Recomeça o jogo. Mal toca na bola ouvem-se uns aplausos. Não muitos, os suficientes para serem audíveis.

Nem há dez segundos a bola se tinha espreguiçado para sacudir o descanso do intervalo quando lhe chega aos pés. Fácil, nada de mais, um passe rasteiro de um central para outro, era só dominar com um toque e dar-lhe guia de marcha com outros. Uns poucos milhares de palmas batem-se nas bancadas para felicitar Chidozie por fazer o que um imberbe dos infantis seria capaz de imitar. Receber, tocar e passar. Leva uma tímida ovação por cumprir no banal depois de se mostrar verde no imprescindível. Ou no que é ser um central em equipa grande que faz por andar sempre à caça de títulos.

Nos 45 minutos e mais uns segundos que antecederam isto, o nigeriano de 19 anos foi a parte mais visível de como os dragões não souberam lidar com a ousadia. Viu-se que Chidozie estava desconfortável, desabituado às dezenas de metros de relva nas costas, entre ele e Iker Casillas, que não tivera há uma semana, no Estádio da Luz. Tinha que estar perto da linha do meio campo, puxado pela corda de uma equipa que pressiona lá em cima e quer encurtar o campo ao adversário. É muita coisa nova, incluindo levar com um contra-ataque em que não tem o lateral à direita e ver alguém, com a bola, a correr na sua direção. Mantém os olhos fixados na bola, estica em vez de fechar ao meio, não repara quando Boateng começa a desmarcar-se de fora para dentro para receber um passe de Evaldo.

A desatenção foi a autoestrada a que uma parada de Casillas dera um cruzamento para, depois, o brasileiro do Moreirense virar à direita e tocar em Iuri Medeiros. Pé esquerdo, remate de primeira, golo do extremo canhoto aos 10’. A sonolência de Chidozie durou até aos 28’, quando o extremo português, à direita, quis desmarcar Boateng para a área, mas esticou-se um pouco na força. O que parecia um passe falhado foi uma bola bem metida em Fábio Espinho, porque o central nigeriano achou que não tinha ninguém nas costas. Tinha o português que sprintou até conseguiu esticar o pé direito e desviar a bola do guarda-redes do FC Porto. Antes da meia hora já o Moreirense vencia por 2-0.

A culpa não era de Chidozie, mas o miúdo que se aguentara na Luz era quem quem mais sofria no Dragão. Porque a equipa de Miguel Leal era ousada ao ponto de jogar de peito feito, a portar-se como um grande que visita outro, com meia equipa a pressionar para lá do meio campo e todos os jogadores a reagirem como loucos às perdas de bola. A coragem juntava-se ao risco e compensava porque os dragões tremiam sempre que o Moreirense lançava o veloz Boateng pelas costas de Chidozie, onde o avançado ficava sempre à espera de passes. E não sabiam lidar com isto. Brahimi agarrava-se à bola como sempre, Herrera e André não tinham tempo para se virarem com a bola para o jogo e além do cruzamento que deu à cabeça de Suk para rematar à barra, Corona mal tocava na bola.

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Porto's coach Jose Peseiro arrives to the bench before the start of the Portuguese league football match FC Porto vs Moreirense FC at the Dragao stadium in Porto on February 20, 2016. / AFP / MIGUEL RIOPA (Photo credit should read MIGUEL RIOPA/AFP/Getty Images)

Foto: MIGUEL RIOPA/AFP/Getty Images

Os dragões irritavam-se com tudo isto e só iam tentando com raça e garra. Sobrava pouco tino para montar jogadas, como o que Maxi Pereira teve para esperar pelo carrinho com que André Micael lhe tocou na área após cortar a bola. O árbitro achou que era penálti e Layún julgou era era altura de marcar em vez de fazer o habitual, que é assistir. O FC Porto já só tinha um golo a menos ao intervalo.

E teve-o durante muito tempo. O necessário até José Peseiro ver como fez a equipa ficar coxa, quando tirou Corona, pôs Evandro no jogo e deixou os dragões com Layún como a única hipótese de alguém cruzar a bola para a área. Porque a equipa tinha um médio a mais, Brahimi não começou a ser o extremo que cruza em vez de fintar e André André rendeu-se à tendência que sempre tem — começou a ir sempre pedir bola à direita quando as pilhas de Maxi Pereira não o deixavam atacar sempre. E todas as jogadas passaram a ir à esquerda pois era lá que estava o homem que já dera 14 golos para outros marcarem no campeonato. Foi assim que Layun foi cruzando para a cabeça de Suk ir rematando na área.

Só assim o FC Porto fintava um Moreirense que tinha os jogadores recuados, juntos à área, a verem como a pressa de querer fazer tudo rápido e para a frente traía os dragões. Já se comportava como equipa pequena se comporta quando visita aquele estádio. E só quebrou aos 73’, quando mais uma bola cruzada por Layún deixou Suk marcar ao sexto cabeceamento que fazia no jogo. E três minutos tardaram até o mexicano atirar outra bola para a área, que um salto acrobático de Herrera impediu de sair de campo e passou a Evandro, cuja cabeça apareceu ao segundo poste para dar a reviravolta à equipa. Desde 1998/99 que o FC Porto não respondia a dois golos de desvantagem.

Teve de o fazer com a cabeça — Suk teve sete e não fez um remate com os pés à baliza — porque, durante hora e meia, pouco foi o juízo que a equipa teve nos pés. A equipa que Peseiro quer ver a trocar passes para a frente, com poucos toques e sempre com uma pitada de risco lidou mal contra um adversário que o pressionou como tudo até ficar sem pernas. Livrou-se de boa.

Quem filmaram as câmaras? Chidozie, que bem sorriu, dentes todos à mostra, enquanto pulava e corria para celebrar o golo da vitória. Foi ele que as câmaras de focaram durante a festa.