No piso de baixo há pregos gourmet, bolos do caco, gins tónicos e tudo o que se espera de um mercado da moda onde é difícil arranjar mesa – mais ainda com um tabuleiro de comida na mão. No piso de cima, o Estúdio Time Out vai funcionando como sala de ensaio para bandas e alguns privilegiados podem assistir a concertos ao lado de meia dúzia de pessoas, num lugar onde não faltaria espaço para um jogo de futebol.

Ou para jogar à sirumba, já que vamos entrar por aí. O novo álbum dos Linda Martini, “Sirumba” — “um jogo de miúdos e uma referência partilhada”, explica a banda — está nas lojas esta sexta feira, 1 de abril, e serve de pretexto para dois dias de ensaios gerais para a apresentação do disco no Coliseu de Lisboa no sábado, 2 de Abril.

“Normalmente costumamos ensaiar no Haus, um estúdio novo. Temos uma sala nossa, outra é dos You Can’t Win Charlie Brown e a outra é alugada à hora”, esclarece o guitarrista Pedro Geraldes. “Foi lá que gravámos o disco e o compusemos.” Estúdio novo vida nova, podemos dizer, principalmente depois de ouvir “Sirumba”, a surgir três anos depois do último “Turbo Lento”.

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Hélio Morais, Pedro Geraldes, Cláudia Guerreiro e André Henriques

“A outra sala onde estávamos era partilhada”, continua o vocalista e guitarrista André Henriques. “Este ano estamos mais focados na música do que em outras coisas da nossa vida profissional e temos mais tempo. Tentamos sempre fazer coisas diferentes de disco para disco, mas quando tens pouco tempo, que era o que acontecia no passado, quando ensaiávamos uma vez por semana e ao final do dia, acabávamos por ir primeiro à nossa zona de conforto. Só depois, com tempo, consegues coisas diferentes e acho que a chave do disco foi essa. Caímos no nosso caldeirão e demos o salto para fora.”

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Quem já conhece os outros álbuns (como “Olhos de Mongol”, de 2006, ou “Casa Ocupada”, de 2010) e ouvir “Unicórnio de Sta. Engrácia”, o primeiro single, lançado logo no início de março, pode aperceber-se dessa diferença. “[Escolhemos esse single] por ser diferente”, confirma André.

Tínhamos a sensação de que estávamos a fazer uma coisa diferente e que desta vez seria mais notório. Tínhamos outras [canções] que achávamos que seriam valores mais seguros ou mais facilmente identificáveis com aquilo que as pessoas esperam de nós, como ‘Putos Bons’, que tem muita coisa mais familiar, mas o ‘Unicórnio’ tinha outra ginga.”

Uma outra ginga que não foi fácil de conseguir. Aliás, foi quase tão difícil como apanhar um unicórnio ou prever o fim das obras de Santa Engrácia, daí a escolha do nome. “Normalmente damos nomes provisórios às músicas que depois vão caindo quando as letras aparecem. Neste caso foi um bocado ao contrário”, conta André. “Tínhamos o riff inicial e não conseguíamos sair dali. Tentámos 30, 40 vezes, havia umas ideias giras mas parecia que nada era tão bom como aquele primeiro riff e então por piada começámos a chamar isso à música.”

O outro lado

No fim de março a banda disponibilizou o álbum no Spotify para irmos treinando as letras para o concerto e o que podemos ouvir são uns “Linda Martini de cara lavada”, diz o próprio vocalista. “A ideia foi essa, ‘vamos aparecer de cara lavada, vamos mostrar um lado diferente’ e quisemos que o single fosse um bocado espelho disso. Claro que uma música não faz um disco e há muitas outras camadas e ambientes.”

A digressão da banda da qual também fazem parte Hélio Morais (bateria) e Cláudia Guerreiro (baixo) começa no Coliseu de Lisboa e prolonga-se por várias salas do país, com uma passagem pelo Primavera Sound do Porto no início de Junho. Claro que o concerto do Coliseu, e por ser uma estreia, tem outro peso.

A cena já está a ser pensada desde novembro. Estamos preocupados em tocar o disco e essa ideia já vem de tão de trás que agora não sentimos esse peso. Mas se calhar quando lá estivermos…”

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Para o concerto no Coliseu, a banda tem ensaiado no estúdio Time Out, Mercado da Ribeira, em Lisboa

Entre considerações sobre como “fazem falta salas médias em Portugal” – “só há salas grandes ou salas pequenas”, diz Cláudia – a banda lá se vai lembrando dos concertos mais míticos a que assistiu no Coliseu. “Sonic Youth, em 2003”, continua a baixista. “Houve um momento maravilhoso, quando o Lee Ranaldo estava a curtir bué a tocar e de repente olha e tem o cabo desligado”, ri-se. “Discretamente liga o cabo, que é uma coisa que acontece com frequência. Mas quando vês a acontecer aos outros é muito mais giro do que quando te acontece a ti.”

Para Pedro foi o de Beth Gibbons com Rustin’ Man, “depois da época de Portishead”. “Vi do camarote”, recorda. André lembra-se de The Mars Volta, em 2012 e Hélio, o último a responder e já por mensagem, destaca The Dillinger Escape Plan e Grizzly Bear, esse último “incrível”. “Luz, som, tudo”. Agora é a vez deles.

Linda Martini no Coliseu dos Recreios, apresentação de “Sirumba”: sábado, 2 de abril, 21h30. Bilhetes a 12 euros.