Dois cientistas, professores num Programa de pós-Graduação Ciência desenvolvido pelo Instituto Gulbenkian de Ciência, em colaboração com o Ministério de Ciência de Cabo Verde, contestam a construção em Cabo Verde de um complexo turístico do empresário chinês David Chow.

Rui Castanhinha e Joana Sape mostraram-se contra a edificação do complexo turístico integrado no ilhéu de Santa Maria e Gamboa, na cidade da Praia, após visitarem o local no âmbito da componente letiva da terceira edição do Programa de Pós-Gradução Ciência e Desenvolvimento (PGCD), um programa de doutoramento destinado a alunos dos PALOP e Timor Leste.

Numa nota enviada às redações, o Instituto Gulbenkian de Ciência esclareceu que “a opinião dos cientistas entrevistados é individual e não representa uma posição institucional do Programa de pós-Graduação Ciência para o Desenvolvimento, nem do Instituto Gulbenkian de Ciência”.

“Seria altamente recomendável evitar que qualquer projeto avançasse ali e que houvesse um estudo muito aprofundado do impacto ambiental e histórico de qualquer construção que possa ser feita ali”, disse o paleontólogo português Rui Castanhinha, citado pela Inforpress.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

O cientista afirmou que o Ilhéu de Santa Maria contribuiu para que o naturalista Charles Darwin construísse um pensamento lógico para revolucionar a Ciência da Biologia, pelo que recomendou a inviabilização de qualquer construção no local.

Castanhinha considerou que, do ponto de vista histórico, o “Djéu” simboliza um local de importância extraordinária, ainda que do ponto de vista ambiental seja “muito pouco conhecido”, pelo que reclama mais estudos do ponto de vista biológico e geológico.

Opinião idêntica tem a cientista Joana Sape, para quem seria essencial preservar alguma praia do ilhéu.

Esta posição surge numa semana em que foi formalmente lançada a primeira pedra para a construção da estância turística no ilhéu de Santa Maria e na Gamboa, situado defronte da cidade da Praia, do empresário chinês David Chow, e orçado em 250 milhões de euros – cerca de 15% do PIB de Cabo Verde.

Em agosto, cerca de 40 elementos do movimento cabo-verdiano “Korrenti di Ativista” acamparam no ilhéu de Santa Maria em protesto contra a construção do complexo, considerando que irá servir sobretudo para trazer ao país “lavagem de capitais, prostituição e turismo sexual”.

Na semana passada, o ex-bastonário da Ordem dos Arquitetos (OAC) cabo-verdianos, Cipriano Fernandes, pediu a intervenção da Procuradoria-Geral da República (PGR) para suspender o projeto, por considerar que não respeita todos os requisitos legais e que o mesmo deveria ser aberto ao escrutínio público.

Após o lançamento da primeira pedra, tanto o empresário David Chow como o Governo cabo-verdiano desdramatizaram e consideraram normal as várias vozes que se tem manifestado o seu desagrado perante o projeto.

David Chow disse que não se consegue satisfazer toda a gente, entendem que no futuro, quando se começar a ver os resultados, poderão olhar o projeto de outra forma. Entretanto, garantiu que há abertura para alterações.

O complexo, previsto para estar pronto dentro de três anos, prevê a construção de um hotel-casino no ilhéu de Santa Maria, uma marina, uma zona pedonal com comércio e restaurantes, um centro de congressos, infraestruturas hoteleiras e residenciais na zona da Praia da Gamboa e uma zona de estacionamento.

Trata-se do maior empreendimento turístico no país, que cobrirá uma área de 152.700 metros quadrados e inaugurará a indústria de jogo no arquipélago. Durante a construção vai gerar mais de dois mil postos de trabalho.

Artigo corrigido às 20 horas de 18 de fevereiro depois da Nota de Esclarecimento enviada pelo Instituto Gulbenkian de Ciência às redações.

No seguimento das notícias veiculadas em vários meios de comunicação social sobre a contestação à construção de um complexo turístico em Cabo Verde feita por um grupo de cientistas, o Instituto Gulbenkian de Ciência (IGC) vem esclarecer que não emitiu parecer sobre a construção do dito complexo, nem coordena a ação de nenhum grupo de cientistas contra essa construção. O Instituto Gulbenkian de Ciência não se pronuncia sobre decisões políticas de Estado nacionais ou internacionais, exceto para assuntos científicos e sempre a pedido, o que não foi o caso.”