Artigo atualizado às 23:50 com declarações do investigador José Xavier.

A variação da temperatura do oceano obriga os pinguins a viajar mais para encontrar comida e isso tem impacto na população. A investigação que relaciona fenómenos climáticos que introduzem anomalias globais, como o El Niño, com a dificuldade de os animais no topo da cadeia alimentar (os predadores) encontrarem alimento no oceano foi publicada esta terça-feira na revista científica Nature Communications.

Os casais de pinguins revezam-se no cuidado com a prole: enquanto um progenitor vai pescar, o outro fica no choco ou a cuidar da cria. Agora, o que a equipa de Charles Bost, investigador no Centro de Estudos Biológicos de Chizé (França), descobriu é que, quando havia fenómenos climáticos que provocavam alterações, por exemplo na temperatura da água, os pinguins eram obrigados a viajar mais quilómetros para se alimentarem e isto pode comprometer o sucesso reprodutor.

Os investigadores estudaram a colónia de pinguins-rei (Aptenodytes patagonicus) que nidificam nas ilhas Crozet – no sul do oceano Índico, entre a África do Sul e a Austrália – entre os anos 1992 e 2010. E no mesmo período registaram as principais anomalias no clima climáticas no sul do oceano Índico e Atlântico. Ao Observador, José Xavier, que também faz investigação na Antártida, elogia o trabalho que uma base de dados de longa duração, uma situação rara na investigação marinha.

Quando a temperatura do oceano aumentava um grau Celsius, a frente polar antártica – o limite entre as águas frias com influência da Antártida e as águas menos frias dos restantes oceanos – aproxima-se 130 quilómetros da Antártida. Isso faz com que os pinguins também tenham de aumentar essa distância para pescar. Com temperaturas do oceano mais altas, os pinguins também são obrigados a mergulhar mais fundo até à procura de peixe.

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Em 1997, ano em que se iniciou um dos fenómenos El Niño mais fortes de sempre, os investigadores verificaram que os pinguins tiveram de se deslocar o dobro em relação a anos normais – entre 437 e 755 quilómetros para pinguins com crias. Neste período também tiveram de mergulhar cerca de 30 metros mais fundo que os habituais 170 metros. Neste período, a população reprodutora caiu 34%, o sucesso reprodutivo foi o mais baixo de todo o período estudado e a probabilidade de sobrevivência dos adultos também diminuiu.

“Estes resultados contribuem significativamente para a nossa compreensão de como as mudanças no clima afetam o comportamento (e as populações) de predadores de topo, neste caso os pinguins-rei”, reforçou José Xavier, investigador na Universidade de Coimbra e no British Antartic Survey (Cambridge, Reino Unido).

Os investigadores concluem assim que o aumento do esforço de procura de comida tem consequências negativas nos parâmetros demográficos da espécie e no tamanho da população. Este padrão também já tinha sido verificado em predadores marinhos no hemisfério norte. Estes estudos mostram-se assim essenciais para avaliar que impacto poderão ter as alterações climáticas na sobrevivência das populações e ecossistemas.

Numa investigação publicada na revista Marine Biology em 2013, a equipa de José Xavier demonstrou que os albatrozes também sofrem os impactos das alterações climáticas no que diz respeito à procura de alimento. “Em anos ‘maus’ em termos climáticos [fora do normal], os albatrozes demoram cinco vezes mais tempo na procura de alimento do que em anos ‘bons'”, conta José Xavier ao Observador. “Isto também tem consequências a nível populacional porque nos anos ‘maus’ o sucesso reprodutor é muito baixo.” Os investigadores verificaram ainda que os albatrozes, quando não conseguem encontrar o alimento preferido (lulas) vão gradualmente alterando a dieta para outro tipo de alimentos.

O mergulho dos pinguins – Thibaut Powolny