O Ministério Público (MP) pediu, no Tribunal de Aveiro, a condenação do sucateiro Manuel Godinho e outros dois arguidos por um crime de corrupção, num processo que resultou de uma certidão extraída do caso “Face Oculta”.

O julgamento é uma repetição e diz respeito a factos que remontam a 2009, quando Manuel Godinho terá mandado a sua então secretária pessoal entregar 2.500 euros a um vigilante da natureza da Administração da Região Hidrográfica do Centro, para evitar a fiscalização de uma extração ilegal de areias na Quinta dos Ananases, em Ovar.

Nas alegações finais, o procurador da República, Carlos Filipe, disse ter ficado provado que o vigilante da natureza, a troco de promessas patrimoniais ou não patrimoniais, informou Manuel Godinho das ações de fiscalização promovidas pela Administração da Região Hidrográfica do Centro das quais poderia ser alvo a atividade das empresas por si administradas.

“Dúvidas não nos assaltam de que se mostram preenchidos os elementos típicos objetivos e subjetivos dos tipos legais de crime por corrupção passiva e ativa pelos quais os arguidos se acham acusados”, disse.

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O procurador defendeu ainda a perda a favor do Estado dos 2.500 euros alegadamente recebidos pelo vigilante da natureza.

Do lado da defesa, o advogado de Manuel Godinho, o qual não compareceu na audiência por motivos de saúde, disse ter ficado com dúvidas quanto à localização exata da Quinta dos Ananases, uma questão que considerou “essencial” para este processo.

Artur Marques, que também defende a então secretária pessoal do sucateiro, considerou que a acusação do MP não passa de “pura especulação” e um “devaneio total”, alegando que a ação de fiscalização de que se fala no processo “não tem rigorosamente nada a ver com as empresas de Manuel Godinho”.

“A luta pela condenação destes arguidos, que já foram absolvidos uma vez, é uma luta inglória que esbarra na total ausência de prova”, disse o causídico, pedindo a absolvição dos seus clientes.

O advogado do vigilante da natureza realçou, por seu lado, que este “não tinha competência para fiscalizar a extração de inertes”.

“Parece-nos um ato impossível tentar corromper alguém para não pratique um ato para o qual não tem competências para o fazer”, frisou o causídico, pedindo igualmente a absolvição do seu cliente.

Durante o julgamento, os três arguidos remeteram-se ao silêncio.

A leitura do acórdão ficou marcada para 26 de fevereiro, pelas 14:00.

Em dezembro de 2013, os três arguidos foram absolvidos da prática de um crime de corrupção porque, segundo o coletivo de juízes, não se provou a tese de que a ação fiscalizadora tenha sido ordenada, mas não efetuada, a troco de dinheiro.

Inconformado com a decisão, o Ministério Público recorreu para o Tribunal da Relação do Porto que mandou repetir o julgamento, considerando que a prova produzida e examinada durante o julgamento “impõe conclusão diversa” do acórdão recorrido.

Em setembro de 2014, Manuel Godinho foi condenado no âmbito do processo “Face Oculta” a uma pena única de 17 anos e meio de prisão, em cúmulo jurídico, por 49 crimes de associação criminosa, corrupção, tráfico de influência, furto qualificado, burla, falsificação e perturbação de arrematação pública.

Mais recentemente, no passado mês de novembro, foi condenado a mais dois anos e meio de prisão efetiva, por subornar um ex-funcionário da antiga Rede Ferroviária Nacional (Refer), também condenado no mesmo processo.

O empresário de Ovar aguarda em liberdade o desfecho dos recursos dos dois acórdãos interpostos pela sua defesa.