Os governos devem ter acesso à informação encriptada que se encontra na internet? 195 signatários de uma carta aberta publicada no site Secure the Internet defendem que não e criticam os governos pela tentativa de enfraquecimento dos canais de comunicação encriptados que existem na rede, revela o jornal The Guardian.

“Os utilizadores devem ter a possibilidade de usar – e as empresas a possibilidade de providenciar – a maior encriptação disponível, incluindo a encriptação end-to-end [um sistema de comunicação onde só os utilizadores que comunicam entre si têm acesso às mensagens trocadas], sem recear que os governos exijam acesso ao conteúdo, à metainformação ou a chaves de encriptação” afirmam os signatários da carta, que se dividem entre especialistas em tecnologia, empresas e organizações de direitos civis.

A crítica dos signatários (oriundos de mais de 42 países) é feita três dias depois da administração de Barack Obama se ter reunido com responsáveis de empresas como a Apple, Facebook e Twitter, com o intuito de averiguar se será possível criar portas de acesso à comunicação escondida pelos utilizadores – isto é, à comunicação que é propositadamente codificada para que seja inacessível aos outros.

A ideia da administração norte-americana (tal como a de muitos outros países, que estão de acordo quanto à necessidade de aceder ao conteúdo escondido da rede) é utilizar essas infiltrações nos sistemas de tecnologia para evitar futuros atentados terroristas, que sejam planeados e discutidos de forma encriptada, em meios digitais.

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Os signatários, nos quais se encontram por exemplo o ex-agente da CIA John Kiriakou e a Human Rights Watch (uma organização de defesa dos direitos humanos), criticam as medidas. E os especialistas em tecnologia, relata o jornal britânico, afirmam que não será possível distinguir entre o agente do FBI que procura informação escondida e o hacker que acede a essas portas de acesso para roubar informação pessoal (e privada) – o que pode aumentar o número de ataques cibernéticos. O CEO da Apple Inc., Tim Cook, confirma isso mesmo, em declarações reproduzidas pelo The Guardian: “Qualquer porta de acesso é uma porta de acesso para todos”, explica.

Alguns ativistas sugerem mesmo que o objetivo das medidas que atacam a informação escondida dos utilizadores não se deve apenas à tentativa de combater o terrorismo, mas à vontade de vários governos (em particular o norte-americano) em controlar e espiar as comunicações dos utilizadores em geral. Até porque os Estados Unidos têm como parceiro neste esforço países repressivos das liberdades individuais como a China. Se a medida avançar, os fins com que no futuro os agentes (para não falar em eventuais hackers) irão aceder à informação privada dos utilizadores serão sempre incertos. O que deixa muitos de pé atrás.

“A encriptação e o anonimato, e os conceitos de segurança em que eles se baseiam, providenciam a privacidade e segurança necessária para exercer o direito à liberdade de opinião e de expressão na era digital” afirmou o responsável pela defesa da liberdade de expressão das Nações Unidas, David Kaye, num comunicado que acompanhava a publicação da carta.

Do lado dos que apoiam o fim da informação escondida em meios digitais está o diretor do FBI, James Comey, que afirmou que o facto dos militantes do Estado Islâmico utilizarem comunicação encriptada para falarem entre si (e para recrutarem outros elementos para a jihad) justifica que se debata o fim da existência de dados e informações encriptadas nesses meios.