Dois antigos governadores da província de Luanda, dirigentes do MPLA, recusaram esta terça-feira qualquer relação com os ativistas acusados em julgamento da preparação de uma rebelião, garantindo que nunca foram contactados para integrar um alegado governo de salvação nacional.

Os dois militantes do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), partido no poder, prestavam hoje declarações no julgamento dos 17 ativistas que decorre em Luanda, enquanto testemunhas. Tal como outras quatro pessoas ouvidas nesta sessão, integram a lista de um suposto governo de salvação nacional, utilizada como prova em tribunal contra os jovens, acusados neste processo ainda de atos preparatórios de um atentado contra o presidente.

José Aníbal Rocha, de 67 anos, desempenhou o cargo de governador da província de Luanda de 1997 a 2002 – entre outros cargos e funções no MPLA – e estava indicado na referida lista, associada pela acusação aos 17 jovens “revolucionários”, para a ministro da Construção e Obras Públicas, mas afirmou em tribunal a “surpresa” quando foi alertado para a inclusão do seu nome nesta lista.

“Desde 26 anos que sou militante do MPLA. Para mim seria uma vil traição pactuar com uma ideia destas”, afirmou José Aníbal Rocha, questionado em tribunal.

Acrescentou que nunca contactou com os réus e que desconhecia a existência desta lista, cuja divulgação pública, disse, “beliscou” a sua “reputação social e condição de dirigente do MPLA”.

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Em causa está a lista elaborada e publicada nas redes sociais, como o próprio já admitiu publicamente, pelo jurista angolano Albano Pedro, que não está acusado neste processo, sendo composta por pessoas que supostamente iriam substituir o Governo legitimamente eleito.

Posição semelhante assumiu José Maria Ferraz dos Santos, de 47 anos, igualmente dirigente do MPLA e que foi governador da província de Luanda entre 2010 e 2011, indicado nesta lista precisamente para as mesmas funções na capital angolana.

“Se há cargo para fugir neste país, é o de governador da província de Luanda”, ironizou, em tribunal, para depois criticar o seu envolvimento nesta lista – que classificou como uma “brincadeira” – e eventuais conotações aos jovens “revolucionários”, que afirmou desconhecer pessoalmente.

Além disso, atirou, em caso de revolução “seria dos primeiros a ser executado”, lembrando que é dirigente “de um partido que [os jovens] estão a combater” e criticando o comportamento destes ativistas.

Também presente em tribunal esteve o docente e investigador universitário Nélson Pestana, militante do partido Bloco Democrático, indicado na mesma lista paras funções de ministro do Empreendedorismo e Combate à Pobreza, que negou – como todos os ouvidos hoje – qualquer conhecimento prévio ou autorização para a inclusão do seu nome na lista.

“Apesar de ser doutor em ciências políticas, não sou especialista em ‘OPMIs’: Objetos Políticos Não Identificados”, ironizou, perante o juiz, assumindo que apear de convocado por edital publicado no Jornal de Angola, e não notificado para a residência, optou por se apresentar em tribunal pelas “boas relações e solidariedade” com todos os réus.

“Está-se perder muito tempo e dinheiro com uma coisa que não tem sentido. É uma manobra claramente dilatória que não beneficia a imagem da Justiça e do país”, disse, no final da audiência, aos jornalistas, Nélson Pestana.

“Sou solidário com estes jovens e com todas as pessoas que lutam contra a ditadura neste país. Eu próprio sou contra a ditadura e todos os que lutam por meios pacíficos terão a minha solidariedade”, enfatizou.

Também do Bloco Democrático, Adão Manuel negou hoje em tribunal qualquer contacto dos ativistas em julgamento e o conhecimento prévio da lista, tal como outros dois declarantes.

Esta terça-feira foram ouvidos apenas seis dos 23 declarantes que estavam arrolados, motivo pelo qual o tribunal decidiu suspender, mais uma vez, o julgamento, para ser retomado a 07 de março.