O acórdão que declarou inconstitucional a intromissão do Governo na celebração de acordos coletivos de trabalho nas autarquias, por violar a autonomia do poder local, foi publicado esta quinta-feira, abrindo a porta à redução do horário para 35 horas semanais. 

A decisão do Tribunal Constitucional (TC), de 7 de outubro, agora publicada no Diário da República, “declara a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, das normas que conferem aos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da administração pública legitimidade para celebrar e assinar acordos coletivos de empregador público, no âmbito da administração autárquica”.

Os juízes concluíram, por unanimidade, pela inconstitucionalidade das normas das normas da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LTFP), que admitiam a intervenção dos membros do Governo nos acordos da administração local, “por violação do princípio da autonomia local”.

A decisão salientou que as autarquias possuem competências próprias, incluindo “em matéria de pessoal”, e apesar de poderem ser condicionadas “quando um interesse público nacional ou supralocal o justificar”, decorre “da garantia de autonomia local que as autarquias possam assumir o papel de entidade empregadora pública, de forma autónoma face ao Estado”.

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“A partir do momento em que uma determinada matéria se encontra consagrada na lei como uma área em que pode existir contratação coletiva pública, esta deve ser exercida pelas autarquias de forma autónoma, apenas limitada por um controlo de legalidade”, acrescenta o acórdão.

Nesse sentido, os conselheiros do TC consideram a participação governamental uma “limitação da autonomia local quanto ao seu quadro de pessoal próprio, elemento da autonomia que exige o tratamento das autarquias como empregadores públicos autónomos, no âmbito dos poderes e deveres destas entidades, definidos na LTFP”.

O acórdão pronunciou-se sobre um pedido do provedor de Justiça da declaração de inconstitucionalidade de normas da LTFP, na sequência de um pedido do Sindicato dos Trabalhadores da Administração Pública (SINTAP) e da Associação Nacional de Freguesias (Anafre).

Em causa estavam as normas que levaram o conselho consultivo da Procuradoria-Geral da República a defender que o Governo devia participar nos ACEEP, que impôs diversas condicionantes para a redução do horário de trabalho de 40 horas semanais para 35 horas.

O Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local (STAL) tem exigido a publicação imediata dos ACEEP que assinou com centenas de autarquias, com 35 horas semanais, mas sem inclusão de banco de horas e adaptabilidade, como impõe o Governo.

Fonte oficial do Ministério das Finanças disse que o Governo não tem mais nada a acrescentar sobre a decisão do TC e remeteu para uma nota da Direção-Geral da Administração e do Emprego Público (DGAEP).

“Ante a impossibilidade prática de depositar os acordos coletivos de empregador público recusados que, por força das disposições legais aplicáveis, foram devolvidos, há que aguardar novo impulso das partes com a remessa dos originais dos ACEEP”, explica a DGAEP, acrescentando que os acordos serão publicados após “os requisitos formais”.

Em relação aos ACEEP celebrados com intervenção do secretário de Estado da Administração Pública “já depositados e publicados ou a depositar, aproveita-se o já praticado, tendo-se por não escrita a assinatura” de José Leite Martins, esclarece a nota da tutela, de 14 de outubro.

Para a DGAEP, os ACEEP “mostram-se celebrados por quem, segundo o aresto ora proferido pelo Tribunal Constitucional, é a legitima parte empregadora, ou seja, a autarquia local” e, com base nos princípios da boa-fé e da proteção da confiança, “as partes têm assegurada a vigência” dos acordos.

Depois de conhecida a decisão do TC, pelo menos a Câmara Municipal do Porto, a da Póvoa, a de Gaia e as 16 câmaras do Algarve já anunciaram que vão reduzir o horário para as 35 horas semanais.