A nova ferramenta de combate do Estado Islâmico (EI) são as mensagens encriptadas. Agora, os terroristas utilizam o Telegram, uma aplicação que codifica mensagens e destrói fotografias, conversas e documentos, depois de serem vistos.

Com a ameaça cada vez mais iminente, e depois dos atentados de Paris que comprovaram que a nova estratégia terrorista é difícil de controlar, o debate sobre segurança e privacidade ganhou novos contornos. E, na semana passada, na Cimeira de Segurança Cibernética do CNI (Centro Nacional de Inteligência) realizada em Madrid, juntaram-se espiões, polícias, guardas-civis, militares, executivos das empresas de segurança, especialistas e hackers para discutir o tema.

Numa das salas, acontecia uma palestra sobre os ataques a Espanha, há um ano, o décimo país a ser alvo de atentados. Em 2015, logo depois de Israel e da Arábia Saudita, Espanha já estava em terceiro lugar como país mais afetado. “Os ataques aumentaram mais de 200%”, disse o diretor do CNI. O que mudou de um ano para o outro? A resposta é apenas uma: o terrorismo jihadista.

O mapa projetado na parede central da sala mostrava o que se passa na Europa, África e Médio Oriente. Há um ano, Espanha estava onde devia estar devido ao seu potencial económico, logo atrás da Alemanha, França, Reino Unido, entre outros, explica o El Pais. Agora, tudo mudou. O país é alvo de ataques porque os terroristas querem obter informações e não para destruir as infra-estruturas espanholas. E todos estes conteúdos estão online. Mesmo os que se referem ao Estado Islâmico (EI) – que faz da internet uma das suas principais ferramentas estratégicas.

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Os terroristas que organizaram os atentados de Paris conseguiram esconder as suas informações dos sistemas de segurança mundiais. O tema já foi estudado e existem vários documentos sobre o uso que os jihadistas fazem das redes sociais: O EI dispõe de uma indústria de propaganda moderna e de sucesso. Tem uma rede de empresas, produtoras e técnicos qualificados, capazes de fugir aos serviços de informações, ao mesmo tempo que estão treinados para atacar com armas e bombas.

As informações mais recentes dão conta de que os terroristas recorrem, atualmente, a comunicações encriptadas. Os vídeos que o EI partilha podem chegar a cerca de 100 milhões de internautas. Os mais vistos foram divulgados no YouTube, no Twitter e no Facebook. E por mais que se bloqueiem as contas nas redes sociais, os terroristas criam sempre outras novas. Diariamente, são distribuídos entre 10 a 20 vídeos, dizem os especialistas, especialmente através do Telegram, a aplicação de mensagens codificadas.

As ferramentas do FBI estão desatualizadas

“As ferramentas que utilizamos são cada vez mais ineficazes”, disse James Comey, diretor do FBI numa das suas intervenções. Comey chegou a pedir que as empresas que utilizam mensagens encriptadas, como o Watsapp, lhes dessem uma chave de acesso para conseguirem aceder às mensagens antes de serem encriptadas.

Mas a aplicação Telegram é que está agora sob o foco das agências de inteligência. Os utilizadores do Telegram podem ter grupos com mais de 200 amigos ou contar com chats escondidos onde as mensagens, as fotografias e os vídeos se autodestroem depois de vistos. Aliás, a empresa confia tanto no seu sistema de encriptação que já ofereceu cerca de 270 mil euros a quem conseguir quebrar o tal sistema de codificação.

O Telegram foi criado pelos irmãos Nikolai e Pável Durov, e a empresa tem sede em Berlim. Russos, os irmãos ficaram conhecidos por criar a Vkontakt, que chegou a ser a mais importante rede social utilizada na Rússia. Pável Durov é, até, conhecido como Mark Zuckerberg russo.

Desde que o EI abandonou a presença oficial no Twitter, em julho de 2014, começou a utilizar o Vkontakt. E agora, utiliza o Telegram. Quando questionado pelas autoridades, Durov respondeu: “A privacidade e o direito à privacidade são mais importantes do que o medo do mal que nos pode acontecer, como o terrorismo”.

Há cada vez mais utilizadores e empresas que recorrem a técnicas de encriptação para se protegerem contra as ameaças que circulam na Internet, entre as quais as redes criminosas. As empresas de tecnologia criam aplicações mais seguras, até para serem utilizadas pelas próprias.

Depois das revelações do Wikileaks (e de Edward Snowden, ex-funcionário da NSA) chamarem a atenção de que tudo o que é feito online poder ser conhecido, o cuidado das empresas de tecnologia com a privacidade é ainda maior, de forma a protegerem os utilizadores.

Há, ainda, a rede TOR, conhecida como dark web, criada por defensores do software livre para proteger a identidade dos utilizadores. A dark web é permitida pelos governos democráticos como uma forma de possibilitar o acesso à internet em países onde os governos censuram os conteúdos, como a China, por exemplo. Só que, por outro lado, há sempre o contra e a TOR também é utilizada para traficar armas, droga, combinar homicídios e exigir resgates.

Com os atentados de Paris, as autoridades perceberam que os terroristas conseguem esconder as comunicações, atravessar fronteiras, adquirir armas e coordenar ações sem deixar muitas pistas. Hoje, não há dúvida: Para combater, o EI empunha armas de fogo numa mão e recorre às redes sociais com a outra.