Unaoil: A empresa que subornou o mundo“. Uma investigação da agência australiana Fairfax Media e do The Huffington Post mostrou como a indústria petrolífera mundial há várias décadas está embrulhada numa rede complexa de corrupção e subornos, envolvendo gigantes empresariais dos EUA, Ásia, Austrália e Europa. Um vasto arquivo de e-mails e documentos confidenciais viu a luz do dia graças a esta investigação jornalística e evidenciou a escala global do escândalo. Um escândalo que no centro tinha uma pequena empresa gerida por destacados membros do jet set do Mónaco: a Unaoil – que foi esta semana alvo de buscas.

Milhares de milhões de dólares em contratos públicos foram adjudicados graças a luvas distribuídas em nome de empresas como a britânica Rolls-Royce, a norte-americana Halliburton (ligada ao ex-vice-Presidente americano Dick Cheney), a australiana Leighton Holdings e, também, as gigantes coreanas Samsung e Hyundai.

Esta é a conclusão de uma investigação de seis meses que começou com um anúncio codificado num jornal francês. Era um código para combinar os encontros clandestinos em que os subornos eram feitos. A Unaoil “corrompeu sistematicamente a indústria petrolífera global“, escreveram a Fairfax Media e o The Huffington Post – uma acusação que o presidente da empresa, Ata Ahsani, desmente “absolutamente”.

Ahsani-Ata

Ata Ahsani desmente “absolutamente” as revelações da imprensa.

Os milhares de e-mails escrutinados pela investigação jornalística, datados entre 2002 e 2012, demonstram que a Unaoil participou no pagamento de subornos a ministros do Petróleo de vários países do Médio Oriente e outros responsáveis políticos. Esses subornos serviam para garantir contratos públicos em países como o Cazaquistão, a Líbia e o Iraque. Os e-mails revelam que executivos da Halliburton e da sua antiga subsidiária Kellogg, Brown & Root, tinham conhecimento dos subornos que eram feitos. Petrolíferas do Texas (EUA), de Singapura, Noruega e Turquia também foram “apanhadas”.

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Uma das empresas envolvidas no escândalo é a petrolífera Honeywell que, segundo a investigação, permitiu que se escondessem os subornos em contratos fraudulentos no Iraque. O mesmo acontecia com a australiana Leighton Offshore.

Entre as várias empresas envolvidas no escândalo — que vai muito além do setor petrolífero –, pode admitir-se que algumas faziam os pagamentos à Unaoil no âmbito de um serviço legítimo de lóbi, ao passo que outras mostravam que tinham perfeita noção do que se passava. Outros, como alguns responsáveis da espanhola Tecnicas Reunidas, terão, mesmo, também, recebido dinheiros.

A Rolls-Royce, produtora de carros de luxo, terá negociado uma comissão mensal para partilhar informação confidencial da empresa, dizem a Fairfax Media e do The Huffington Post.

ahsani

A família Ahsani é bem conhecida do “jet set” do Mónaco.

Através de empresas controladas pelos Ahsani, com sede em paraísos fiscais como as Ilhas Virgens e as Ilhas Marshall, eram assinados contratos de consultoria entre a Unaoil com as empresas energéticas. Depois, as equipas da Unaoil partiam em busca de contratos com empresas públicas em vários países de África e Médio Oriente.

Segundo a investigação, essas empresas controladas pela Unaoil recebiam uma comissão por cada negócio obtido – o que podia levar anos. A comissão era uma percentagem do valor total do contrato que era transferida para os executivos da Unaoil. E havia “sub-agentes” que ajudavam na obtenção do contrato e que também recebiam dinheiros – trata-se de responsáveis políticos e empresários que, em algumas situações, entregavam à Unaoil informação confidencial sobre as respetivas empresas, as empresas que, depois, entregavam os contratos aos clientes da Unaoil.

Os jornalistas encontraram e-mails de resposta vindos de Cyrus Ahsani, um dos filhos, em que este respondia rapidamente a qualquer e-mail que contivesse provas do suborno com respostas como “deve ter enviado este e-mail para a pessoa errada”. Cyrus Ahsani é um dos dois filhos que gerem a empresa com o pai, Ata, de forma muito cuidadosa.

cyrus

Antes de publicar a investigação, os dois órgãos contactaram a Unaoil – a empresa não negou a veracidade dos e-mails mas fez acompanhar a sua resposta de uma nota da sua equipa jurídica a recomendar que o artigo não fosse publicado. A empresa já se manifestou, contudo, disponível para colaborar com os investigadores.

E essa colaboração já começou, porque houve buscas em instalações da Unaoil esta semana, ao abrigo da convenção europeia de entreajuda em investigações de crime organizado internacional. “As buscas e entrevistas foram conduzidas na presença de autoridades britânicas, no âmbito de um escândalo vasto e internacional, implicando numerosas empresas petrolíferas estrangeiras. A informação recolhida será examinada pelas autoridades britânicas no âmbito da sua investigação”, afirmou uma porta-voz do gabinete britânico de investigação de fraudes graves.

O Federal Bureau of Investigation (FBI) e o Departamento de Justiça norte-americanos também já estão a investigar.