“Joy”

Joy Mangano é uma inventora e empresária ítalo-americana da classe média baixa de Long Island, que em 1990 concebeu uma esfregona que vendeu milhões e foi o ponto de partida para a construção de um império multimilionário de produtos para o lar, através das televendas. David O. Russell (“Três Reis” “Último Round”, “Golpada Americana”) baseou-se no essencial da história de Mangano, combinando-a com as de outras mulheres como ela, e com personagens e elementos ficcionais, para filmar este conto de fadas realista dobrado de história de sucesso antes-quebrar-que-torcer à americana e de tragicomédia familiar, onde Joy é, ao mesmo tempo, Gata Borralheira sofredora, inventora inspirada e empresária saco de pancada. Russell faz o filme flutuar constantemente entre a realidade dura e a fantasia onírica, enche-o de personagens que ou querem desencorajar e prejudicar Joy, ou animá-la e ajudá-la (interpretadas por Robert De Niro, Isabella Rossellini, Diane Ladd, Virginia Madsen ou Bradley Cooper) e dá a Jennifer Lawrence um papel que lhe permite brilhar com toda a intensidade da verdadeira estrela que é, sendo também uma enorme e polivalente actriz. “Joy” é o tipo de filme que irá irritar e conquistar muita gente. Eu conto-me neste último grupo.

“Foxfire – Raposas de Fogo”

O francês Laurent Cantet, realizador de “A Turma”, foi ao Canadá (que passa aqui pelos EUA) rodar, com actrizes locais, esta adaptação do livro de Joyce Carol Oates “Foxfire: Confessions of a Girl Gang”, sobre um grupo de adolescentes de famílias modestas, que nos anos 50 formam um gang, baptizado Foxfire, após terem espancado um professor dado ao assédio sexual (o livro já foi filmado em 1996 por Annette Haywood Carter, com Angelina Jolie no papel principal). Escudando-se no cliché da “rebeldia-juvenil-contra-a-sociedade-injusta”, Cantet justifica e desculpabiliza toda a sorte de comportamentos delinquentes cometidos pelas raparigas, que vão da chantagem e extorsão ao roubo e ao rapto. Os homens são todos uns patifes ou uns perversos sexuais e merecem tudo o que elas lhes fazem, e as figuras de autoridade ou poder são ridículas, brutais ou hipócritas. É impossível ter qualquer simpatia, compreensão ou compaixão pelas adolescentes e pelo seu arremedo de utopia pré-feminista fora-da-lei, a realização é insípida, incolor e inodora, e, com quase duas horas e meia de duração, o filme acaba por se repetir e arrastar. Indefensável e intragável.

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“99 Casas”

Uma dramatização dos efeitos da explosão da bolha do imobiliário nos EUA, em 2008, centrada nas suas vítimas anónimas. “99 Casas”, de Ramin Bahrani, passa-se na Florida e tem um portentoso Michael Shannon no papel de Rick Carver, um reptilíneo aproveitador da desgraça alheia, que representa os bancos nas acções de despejo (feitas com o apoio da polícia e a mata-cavalos), e depois fica com as casas para as comercializar com lucro. Dennis Nash (Andrew Garfield), um operário da construção civil desempregado, e despejado por Carver de sua casa com a mãe e o fillho adolescente, acaba por ir trabalhar para o agente imobiliário, ficando a conhecer por dentro o negócio dos despejos, a sua frieza desumana e as suas falcatruas. Conseguirá ele ouvir a sua consciência e resistir à tentação de se transformar num sucedâneo do seu patrão? “99 Casas” foi escolhido como filme da semana pelo Observador, e pode ler a crítica aqui.