros por cada questão individualizada (+IVA), devendo a quantia pela elaboração dos projetos de acórdão ser cobrada à delegação da CVP de Matosinhos.

Após a acusação deduzida pelo MP junto do STJ, Joana Salinas requereu a abertura de instrução, alegando, entre outros pontos, a ilegitimidade do MP para prosseguir a ação, tendo em conta a inexistência de queixa da CVP, e a utilização de prova proibida, considerando que a acusação assentou na ação da testemunha Rodrigo Moreira, que é advogado de profissão.

A defesa da juíza argumentou que aquele advogado aceitou agir como agente infiltrado/provocador e que violou “grosseiramente” o segredo profissional. Argumentou ainda que a imputação feita à juíza é “uma evidente falsidade” e que todos os acórdãos que a acusação diz terem sido elaborados por advogados estagiários foram confirmados pelo STJ.