Paulo Portas não tem dúvidas de que muita coisa mudou desde que o primeiro-ministro passou a ser de um partido que não ganhou as eleições. Acabou-se o voto útil e a única verdade que vigora é a de que “fica no Governo quem tiver a maior soma de deputados eleitos”, disse esta terça-feira em entrevista à Rádio Renascença. E essa verdade vale tanto para a esquerda como para a direita: “Talvez um dia aconteça o mesmo àqueles que agora fizeram isto”, disse, rejeitando qualquer sentimento de “frustração” por a coligação PàF não ter conseguido formar governo.

Foi a última entrevista de Paulo Portas enquanto líder partidário, já que no próximo sábado o CDS-PP reúne-se em congresso para eleger o novo presidente depois de 16 anos de portismo. Mas Paulo Portas recusa-se a revelar, para já, que emprego vai passar a ter, agora que sai da política ativa. “A seu tempo revelarei, mas não tem muito a ver com o que se tem dito nos jornais”, limitou-se a dizer.

Questionado pela jornalista sobre se sentia frustração pelo facto de a coligação ter sido a força política mais votada, mas estar agora na oposição, Portas recusou a ideia e afirmou que, apesar de ter sido a primeira vez que tal aconteceu em Portugal, “não será certamente a última”. Isto porque, disse, ficou claro desde as últimas legislativas que basta a matemática funcionar em prol de um partido para esse partido governar, não interessando para isso se ganha ou não as eleições. “O centro-direita em Portugal voltará a governar se tiver 116 deputados”, reforçou.

Ou seja, há uma vantagem para o CDS no novo quadro político que se desenhou: a ideia de que o voto útil acabou. “As pessoas que estão de coração e razão mais perto do CDS, mas que chegam à última semana e, com medo de que o PS possa ganhar, deslocam o seu voto para o PSD, essas pessoas têm agora a prova de que não precisam de fazer isso”, afirmou o ainda líder dos centristas. “Cada voto no CDS conta e as pessoas vão perceber isso”, acrescentou, vaticinando ainda que “aquilo que a esquerda fez pode vir a acontecer-lhes a eles”.

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Sobre a atuação do Governo do PS, Paulo Portas afirma que, “objetivamente”, não quer que “as coisas corram mal a Portugal”, mas acredita que a “geringonça” tem um “problema” de raiz que é difícil de contornar: o equilíbrio interno com os partidos à esquerda, “que acham que é possível dar tudo a todos como se estivessem em campanha permanente”, e o equilíbrio com a União Europeia, “que obriga a rigor orçamental”.

“É difícil satisfazer o dogmatismo ideológico e cumprir as regras da União Europeia”, disse, lembrando que “governar é ser realista e muitas vezes não fazermos o que queremos mas o que a margem de manobra nos aconselha”.

Na mesma entrevista, feita na véspera de Marcelo Rebelo de Sousa tomar posse, Portas defendeu que o ex-líder do PSD vai ser “um bom Presidente”, e acima de tudo um Presidente “diferente”. “O que ficará depois dele vai ser diferente daquilo que conhecemos hoje”, sublinhou.

Elogiando o estado em que deixa o CDS, com “uma geração combativa e muito bem preparada”, Portas reforçou que ao fim de 16 anos fez um “serviço à instituição” ao perceber que se tinha de retirar e garantiu que, no próximo sábado, vai despedir-se do partido “com muita amizade e carinho”.