O preço final do gasóleo acumulou uma subida superior a seis cêntimos por litro já depois de repercutido o aumento do imposto sobre produtos petrolíferos (ISP). Os dados mais recentes da Direção-Geral de Energia e Geologia, de 14 de março, mostram que o preço médio semanal do gasóleo estava nos 1,114 euros por litro, valor que compara com 1,047 euros por litro verificados na primeira semana em que foi sentido o impacto do aumento do imposto, em meados de fevereiro. São mais 6,7 cêntimos.

Graças a este aumento dos preços finais, em grande parte explicado pela valorização do petróleo, e segundo estes números, o Estado está agora arrecadar mais cerca de 1,2 cêntimos no IVA sobre o gasóleo, que é o combustível mais consumido em Portugal. O preço final da gasolina subiu quatro cêntimos por litro no mesmo período, o que permite aos cofres públicos arrecadarem mais 0,8 cêntimos no IVA sobre o custo deste combustível.

Este acréscimo de receita no IVA parece cumprir já os critérios definidos pelo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais para aliviar o imposto petrolífero, na medida em que dá folga para baixar o ISP em um cêntimo sem perda de receita para o Estado. 

Em entrevista ao Observador, Fernando Rocha Andrade explicou que o executivo estava disponível para baixar um cêntimo no imposto, por cada quatro cêntimos de subida dos preços, se estivesse assegurada a neutralidade fiscal, isto é, o Estado não perder receita.

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Ou seja, “se os combustíveis subirem três ou quatro cêntimos, podemos descer logo um cêntimo [no imposto] sem renunciar a qualquer receita”, exemplificou Rocha Andrade, destacando, ainda, a flexibilidade do imposto petrolífero, que permite alterar as taxas através de portaria. Foi isto que permitiu ao governo aplicar as novas taxas em fevereiro antes da entrada em vigor do Orçamento do Estado para 2016.

Já no final da semana passada, confrontado com os aumentos de preços verificados nas últimas semanas, o Ministério das Finanças esclareceu que, tendo como referência os últimos dados da Entidade Nacional para o Mercado dos Combustíveis, “não se verificam, nesta data, razões para a reavaliação do valor do ISP”.

Mas, entretanto, chegou outra semana e um novo aumento dos preços médios de venda dos combustíveis, na casa dos dois cêntimos por litro, elevando o IVA cobrado em cada litro. Segundo a DGEG, o IVA sobre o gasóleo valia 0,196 euros nos preços médios relativos a 15 de fevereiro, já considerando o efeito da subida de tributação. Os últimos dados desta quinta-feira, que reportam a 14 de março, mostram que o IVA sobre o diesel valia 0,208 euros por litro.

As contas do Ministério das Finanças para manter imposto

Confrontado com os dados mais recentes da DGEG, o Ministério das Finanças mantém que não se verificam, “nesta data, razões para a reavaliação do valor do ISP, que deverá ser enquadrada na perspetiva da neutralidade fiscal para a economia e da previsibilidade das receitas públicas”.

Já depois de publicado este artigo, o Ministério das Finanças enviou os seus cálculos com base na evolução do preço do gasóleo e da gasolina simples, segundo as quais o aumento real do preço médio ponderado, excluindo o imposto petrolífero (ISP), foi de três cêntimos no gasóleo e de um cêntimo na gasolina. Estes aumentos têm menos impacto no crescimento da cobrança do IVA pelo Estado e não dariam folga para aliviar o imposto petrolífero.

As contas do Observador têm por base o preço final médio pago pelos consumidores. Este preço apurado pela Direção Geral de Energia resulta da ponderação feita entre os combustíveis simples, mais baratos, e os outros, e incorpora o imposto petrolífero e o IVA  a 23% que, por sua vez, incide sobre todas as componentes, incluindo o ISP. O imposto sobre produtos petrolíferos é uma das principais fatias do preço de venda ao público.

As Finanças realçam ainda que o acompanhamento feito ao mercado de combustíveis tem por base os preços de referência da Entidade Nacional para Mercado dos Combustíveis, que excluem a margem de comercialização das petrolíferas do cálculo do IVA. Segundo as Finanças, este valor é apurado de forma independente e exclui a margem de comercialização, na medida em que tal depende da estratégia comercial de cada operador. 

Mas o IVA cobrado aos automobilistas cobre todas as parcelas do preço de venda , incluindo a margem de comercialização das empresas e também o próprio imposto petrolífero. Isto apesar de ser cobrado em duas fases. A primeira liquidação é feita pelas petrolíferas quando vendem o combustível. A segunda cobrança é feita sobre a margem do retalhista quando o combustível é comprado pelo automobilista. As duas parcelas são receita do Estado.

Independentemente do que faz subir os preços, quando isso acontece, a receita do IVA também cresce, como aliás é visível nos dados da DGEG sobre a cobrança média por litro. São estas as estatísticas oficiais que Portugal reporta à União Europeia para a elaboração do Oil Bulletin, documento que revela a evolução semanal dos preços antes e depois de impostos em todos os países da UE. Estes valores são semanais e calculam o preço médio dos combustíveis, a partir dos valores aplicados aos produtos simples e aos aditivados, que são mais caros. 

Uma semana chega para aliviar imposto?

Em declarações feitas no início desta semana, o secretário de Estado veio dizer que, afinal, é necessário que os preços subam 4,5 cêntimos em relação aos praticados em janeiro para o imposto descer.

“O governo diz que quaisquer variações significativas do preço dos combustíveis devem levar a uma variação do imposto. Isso ainda não se verificou, pois o preço é sensivelmente o mesmo que o do início do ano”, disse ainda Rocha Andrade na discussão do Orçamento do Estado na especialidade, perante o Parlamento. Quando será, então, possível baixar este imposto? É uma incógnita, reconheceu o secretário de Estado, que acrescentou “não conhecer o futuro”.

A recuperação recente das cotações do petróleo mostra que se mantém a tendência para a subida dos preços finais, que poderá eventualmente ser travada por uma valorização do euro face ao dólar.

O que falta perceber é quais serão os pressupostos, designadamente temporais, que o governo vai seguir para decidir quando é que a recuperação no IVA permite poder baixar o imposto petrolífero. O Observador fez a pergunta ao Ministério das Finanças, mas não obteve resposta. Fontes do setor admitem que uma semana é um período insuficiente para justificar uma mudança na fiscalidade dos combustíveis, sobretudo porque pode haver fenómenos temporários com um efeito relevante nos preços.

A reavaliação da fiscalidade sobre os combustíveis pode ser feita mensalmente, como parecem sugerir as declarações de Rocha Andrade, que remete para a média dos preços em janeiro, ou mesmo trimestralmente. E pode, também, ter em conta a evolução da receita do IVA sobre os combustíveis, para assegurar a tal neutralidade fiscal. Resta saber se a evolução do consumo não vai dar mais uma dor de cabeça às contas do executivo, que apostam numa continuação do aumento da procura.

Atualizado com as contas das Finanças à variação do preço dos combustíveis.