Whores of Yore. Que é como diz, como eram “as prostitutas de outrora”. Esta conta Twitter — que resultou da tese de doutoramento sobre prostituição da investigadora inglesa Kate Lister — explica-nos, da Londres oitocentista às gueixas japonesas, o porquê da prostituição ser, afinal, a profissão mais antiga do mundo.

Eis algumas das curiosidades que Kate Lister descobriu e partilhou:

1668, o ano da primeira grande manifestação de prostitutas

Antes mesmo do Movimento Operário se organizar como tal, fizeram-no primeiro as prostitutas, manifestando-se pelos seus direitos na Inglaterra do Século XVII. E porque é que se manifestaram elas nas ruas? Precisamente porque as ordens religiosas (e não só) exigiram ao Rei que proibisse as prostitutas de deambular pelas ruas de Londres, vendendo o corpo. E este proibiu mesmo. Mas só parcialmente. É que nenhum bordel fechou portas. Afinal, a amante do Rei Carlos II, ela própria, lady Castlemanine, era prostituta num bordel.

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Um velho provérbio contra a prostituição… e a sífilis

Uma noite nos braços de Vénus, uma vida com Mercúrio. Esqueçam-se aqui as mitologias e divindades. A origem do provérbio é mais recente (remontará ao século XVIII) e terrena. Um provérbio que alertava para os males da sífilis e do sexo com prostitutas, pois a doença, até meados do século XX nalguns países, era tratada com mercúrio.

A “madame” mais respeitada do faroeste

Julia Bulette dirigiu um dos bordeis mais famosos dos Estados Unidos, em Virgínia, no Nevada, durante a Conquista do Oeste: o Julia’s Palace. Julia foi assassinada a 19 de janeiro de 1867 por estrangulamento. E a cidade decretou um dia de luto quando se soube da sua morte às mãos de um tal de John Millain. O seu assassino só foi capturado um ano depois, acabando enforcado. Entre os muitos ilustres na assistência, enquanto Millain subia ao cadafalso, estava o escritor Mark Twain.

Não são o 007, mas têm licença para… se prostituir

Se não se controla a prostituição nas ruas, ao menos que se regule o seu exercício. Foi certamente o que pensaram as autoridades norte-americanas, que durante o século XIX emitiram licenças para as prostitutas poderem trabalhar nas ruas e nos bordeis. No Twitter de Whores of Yore vê-se uma dessas licenças, da cidade de Nashville, no estado do Tennessee. Qualquer prostituta que fosse descoberta pelas autoridades a trabalhar sem a licença seria encarcerada até 30 dias.

Fanny Murray, a cortesã escritora. Ou não

Outra mulher ilustre (falámos ainda agora de Julia Bulette e falaremos adiante de outra) que se dedicou à prostituição foi Fanny Murray, amante do quarto conde de Sándwich, John Montagu. A vida de Fanny, vinda do nada, abandonada pelos país na infância, deixada ao Deus-dará, e que ascendeu até à alta sociedade londrina, acabou em livro: “The Memoirs of the Celebrated Miss Fanny Murray”. A escrita é auto-biográfica, mas poucos acreditam (até porque Fanny Murray seria analfabeta) que tenha sido a pena da prostituta a escrevê-la. Talvez fosse a do conde Montagu…

A pornografia (literária) do século XIX

“The Sins of the Cities of the Plain”. O livro fala de sodomia, tribadismo, sexo, sexo e mais sexo. Sexo sem pudores. O autor não tem nome nem tão pouco rosto, mas crê-se que o livro foi escrito por James Campbell Reddie ou Simeon Solomon. As historias são as de Jack Saul, prostituto, histórias que fariam E. L. James (a autora de “Cinquenta Sombra de Grey”) ou o Marquês de Sade, pelo pormenor das descrições, corar de vergonha. Se não acredita, leia a passagem no tweet do Whores of Yore acima. Aviso: tem bolinha vermelha no canto.

O passado (pouco) desconhecido de Maya Angelou

Maya Angelou. O nome traz-nos de imediato à memória uma das grandes poetisas negras do século XX, autora de obras marcantes como “I Know Why the Caged Bird Sings”. Muitas das suas biografias dizem (por alto, preferindo destacar a sua ação feminista e pelos direitos civis dos afro-americanos) que Angelou trabalhou como prostituta na sua juventude. Ela própria, sem teias nem peias, sempre escreveu sobre as suas experiências sexuais enquanto prostituta. Como aqui, em “Gather Together in My Name”: “The only time I have been ashamed of my experiences with respect to prostitution is when others told me how bad it was and how horrible it must have been. I was chastised and outcasted for the choices I have made. What was horrible, though, was being told that I was a victim when I didn’t identify as a victim.”

Proust, a masturbação e as prostitutas

Segundo alguns testemunhos da época, o autor de “Em Busca do Tempo Perdido” terá, alegadamente, financiado um bordel sadomasoquista e… homossexual. Um bordel que ele próprio, Marcel Proust, frequentou — e muito. O que não é só “diz-que-diz”, mas verdade escrita em papel, é a carta de Proust ao tio, uma carta em que lhe pedia dinheiro para que, e citamos, uma prostituta detivesse o seu “lamentável hábito masturbatório”. E acrescentava, Proust: “Se se comoveu com a minha condição — e como sei que é capaz de atender ao meu pedido –, espero que o tio me possa emprestar o dinheiro”. E emprestou-o mesmo. Onde o investiu, o escritor? Num bordel foi certamente. Mas mentiu, em parte, ao tio quanto a quem procurou nesse bordel para “purgar” os seus maus-hábitos.

A ode de Walt Whitman a uma “prostituta comum”

O grande poeta da Guerra Civil norte-americana também escreveu sobre prostitutas. Mais: escreveu para elas. Lê-se, a versos tantos, no poema “A Uma Prostituta Comum”: “Minha menina, eu marco um encontro contigo, / e encarrego-te de fazeres / os preparativos para teres valor ao encontrares-me, / e encarrego-te de ficares paciente e perfeita / até eu chegar.” Walt Withman não foi o único poeta a morrer de amores por uma prostituta. Barbosa du Bocage (“Não lamentes, oh Nise, o teu estado”), Charles Bukowski (“I craved prostitutes because they were deadly and hard and made no personal demands”) e tantos outros também o morreram. Metaforicamente. Em poema.

Mulher, prostituta e pirata: eis Ching Shih

A vida de Ching Shih dava um filme. E deu: é ela uma das personagens recordada em “Piratas das Caraíbas: Nos Confins do Mundo”. Mas não é somente a sétima arte quem a revisita. Jorge Luis Borges também o fez em “História Universal da Infâmia”, onde a viúva Ching é uma “intrépida e sanguinária pirata”. Mas Ching Shih não foi só pirata, não comandou apenas uma armada de 20 a 40 mil homens e 300 navios; Ching Shih foi também prostituta.