“Estamos em cima do precipício”, avisou António Guterres na sua primeira intervenção pública depois de ter deixado no final de 2015 a liderança da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR). Para o antigo primeiro-ministro, a Europa não é “suficientemente solidária” e que os únicos que estão a saber gerir a crise de refugiados “são os traficantes e contrabandistas”.

Falando aos embaixadores portugueses em todo o mundo que estão entre esta terça e quarta-feira reunidos no Seminário Diplomático, em Lisboa, António Guterres não deu uma perspetiva otimista sobre os próximos desafios das relações internacionais, afirmando que a atual relação de forças no sistema internacional é “caótica”. “Já não vivemos num mundo polar, mas também não vivemos num sistema multipolar organizado”, defendeu Guterres que deixou o cargo no ACNUR no dia 31 de dezembro, estando agora de regresso a Portugal.

Sobre os refugiados, o socialista foi taxativo ao dizer que os movimentos migratórios acontecem há muito, mas que “os ricos só se dão conta da existência dos pobres quando estes lhes entram pela casa dentro”. Os refugiados foram um dos pontos mais desenvolvidos por Guterres, lembrando que quando iniciou funções como Alto Comissário para os Refugiados havia 36 milhões de pessoas que poderiam ser consideradas refugiados e agora há 60 milhões e que, só nos primeiros seis meses de 2015, os pedidos de asilo na Europa aumentaram 80% face ao ano anterior.

António Guterres afirmou que se a Europa não compreender a necessidade acolhimento organizado dos refugiados, há um “risco sério do colapso dos sistemas europeus de asilo” já durante 2016. Criticou ainda a posição de países como a Suécia ou a Dinamarca que estão a fechar fronteiras e tentar dar menos condições aos refugiados que já acolheram no seu território.

A forma de resolver esta crise? Para Guterres seria essencial resolver os conflitos que originam estas mobilizações de milhares de pessoas – mas “a capacidade internacional de resolver conflitos parece ter estado a dormir consideravelmente”. O antigo primeiro-ministro defende que está na altura de os Estados que têm relações privilegiados com os atores diretos em conflitos como o que acontece na Síria perceberem que “têm interesse vital em que eles terminem”. Guterres afirmou ainda a necessidade de reforçar o apoio às organizações humanitárias – “é preciso duplicar o que é gasto em ação humanitária”.

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