Mais olhos que barriga. É assim que tem sido o FC Porto de José Peseiro nos últimos jogos. E hoje não foi diferente. Entrou a pressionar alto, nunca deixou o Vitória de Setúbal tomar o gosto à bola, e mostrava-se acutilante a atacar. Mas não marcou.

E ainda tentou fazê-lo, uma e outra vez. A melhor, a que aqui importa contar, foi a tentativa de Sérgio Oliveira, logo aos 7′. Depois de assistência de Corona, Sérgio (titular pela segunda vez consecutiva na Primeira Liga) encheu o pé — o remate foi frontal à baliza, a dois passos da área e ligeiramente descaído para a direita — e obrigou Raeder a uma defesa “esvoaçante”. Uma defesa que manteve o nulo no resultado.

A chuva era cada vez mais intensa. O relvado começava a ficar “ensopado”. E quando assim é, as pernas pesam mais do que pesariam com ele seco, a bola não rola como era suporto rolar, e a qualidade ressente-se. Mas deixemo-nos de esquisitices: já assistimos a jogos bem piores (inclusivamente do FC Porto… de Lopetegui) esta época.

O Vitória de Setúbal foi começando a fechar os caminhos do FC Porto para a baliza de Raeder. E a descobrir atalhos para a de Cassilas. O primeiro remate do Vitória surgiu aos 17′. O nome de quem o fez é que vai ser um trinta e um de dizer: Maciej Makuszewski. É polaco. E ponta-de-lança. E chega.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Quanto ao remate, a defesa do FC Porto aliviou a bola para a entrada da área depois de um cruzamento, Makuszewski amorteceu-a no peito, encheu-se de força (e confiança) no pé direito, e truz! Foi só fogo-de-vista e pouco “fogo” na bota direita do Makusz… esse. O remate foi direitinho às luvas de Casillas.

A partir daqui, a técnica (que nem era tanta assim, diga-se) deu lugar à força. E como se lutou na “piscina” do Bonfim.

Aos 29′, e citando o saudoso Jorge Perestrelo, foi caso para se fizer: o que é que é isso, ó meu? Ou em “portunhol”: que pasó, hombre? Eu explico a razão (má) tradução: Herrera cruzou para a área, a bola ia redondinha para Corona, mas Maxi resolveu atacá-la também. Atrapalharam-se os dois, Ruca cortou a trouxe-mouxe, e a bola ainda ficou à mercê do uruguaio. Estava de costas para a baliza, Maxi, mas a dois passos dela. O que fez? Tentou um remate acrobático, de bicicleta. O que conseguiu? Um remate torto, que foi sair pela linha de fundo.

Oxalá Maxi tenha aprendido a não ser “lambareiro” e tirar, com isso, o pão da boca aos colegas de equipa. Quanto às acrobacias, é melhor continuar a treiná-las.

Mas se Corona e Maxi se atrapalharam mutuamente no ataque, a defesa do Vitória de Setúbal não quis ficar atrás e atrapalhou-se também. Foi aos 37′ de jogo. E foi pior a emenda que o soneto. Brahimi desmarcou Aboubakar na área, nas costas de Frederico Venâncio, mas o passe foi longo demais e Venâncio tinha o lance controlado a meias com o guarda-redes Raeder. Sim, tinha. Mas não teve.

Atrapalharam-se, nenhum atacou a bola, e esta acabou em Aboubakar. Certo é que ponta-de-lança portista, talvez surpreendido pela oferta, rematou com pouca força (dizer “pouca” é ser-se simpático para o camaronês; foi mais um passe que um remate) e o guarda-redes alemão ainda foi defender para canto.

O FC Porto chegaria ao intervalo a vencer. E marcou o 1-0 numa altura em que nem vez muito por merecer a vantagem — sim, foi melhor no primeiro quarto de hora, mas depois desacelerou muito. Sérgio Oliveira abriu a contagem mesmo, mesmo a acabar, aos 45′. Maxi combinou com Corona na direita, avançou por ela fora e cruzou para a área. Um cruzamento para trás e não para a molhada. Surgiu lá Brahimi a rematar, mas o argelino o melhor que conseguiu foi acertar… em cheio na tal molhada. Valeu ao FC Porto que a bola resvalou para a entrada da área, onde estava Sérgio Oliveira prontinho a encher o pé. Sem oposição, rematou forte e rasteiro, sem hipótese de defesa para Raeder.

Manuel Mota apitou para o intervalo logo depois.

O FC Porto voltou do intervalo. E o Vitória também. O futebol de ambos nem por isso. Nas bancadas, resistiam dois ou três “gatos-pingados”. Resistiam, porque não há quem suporte tanto marasmo. E pingados estavam de facto, pois a chuva deu lugar a um verdadeiro dilúvio no Bonfim.

Um remate que valha a pena contar, só aos 65′. De mexicano para mexicano, Layún cruzou à esquerda, encontrou Corona no segundo poste, e este despachou Ruca com o pé direito para rematar, em seguida, de canhota. Acertou na baliza, mas pelo lado de fora das redes de Raeder.

Hassan Nader. Lembra-se dele? É marroquino, nasceu em Casablanca, mas a casa dele sempre foi o estádio S. Luís, em Faro. Hassan chegou mesmo a jogar no Benfica e, enquanto ponta-de-lança do Farense, até “molhou a sopa” contra o FC Porto. O filho, Mohcine Hassan, seguiu os passos do pai: é futebolista. E até terrenos que o pai pisava, Mohcine pisa também: é avançado. Entrou aos 67′. E nem um minuto depois deu-se a ver.

E o que se viu foi que Mohcine não tem o faro que o pai, Hassan, teve em Faro. O miúdo desmarcou-se na esquerda, acelerou como se não houvesse amanhã, mas, chegado à área e só com Maxi pela frente, não cruzou nem rematou. Saiu qualquer coisa frouxa e sem direção da sua canhota. A genética às vezes não é tudo. Mas Mohcine também só tem 21 anos e 10 jogos na Primeira Liga — e um golo: marcou à Académica, em janeiro.

Futebol? Poucochinho. Mas a partir dos 85′ a coisa animou.

E começou tudo com Brahimi. Cabecear não é com o argelino; ele é mais dribles. Sérgio Oliveira cruzou da direita para o centro da área, Brahimi estava sozinho, mas o melhor que conseguiu, atrapalhadamente, foi “cabecear” a meio com as coisas e a nuca. Raeder agradeceu o jeito. Ou a falta dele.

Depois, aos 87′, novamente Mohcine Hassan. E não é que ele afinal tem a pinta toda do pai, Hassan Nader? Desmarcou-se, a passe de Arnold, nas costas de Martins Indi, e mal recebeu a bola, chutou-a. Um remate cruzado, forte e rente à relva. Cassilas só teve tempo de defender para canto, com o que estava mais à mão: os pés.

A terminar, José Peseiro ficou com o coração na boca. O jogo estava completamente partido. E o Vitória começou a acreditar que o empate estava à mão de semear. Até porque o FC Porto não aproveitava as ocasiões que tinha. A melhor foi a de Herrara, aos 91′. Que golaço que era. Maxi lançou a bola para o médio mexicano, desde a lateral, Herrera amorteceu-a no peito e rematou, sem que esta caísse no relvado, de trivela. Um remate que procurou o canto superior esquerdo da baliza de Raeder, aquele cantinho onde dorme a coruja. Não a acordou, Herrera. Por pouco.

Por fim, e com Manuel Mota quase, quase a apitar para o fim do jogo, Fábio Pacheco teve nos pés a melhor ocasião de golo do Vitória em todo o jogo. Na área, e conta toda a gente dentro dela, Vasco Costa rematou cruzado para defesa apertada de Casillas. Ou meia-defesa. A verdade é que a bola ficou à frente do espanhol, ninguém a cortou, e Pacheco só tinha que encostar para o empate. Conseguiu — nem ele saberá como — fazer a bola sair por cima da barra.

Prii, priii, priiiiiii! Acabou. E o FC Porto, mesmo que provisoriamente, está a três pontos do Benfica — o Sporting está a quatro e não há nada de provisório nisso. Mas é caso para dizer que há um caso (não tão estranho assim; os resquícios de Lopetegui não vão com a chuva desta noite e de outras) de Dr. Jekyll e Mr. Hyde no Dragão. Sérgio Oliveira foi o único Jekyll no Bonfim. Hyde foram mais que muitos: Brahimi, Aboubakar, Corona…