O ministro das Finanças da Grécia, Euclid Tsakalotos, considerou, em entrevista à Lusa, que o Governo português caminha numa “direção positiva”, com benefícios para um espaço europeu que deve prevenir a ascensão das forças nacionalistas de direita.

“Encaro o atual Governo português de uma forma muito positiva. Considero que caminha numa direção positiva, porque penso que será bom para o povo português e também porque será bom para os povos da Europa”, referiu.

“E porque tenho o imenso receio que caso não seja a esquerda e o centro-esquerda a proporem políticas económicas e sociais aceites pelos povos europeus, que sejam dirigidas aos seus problemas como salários, pensões, Estado social, existe uma ala direita em ascensão, como se assiste na França, Holanda, Áustria, que é muito perigosa”, acrescentou o ministro e dirigente do Syriza, que em 06 de julho de 2015 substituiu Ianis Varoufakis na pasta das Finanças.

O responsável do Governo grego iniciou na sexta-feira em Roma uma deslocação a diversas capitais europeias, para abordar com os seus homólogos a atual situação do terceiro programa de resgate de cinco anos à Grécia, anunciado em julho do ao passado e avaliado em 86 mil milhões de euros, e ainda a questão da dívida grega. Após a sua curta vista a Lisboa no sábado, onde se reuniu com o ministro das Finanças, Mário Centeno, viaja ainda para Paris, Helsínquia, Amesterdão e Berlim.

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O roteiro apresentado por Atenas nas negociações com Bruxelas, e ainda temas como a união bancária, desemprego e investimento, dominaram as conversações, onde foram sublinhados “alguns problemas comuns porque a Grécia e Portugal partilham muitas similaridades”.

Os representantes dos credores — Banco Central Europeu, Comissão Europeia, Mecanismo Europeu de Estabilidade e Fundo Monetário Internacional (FMI) — regressam a Atenas a partir de 18 de janeiro para uma avaliação dos primeiros seis meses.

E este é um dos temas centrais dos encontros bilaterais, a par da questão da reestruturação da dívida grega, uma provável “contrapartida” para Atenas após a renúncia do Executivo ao fim imediato das políticas de austeridade.

Tsakalotos, responsável por uma pasta decisiva no primeiro governo da esquerda radical na Europa desde a II Guerra Mundial, que governa em coligação com os Gregos Independentes (Anel, direita soberanista), já dirigia desde abril de 2015 as negociações políticas com os credores.

Mas apesar do falhanço do Governo grego em terminar com as políticas de austeridade, garante que o seu país iniciou um novo percurso.

“É muito importante que a gente progressista avance com ideias progressistas, políticas práticas sobre como lidar com o sistema de saúde, de educação, como reformar o sistema de pensões, como distribuir os rendimentos, como assegurar que os bancos beneficiam a economia real em vez da especulação”, refere este economista de 56 anos, formado em Oxford e eleito a primeira vez deputado pelo Syriza em 2012.

“Tudo isso poderá indicar aos povos europeus que existe um caminho diferente e travar a emergência de uma nova direita nacionalista, que é muito preocupante”, insiste.

Assim, o terceiro resgate negociado com os credores, e que evitou o ‘Grexit’, a saída da Grécia da zona euro, deverá ser incorporado numa “estratégia progressista”, que permita sublinhar o seu lado positivo. Para além da provável transformação do paradigma político europeu, que terá começado no sul, apesar de “existir muita gente no norte que também está a escutar”, como assegura.

Neste aspeto, Tsakalotos admite que existe uma diferença importante entre estar na oposição, ou no poder.

“Sinto isso e também sinto existir o perigo que as pessoas progressistas no terreno e os movimentos sociais pensem agora que, por existir um governo progressista, já não é necessário fazer nada”, adverte.

“É assim que encaro a política, e isso aconteceu na Grécia, muitos consideram que por existir um governo de esquerda não é necessário fazer nada, é apenas ao nível político”.

E precisa: “A esquerda não pode funcionar assim, tem de trabalhar em conjunto com os movimentos sociais, que não eram apenas movimentos de protesto, porque estão sempre a sugerir formas diferentes de fazer as coisas, ou de olhar para as coisas”.

Neste processo de transformação política, o ministro das Finanças grego considera crucial para o Syriza “reacender” a relação entre o poder executivo e os movimentos sociais.

“Na Grécia existem fortes movimentos sociais ligados à economia social, à economia solidária, estamos muito interessados em dar-lhes mais espaço, é parte integrante do processo de desenvolvimento. Há muitas pessoas a fazer coisas e a transformarem-se a si próprias e à sociedade. E isso é muito importante, é vital”, disse.

Assim, a “relação com a sociedade” é encarada como um fator decisivo para o sucesso deste desafio político que a população da Grécia decidiu legitimar nas urnas.

“A direita não necessita, mas a esquerda não pode existir sem essa relação com a sociedade, o processo não está a decorrer como gostaria mas é necessário dar espaço a estas iniciativas. Na política social as pessoas que necessitam de ajuda devem ter uma voz sobre o género de ajuda que querem”, argumenta.

E conclui: “Os tecnocratas, as forças centristas, apenas dizem que os pobres precisam disto, os doentes daquilo, mas é necessário dialogar com as pessoas, saber os seus problemas porque têm informação que nós não temos, é muito importante a inter-relação entre os movimentos sociais e os governos de esquerda. Repito, os governos de direita não necessitam disso, nós necessitamos”.