O Governo deve entregar logo após a reunião extraordinária do Conselho de Comisários europeus na Assembleia da República a proposta de Orçamento do Estado para 2016 (OE 2016), depois de um esboço de plano orçamental que motivou negociações com a Comissão Europeia e dúvidas de diferentes entidades.

No esboço do OE 2016, enviado a Bruxelas a 22 de janeiro, o Governo socialista comprometeu-se com um défice orçamental de 2,6% do Produto Interno Bruto (PIB) e um crescimento económico de 2,1% este ano (chegou a existir uma previsão de 2,6%), bem como com a reposição salarial no setor público e a redução da sobretaxa do IRS, por um lado, e com aumentos nos impostos sobre os produtos petrolíferos, de selo e sobre o tabaco, por outro.

As estimativas de crescimento e de redução do défice motivaram críticas, tanto por organismos independentes, como o Conselho de Finanças Públicas (CFP) e a Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO), como por agências de ‘rating’ e analistas.

As dúvidas chegaram também da Comissão Europeia, principalmente quanto à estimativa de défice estrutural, que exclui as medidas extraordinárias e os efeitos do ciclo económico, uma vez que a redução prevista pelo Governo ficava um terço aquém das recomendações do Conselho Europeu.

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No ‘draft’, o executivo liderado por António Costa antevê uma redução do défice estrutural em 0,2 pontos percentuais (de 1,3% em 2015 para 1,1% em 2016), abaixo da recomendação europeia feita em julho, de uma redução de 0,6 pontos percentuais.

Durante uma semana de intensas negociações com Bruxelas, a imprensa noticiou que, para acomodar as exigências da Comissão Europeia, o Governo comprometia-se com uma redução mais acentuada do défice orçamental, para 2,4% do PIB, e do défice estrutural, para 0,9%, e previa uma estimativa de crescimento económico mais baixa, de 1,9%.

Além disso, o Governo admitia mais aumentos de impostos, nos produtos petrolíferos e sobre os veículos, uma reavaliação dos ativos das empresas, e que o IVA sobre as bebidas manter-se-ia nos 23%.

Estas alterações ao esboço não foram confirmadas oficialmente.

De Bruxelas, o comissário dos Assuntos Económicos, Pierre Moscovici, disse na quinta-feira que as mais recentes propostas do Governo português, no quadro das discussões sobre o plano orçamental para 2016, “vão no bom sentido”, mas afirmou ser cedo para antecipar a decisão final, escusando-se a comentar ou a quantificar o que ainda separa Bruxelas e Lisboa.

“As discussões continuam. É muito cedo para vos dar conta da nossa conclusão. O que lhes posso dizer é que tomaremos as decisões necessárias, no quadro do Pacto de Estabilidade e Crescimento, e (o vice-presidente responsável pelo Euro) Valdis Dombrovskis e eu próprio apresentaremos as conclusões amanhã (sexta-feira)”, apontou Moscovici.

O colégio de comissários reúne-se extraordinariamente às 14h00 locais (13h00 de Lisboa), para tomar uma decisão sobre o esboço de OE 2016 português.

No encontro, o colégio da ‘Comissão Juncker’ irá decidir se o projeto de plano orçamental português para 2016 acarreta “incumprimentos particularmente graves” do Pacto de Estabilidade e Crescimento, determinando assim se o Governo precisa ou não de apresentar um documento revisto.

Eis as principais medidas previstas no esboço de OE 2016, apresentado a 22 de janeiro:

Reposição salarial nos funcionários públicos e redução da sobretaxa

Haverá reposição salarial para os funcionários públicos, de forma faseada ao longo deste ano. Em 2015, o Governo PSD/CDS-PP repôs 20% da totalidade dos cortes salariais aplicados desde a entrada em vigor do Orçamento do Estado para 2011, elaborado pelo segundo executivo liderado por José Sócrates.

A restante fatia de 80% será reposta este ano a um ritmo de 25% em cada trimestre, o que permite que os trabalhadores do setor público recebam integralmente os respetivos vencimentos em outubro de 2016. Esta reposição salarial tem um custo de 446 milhões.

Já a eliminação parcial da sobretaxa em sede de IRS custará 430 milhões. O Governo decidiu eliminar a sobretaxa em 2016 para os contribuintes do escalão mais baixo de rendimentos e torná-la progressiva para os escalões seguintes, mantendo-a inalterada para os rendimentos acima de 80.000 euros.

TSU desce 1,5% para trabalhadores com menos de 600 euros

Os trabalhadores com salários iguais ou inferiores a 600 euros mensais vão beneficiar de uma redução da Taxa Social Única (TSU) até 1,5 pontos este ano. A medida já fazia parte do programa do Governo e, segundo o esboço do Orçamento, levará a uma perda de receita equivalente a 0,07% do PIB. Se a descida for de 1,5 pontos, então, estes trabalhadores deixarão de descontar 11% para a Segurança Social, descontando apenas 9,5%.

Aumento de cinco cêntimos na gasolina e quatro no gasóleo

O Imposto sobre Produtos Petrolíferos (ISP) deverá aumentar em cinco cêntimos na gasolina e em quatro cêntimos no gasóleo. O ministro das Finanças, Mário Centeno, justificou esta medida com a redução do preço do petróleo e a consequente queda na receita fiscal proveniente do ISP, pelo que o Governo pretende recuperar os níveis de receita que era arrecadada em julho de 2015.

Aumento do Imposto de Selo no crédito ao consumo

O Governo pretende aumentar o Imposto de Selo que incide sobre as transações financeiras de crédito ao consumo em 50%, com o ministro das Finanças a dizer que quer contribuir para uma “maior contenção ao endividamento das famílias”.

Aumento do Imposto sobre o Tabaco

O Governo pretende alterar o Imposto sobre o Tabaco, alterando a “fórmula do que tecnicamente se chama imposto mínimo, que hoje em dia apenas tem impacto numa parcela do imposto, que é cobrado e que passa a incluir também o IVA”, explicou o ministro.

“É uma alteração fiscal que atualiza o valor do imposto específico em 3% e que tem impacto ao longo da cadeia de preços”, disse Mário Centeno.

Descida do IVA da restauração

A redução do IVA na restauração de 23% para 13% está prevista a partir de julho e terá um impacto orçamental negativo, em comparação com 2015, de 0,09% do Produto Interno Bruto (PIB).

Escalões de IRS e taxa de IRC mantêm-se sem alterações

O ministro das Finanças garantiu que “não há nenhuma alteração aos escalões de IRS no OE 2016”.

Em 2013, o então ministro das Finanças Vítor Gaspar, do governo PSD/CDS-PP, alterou os escalões do IRS – Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares, que passaram de oito para cinco.

As taxas de imposto da tabela atual são a taxa mínima normal de 14,50% para rendimento coletável até sete mil euros por ano, 28,5% entre sete e 20 mil euros, 37% entre 20 e 40 mil, 45% acima de 40 mil e até 80 mil euros por ano e, por fim, 48% para rendimentos acima de 80 mil euros por ano.

Por outro lado, e no que diz respeito ao rendimento das empresas, também a sobretaxa de IRC se mantém nos 21% este ano.

Pensões e apoios sociais

O Governo pretende atualizar as pensões em 0,4% e complementos até 628,82 euros, o que vai aumentar a despesa em 0,03% do PIB, bem como revogar a suspensão do pagamento dos complementos de pensão aos trabalhadores do setor empresarial do Estado (como as empresas de transportes), que custará 0,01% do PIB.

Além disso, prevê a reposição do valor de referência do Complemento Solidário para Idosos (CSI) no valor anual de 5.022 euros, esperando-se que tenha um impacto neutro nas contas públicas face a 2015.

Quanto aos apoios sociais, a reposição da escala de referência aplicável em 2012 e do valor de referência do Rendimento Social de Inserção (RSI) em 25% vai custar mais 0,03% do PIB este ano.

Nas prestações familiares, que vão pesar mais 0,02% este ano face 2015, o Governo prevê a atualização do abono de família de 3,5% no primeiro escalão, de 2,5% no segundo escalão e de 2% no terceiro escalão. Tem igualmente impacto no pré-natal, apesar de ser menor, por este ser indexado ao abono de família. É ainda reforçada a majoração para famílias monoparentais beneficiárias do abono pré-natal, aumentando em 15 pontos percentuais a taxa de majoração em vigor, passando para 35%.