E ao quinto dia de uma semana política intensa, chega a tomada de posse de mais um político, mas como “homem livre”, que faz o que lhe “apetece”, sendo que isso não passa pela vida político-partidária. Isto, ainda que António José Seguro tenha marcado o lançamento do seu livro sobre o meio político, numa sala (universitária) absolutamente cheia de políticos, com apreciações políticas, aparições políticas, num ambiente pouco diferente daquele a que habituou o país até setembro de 2014.

Há um ano e meio afastado dos holofotes e dos palcos públicos, o ex-líder do PS regressou. Mas “isto não é nenhum regresso à vida partidária. Há muita vida além da vida partidária”, atirou António José Seguro entre os muitos apertos à saída do auditório número dois da Universidade Autónoma, em Lisboa, onde apresentou o seu livro (feito a partir da tese de mestrado) com o título “Reforma do parlamento português. O controlo político do governo”. Na sala não couberam as centenas de pessoas que apareceram para o evento, com Seguro a chamar para a primeira fila os ilustres. E eram mais que muitos.

Um ex-Presidente da República (António Ramalho Eanes), um ministro da Cultura (João Soares), o presidente da Assembleia da República Eduardo Ferro Rodrigues, um ex-primeiro-ministro (Pedro Santana Lopes). Ex-líderes parlamentares, alguns dos quais trabalharam com ele na reforma do regimento do parlamento em 2007 (que deu origem à tese de mestrado), como Luís Marques Guedes (PSD), Pedro Mota Soares (CDS), António Filipe (PCP), Luís Fazenda (BE), Aguiar Branco (PSD), Nuno Magalhães (CDS). O vice-presidente do PSD Matos Correia também esteve, bem como o ex-ministro do CDS António Bagão Félix.

E com este rol extenso de convidados de diversas cores partidárias que quiseram estar ao lado do ex-líder socialista, não se pense que o cor-de-rosa faltou à chamada. Além de Ferro e João Soares, esteve Jorge Coelho, o ministro da Economia Manuel Caldeira Cabral, Guilherme d’Oliveira Martins, Severiano Teixeira, Manuel Maria Carrilho. E também todos quantos acompanharam Seguro no topo do partido, durante a sua era, caso de Alberto Martins, António Galamba, João Proença, José Luís Carneiro (hoje secretário de Estado), Jorge Seguro Sanches (também secretário de Estado), Álvaro Beleza, Eurico Brilhante Dias, Carlos Zorrinho e também Francisco Assis, um opositor assumido à solução governativa encontrada por António Costa, junto dos partidos de esquerda.

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Aliás, Assis foi até à porta, depois das declarações de Seguro aos jornalistas, para um abraço ao “amigo”. Uma cena sem leitura política, a julgar pela declarações do eurodeputado que diz manter as suas “convicções” sobre o acordo de esquerda firmado pelo PS, “mas é preciso respeitar as opções que foram feitas pela maioria” no partido. Assis colocou no congresso que se realizará em junho a oportunidade para “uma reflexão mais aprofundada”, sempre referindo que “este é o momento da responsabilidade” e que “a maioria do PS reconhece-se nesta solução”. Isto sem tirar António José Seguro da cena política: “Verdadeiramente nunca saiu da vida política.”

Só que o ex-líder separa bem as águas e rejeita por completo que o lançamento do livro signifique outra coisa além disso. “Não se pode falar em regresso à vida política, quanto muito do regresso ao espaço público, através do contributo que o livro dá para a reflexão sobre o funcionamento dos parlamentos e controlo dos poderes democráticos”. Seguro esgueirou-se das “perguntas marotas”, rejeitou “desviar para mais conversas” e trazia preparado o seu novo mantra: “sou um homem livre”, “não tenho dependências”, “faço o que me apetece”, “estou numa fase muito boa da minha vida”, “estou com a minha família, os meus filhos” e “tenho mais tempo para mim”.

E saudades? “Só de dar contributos para o país. Agora estou a dar ao nível empresarial, numa micro micro empresa, e formando alunos. São esses os contributos que dou à vida do país”. Seguro sorridente, “feliz”, no meio da multidão política (desde os mais altos cargos e velhos pesos pesados, até autarcas e dirigentes partidários), mas recusando estar de regresso à vida partidária. Depois da longa ausência, sabia bem que a questão ia aparecer. Durante a cerimónia de apresentação da sua obra, ouviu o seu editor (e ex-secretário de Estado da Cultura do governo PSD/CDS) a provocá-lo: “Não sei se tenciona voltar à vida política onde certamente terá uma geringonça à sua espera.” Seguro não reagia, ao contrário dos sorrisos na sala. Viriato Soromenho Marques também dava o seu contributo nesta matéria: “Não sei se há alguma intenção de com isto marcar o regresso à política ativa”. Aqui Seguro já sorria e ele mesmo havia de provocar um pequeno suspense quando disse que o lançamento “tinha a consequência do reencontro de amigos. Desejo que tenha mais consequências… que inspire novos trabalhos científicos”.

Da sua conclusão no livro sublinhou as vantagens trazidas pela reforma do regimento da Assembleia da República à vida parlamentar. Foi ele quem a coordenou, instituindo prazos para as respostas do governo às perguntas feitas pelo parlamento, audições periódicas dos membros dos executivos nas comissões parlamentares da especialidade e, mais visível ainda, os debates quinzenais com o primeiro-ministro. António Costa, o seu último rival no partido, classificou como “uma das invenções mais estúpidas que a Assembleia da República fez nos últimos anos”. Costa é agora primeiro-ministro de um governo sustentado num acordo de várias pernas e nunca mais falou na necessidade de alterar o que a reforma de Seguro instituiu.