Portugal arrisca-se a não sair do Procedimento dos Défices Excessivos (PDE) em 2015, por causa do resgate ao Banif, aprovado em dezembro do ano passado, apesar de se tratar de uma medida considerada extraordinária.

Tal como previsto no Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC), Bruxelas coloca um país sob Procedimento dos Défices Excessivos se tiver um défice orçamental acima de 3% e se a dívida pública superar os 60% do Produto Interno Bruto (PIB).

Portugal está debaixo deste procedimento desde 2009 mas é abrangido por uma norma transitória que dispensa do cumprimento do critério da dívida os países que em novembro de 2011 já estavam em Procedimento dos Défices Excessivos, o que quer dizer que só terá de cumprir o requisito do défice.

O governo anterior, de Passos Coelho, garantia que teria um défice abaixo dos 3% este ano, o que permitiria ao país sair do PDE. No entanto, em dezembro do ano passado, o Banif foi vendido ao Santander Totta por 150 milhões de euros, no âmbito de uma medida de resolução, que foi acompanhada por um apoio público de 2.255 milhões de euros, sendo que 1.766 milhões de euros saem diretamente do Estado e 489 milhões do Fundo de Resolução bancário, que consolida nas contas públicas.

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O IGCP – Agência de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública divulgou já este mês, numa apresentação aos investidores, que o défice orçamental de 2015 será de 4,2% do PIB, mas que seria de 3% se se excluir o resgate ao Banif.

Portanto, a questão agora é saber se a medida de resolução aplicada ao banco, que teve impacto no défice de 2015, impede ou não o encerramento do Procedimento dos Défices Excessivos nesse ano, tal como acordado com Bruxelas.

O código de conduta da União Europeia sobre a implementação do PEC, de setembro de 2012, esclarece que, se um Estado-membro que esteja sob Procedimento dos Défices Excessivos tiver realizado “ações efetivas” para reduzir o défice mas tiverem ocorrido “eventos económicos inesperados e adversos e com grandes consequências desfavoráveis para as finanças públicas”, Bruxelas pode, “por regra, prolongar o prazo para a correção do défice excessivo por um ano”.

Entre os acontecimentos inesperados que podem penalizar as contas públicas estão, segundo um regulamento de 1997, “operações de estabilização financeira durante perturbações financeiras graves”.

Já em 2013, o então vice-presidente da Comissão Europeia Olli Rehn reiterou, numa carta enviada aos ministros das Finanças da União Europeia, que os Estados-membros não devem ser penalizados no âmbito do PEC quando são forçados a tomar medidas de auxílios estatais necessárias para salvaguardar a estabilidade financeira.

“Ao abrigo do PEC, as injeções de capital são, regra geral, consideradas como medidas ‘one-off’ ou temporárias e como fatores relevantes para a estabilidade financeira, o que quer dizer que não contam contra um Estado-membro no contexto de um PDE”, escreveu Olli Rehn.

O então vice-presidente da Comissão deu mesmo exemplos e, no caso dos países que já estão sob PDE, esclarece que “uma injeção de capital não deverá conduzir a um reforço do procedimento, uma vez que as medidas ‘one-off’ ou temporárias são excluídas do esforço orçamental recomendado para corrigir o défice excessivo dentro do prazo” definido para tal.

Já para o encerramento do PDE, Olli Rehn indicou na altura que “o défice tem de estar abaixo dos 3% do PIB de uma forma sustentada” e acrescentou que, “embora uma injeção de capital possa gerar um atraso no encerramento do procedimento, não deve resultar num reforço do PDE (…) desde que o esforço orçamental recomendado (medido pela mudança no saldo estrutural) tenha sido cumprido”.

No Orçamento do Estado para 2015, o então Governo de Passos Coelho tinha-se comprometido com um ajustamento estrutural de 0,1 pontos, atingindo um défice estrutural (que exclui o efeito do ciclo económico) de 1,2% no final do ano passado.

Em novembro, a Comissão Europeia tinha previsões mais pessimistas para o ajustamento de Portugal, antecipando mesmo um agravamento até 2017: Bruxelas projetava que o défice estrutural ficasse nos 1,8% em 2015, nos 2,3% em 2016 e nos 2,4% no ano seguinte.

Também a Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO), na sua análise ao Orçamento Retificativo de 2015, aprovado para acomodar o resgate ao Banif, recordou que os países com défice acima de 3% (como Portugal) têm “a possibilidade de excluir o apoio ao setor financeiro do cálculo dos esforços de ajustamento estrutural anual para efeitos de cumprimento da regra orçamental de convergência para o objetivo de médio prazo”.

De todo o modo, para que Bruxelas feche o PDE de Portugal, é preciso que a correção do défice seja considerada duradoura, o que implica que o défice de 2015 (comunicado no final de março) não ultrapasse os 3% do PIB e que as previsões da Comissão Europeia (conhecidas em maio) para os anos de 2016 e 2017 indiquem que o défice não exceda aquele limite.

A saída do PDE é necessária para que o país possa recorrer às regras de flexibilidade aprovadas em janeiro de 2015 pela Comissão Europeia e que permitem que os Estados-membros tomem medidas que aumentem a despesa no curto prazo, tanto a nível do investimento como das reformas estruturais, desde que essas medidas tenham ganhos no médio prazo.