Era uma tarde de fevereiro no longínquo ano de 1990. O Benfica recebia o Vitória de Guimarães no velhinho Estádio da Luz. Eriksson contra Paulo Autuori, aquele que um dia seria treinador dos encarnados. A equipa da casa gozava de betão armado na defesa, com Ricardo Gomes e Aldair. No meio havia a inteligência e genica de Valdo, Vítor Paneira e Pacheco. Lá para a frente faziam mossa César Brito e Magnusson. O último foi precisamente quem marcou primeiro, logo aos 12′. Depois foi Pacheco a fechar o marcador, 2-0. O Benfica também seguia na altura na segunda posição e esbanjava nos golos marcados (50 golos).

Pois é, senhoras e senhores. Esta lengalenga toda para dar conta de um recorde de Rui Vitória e companhia: O Benfica não marcava tantos golos à 19.ª jornada desde esses tempos, da distante época 1989/1990. O recorde foi promovido pela tripla Pizzi, Mitroglou e Jonas, os autores dos golos que deliciaram os 51.511 adeptos na Luz. As águias assinaram a oitava vitória consecutiva, em todas as provas, e confirmaram o bom momento de forma da equipa. Um pormenor: esta vitória traduziu-se na liderança do campeonato… pelo menos por duas horas, enquanto o Sporting não joga na Mata Real, contra o Paços Ferreira.

Este Benfica é outro. Não há volta a dar: ou Rui Vitória convenceu os jogadores ou eles sentem-se soltos e confiantes como nunca. Há dinâmica, há movimentações mil, há toque de bola, há trocadilhos na tática, no papel, na cabeça dos jogadores. Há alegria. É isso, há alegria. Sim, ainda há aqui e ali alguma fragilidade na hora de voltar para trás, assim como um desligar dos motores quando menos se espera.

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Samaris voltou ao meio-campo para o lugar de Fejsa. Pizzi e Carcela continuam agarradinhos ao relvado. Mitroglou foi titular (finalmente?), por Jiménez. Gaitán ficou no banco e entraria aos 66′. Do lado do Arouca, havia três jogadores que poderiam ser chaves: David Simão, Artur e Ivo Rodrigues. O último é um jovem de 20 anos, emprestado pelo FC Porto, com um talento digno de registo. Os três acabariam por fazer um jogo discreto…

Benfica: Júlio César, André Almeida, Jardel, Lisandro López, Eliseu, Renato Sanches, Samaris, Pizzi, Carcela, Jonas, Mitroglu

Arouca: Bracalli, Jailson, Hugo Basto, Velazquez, Lucas Lima, Nuno Valente, Nuno Coelho, David Simão, Artur, Roberto, Ivo Rodrigues

O primeiro golo surgiu logo aos 3′, por Pizzi. A defesa dos visitantes amoleceu, Jonas aproveitou para se impor entre os dois centrais e, na área, tocou para o lado. Pizzi surgiu rapidíssimo e chutou picado, 1-0. Este é o quinto golo do médio, o segundo em duas jornadas seguidas (Estoril). Jonas assinou a oitava assistência, ultrapassando assim Gaitán.

O Arouca nem havia entrado mal, com pressão ousada e dois, três contra-ataques a ameaçar a área encarnada. Daí nada resultou. Não se pode dizer o mesmo do que aconteceu aos 19′, após canto de Pizzi. O médio português bateu, Lisandro cabeceou para a confusão e Mitroglou encostou de calcanhar, com muita pinta. Este barbudo continua a dar cartas e muitas razões para não sair do onze. Terá convencido Rui Vitória?

O Benfica, apesar de ficar confortável e confiante, foi tirando o pé do acelerador. Em vez de pensar em algo arrojado, preferiu sossegar. Mas não seria por isso que os lances de perigo ou as jogadas com toques malucos deixaram de acontecer. Jonas, depois de uma diagonal da direita para o centro, à velocidade-Jonas, que é lenta, lentinha (ou ele engana-nos a todos), ultrapassou três e tentou colocar. Valeu Bracalli. Intervalo na Luz.

A segunda parte começou com a primeira defesa de Júlio César, a remate de Artur. Pouco depois, Maurides (entrara para o lugar de Roberto) teve duas oportunidades que assustou as gentes da Luz. A seguir, um momento que quase equivale à felicidade de um golo para os benfiquistas: Gaitán em campo. Saiu Pizzi, outro jogador que está nas bocas do mundo. Ou de Portugal, vá. Terá este médio aspirações de ir à seleção de Fernando Santos?

Aos 68′, um momento agridoce. Então não é que Jonas marcou mais um, o 3-0, não festejou e ainda deu um ralhete a Mitroglou? Então foi assim: o grego surgiu isolado na cara do guarda-redes brasileiro do Arouca e falhou; na ressaca, os dois avançados do Benfica tentaram impor-se, até um ao outro, sendo que Jonas acabaria por “ganhar” e empurrar para a baliza deserta, 3-0. O  brasileiro assinava o 20.º golo no campeonato, o quarto em jogos consecutivos, mas ficou em brasa. A cara ficou fechada, zangada. Depois, dirigiu-se para Mitroglou: “Joga!”, que é como quem diz “passa”…

Até final ainda se veria mais qualquer coisa, nomeadamente um remate perigoso de Talisca e o golo de Sema Velásquez, um central venezuelano que chegou esta época do Mineros de Guayana. O central tem 184 cm e 81 quilos. Curiosamente, este defesa já havia jogado com Nuno Coelho (médio do Arouca) no Villarreal B. Entre 2012-2014 jogou no Panathinaikos.

Ponto final no Estádio da Luz. Houve destaques? Ora essa, senhores. Lisandro continua a mostrar que é jogador para o Benfica, e que devia ser levado a sério, mesmo quando o capitão Luisão voltar. Samaris e Renato Sanches vão encaixando, embora nem sempre saibam agarrar o jogo e controlá-lo, congelando a bola. Mitroglou marcou pelo terceiro jogo consecutivo, e de calcanhar, com pinta. A surpresa, contudo, será Carcela. O extremo correu, fintou, andou para a frente, andou para trás, deu de cabeça, foi ao chão, apareceu na sua área para defender. Bom, a atitude deste extremo é outra, algo que aliada à sua velocidade e ousadia já soa a outra cantiga…

Esta foi a terceira vez que o Arouca visitou o Estádio da Luz para o Campeonato Português. A primeira vez foi em dezembro de 2013, num jogo que acabou 2-2: Rodrigo e Lima marcaram para os da casa, enquanto David Simão e Serginho consumariam a dor de cabeça… A segunda visita do Arouca à Luz aconteceu em outubro de 2014: 4-0 para o Benfica, com golos de Talisca, Derley, Salvio e Jonas.