Seis obras da pintora Vieira da Silva, cedidas até final de 2015 pelos herdeiros do colecionador Jorge de Brito, estão em risco de sair do museu da pintora, em Lisboa, e vendidas, se não houver acordo com o Estado.

Contactado pela agência Lusa, João de Brito, um dos herdeiros do colecionador, recordou que o acordo de cedência das seis obras à Fundação Arpad Szenes – Vieira da Silva (FASVS), válido por cinco anos, termina no final de dezembro de 2015.

O protocolo de cedência foi assinado em 2011, com o direito de compra por parte do Estado “por valores que ficaram definidos na altura”, recordou o proprietário, que não precisou valores, mas poderão oscilar entre 400 mil e um milhão de euros, cada uma.

João de Brito indicou que, em julho deste ano, teve uma reunião com responsáveis da Secretaria de Estado da Cultura, na altura liderada por Jorge Barreto Xavier, a quem propôs, em alternativa à compra direta, um modelo diferente de aquisição.

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“Fizemos uma outra proposta porque temos consciência de que os quatros são importantes para a FASVS. Essa solução foi aceite, na altura, mas parece que não houve capacidade para implementá-la”, indicou.

Questionado sobre os valores das obras, João de Brito escusou-se a precisar números, mas disse que foi feita uma média com base na avaliação de um valor mínimo e máximo de cada uma das seis pinturas de Vieira da Silva.

“É um valor irrisório comparado com o que foi gasto na construção, por exemplo, do novo Museu Nacional dos Coches, em Belém, portanto é tudo uma questão de prioridades relativamente a este património”, sustentou.

O proprietário indicou à Lusa que há uma primeira reunião agendada para breve com o atual Ministério da Cultura, para falar sobre este acordo: “Se o Estado manifestar vontade de comprar ou aceitar o modelo alternativo, e tudo ficar definido até ao final do ano, desde que não ultrapasse muito esse prazo, podemos avaliar. Queremos saber é se há interesse e vontade”, comentou.

Questionado sobre qual será o destino dos seis quadros de Vieira da Silva, no caso de não houver acordo com o Estado português ou a Fundação, João de Brito disse que as obras serão vendidas.

Contactada pela agência Lusa, Marina Bairrão Ruivo, diretora do Museu Vieira da Silva, tutelado pela FASVS, onde se encontram depositadas as obras, confirmou que “estão em curso diversas diligências para encontrar uma solução”.

“Seria muito importante garantir a continuidade das obras no museu”, sublinhou, sobre a entidade que detém um acervo da pintora, e que se dedica, desde 1995, à divulgação da obra de Vieira da Silva (1908-1992) e do marido, também artista, Arpad Szénes (1897-1985).

Os herdeiros de Jorge de Brito (1927-2006) viram concluído, em julho de 2011, um polémico processo de encerramento da classificação de um conjunto de obras da pintora que se arrastou durante cinco anos, e que envolveu negociações com o Ministério da Cultura e a FASVS.

A Fundação Vieira da Silva foi criada em 1994 e, na altura, o colecionador Jorge de Brito – que reuniu uma das mais importantes coleções nacionais de arte da segunda metade do século XX – depositou ali 22 obras da pintora, a título de empréstimo.

A família contestou sempre o processo de classificação das obras pelo Estado, e acabou por retirar progressivamente todas as telas, até meados de 2011.

O arquivamento do processo de classificação, em julho de 2011, durante a tutela de Francisco José Viegas, como secretário de Estado da Cultura, levou a família Brito a decidir estabelecer outro acordo de cinco anos, para depositar novamente alguns quadros de Vieira da Silva na FASVS, com possibilidade de compra pela fundação ou pelo Estado.

Os herdeiros de Jorge de Brito realizaram em Paris, nesse ano, um leilão de obras do colecionador original, seu pai, tendo sido vendido um quadro de Vieira da Silva por 1,5 milhões de euros.

A Lusa contactou o Ministério da Cultura e a Direção-Geral do Património Cultural sobre esta matéria, mas, até ao momento, não obteve uma resposta.

Nascido em Lisboa, em 1927, Jorge de Brito trabalhou no setor financeiro e adquiriu vários bancos que vieram dar origem ao antigo Banco Internacional Português, e também várias empresas nas áreas do turismo, agricultura e comércio.

Após a Revolução de 25 de Abril de 1974, foi viver para Paris, regressando a Portugal no início dos anos de 1980, restabelecendo as suas atividades. Foi vendendo algumas das peças de arte, nomeadamente à Fundação Calouste Gulbenkian, mas manteve uma coleção privada.

A paixão pela arte e pela história resultou numa coleção com cerca de 3.000 obras, na sua maioria na área da pintura, especialmente do período barroco, e também do século XX.