O cardeal-patriarca de Lisboa realçou esta sexta-feira que o tema central da exortação papal “Amoris Laetitia” “é a família, no sentido cristão”, à qual o pontífice se refere de forma alargada como “a grande escola”.
Manuel Clemente falou aos jornalistas no Patriarcado, tendo afirmado que só na quinta-feira à noite teve conhecimento da exortação “Amoris Laetitia” (“A alegria no amor”), esta sexta-feira divulgada, sobre a qual se debruçou “quatro a cinco horas”, mas sublinhou que o documento “vai exigir muita aplicação pastoral” e salientou que “o papa não quer adiantar novidades”.
A exortação “A alegria no amor” foi esta sexta-feira de manhã tornada pública pelo papa, tem como base os dois sínodos realizados nos outonos de 2014 e 2015, em Roma, nos quais participou Manuel Clemente.
No documento “há uma lógica de integração [na Igreja] de todos os que são batizados”, mas referiu que “as problemáticas relacionadas com os divorciados ou recasados, e até a atitude com as pessoas com tendências homossexuais, não foram nem de perto, nem de longe, as que ocuparam a maior parte da reflexão sinodal”, e isso reflete-se no documento pontifical, disse o eclesiástico.
O cardeal-patriarca afirmou que todos os batizados têm lugar na Igreja, onde podem desempenhar diferentes serviços, mas o papa não refere a questão do sacramento, isto é a possibilidade de um divorciado voltar a casar catolicamente ou de comungar.
“No que diz respeito à doutrina propriamente dita, a normatividade, [a exortação pontifícia] não tem novidade nenhuma” relativamente ao que já tinham escrito os papas João Paulo II e Bento XI, respetivamente, a “Familiaris Consortio” e a “Sacramentum Caritatis”.
“Visto no seu todo, este documento do papa, o que nos diz, em primeiro lugar, [é] a verificação e a insistência, na centralidade da família na sociedade em geral, como a base de vinculação de uma sociedade que o seja; de um mundo acompanhado”, afirmou o prelado lisboeta.
“Depois, dentro de uma tradição católica e bíblica, que é a do papa, salientar que o batismo nos põe numa comunidade de batizados, que nós somos, embora a vida sacramental, essa sim possa ser interrompida”, nomeadamente “no vínculo matrimonial”, o que “não significa que a pessoa fique fora da Igreja como batizada que é, tem lá pertença e cidadania completa”, realçou.
Todavia, “a prudência e discernimento cauteloso” são “fundamentais para evitar o grave risco de mensagens equivocadas, como a ideia de que algum sacerdote pode conceder rapidamente exceções, ou que há pessoas que podem obter alguns privilégios sacramentais em troca de favores”, disse Manuel Clemente, citando o documento, e referindo que “o papa é muito terra-a-terra e muito prático”, ao sublinhar esta questão que se coloca a cada sacerdote na sua comunidade.
O cardeal-patriarca indicou que “são todas situações muito complexas e todas têm protagonismo pessoal, e a pessoas merecem-nos, todas, respeito”.
Por outro lado, “em termos cristãos, nós não podemos deixar de dizer o que temos para propor e, na medida do possível, alcançar, e sempre que pudermos transmitir, [que] é aquilo que a Bíblia em geral, e Jesus Cristo nos diz sobre a proposta da família”.
Quanto “às pessoas com tendência homossexual”, este novo documento não traz novidades, tendo Manuel Clemente, neste âmbito, remetido para os dois primeiros pontos do Catecismo da Igreja Católica, “ou seja, o respeito, e não condescendência”, para com essas pessoas “mas o não-acolhimento dos atos”.
Os homossexuais “podem ser católicos e seguir os ensinamentos de Cristo, mas controlam essa tendência”, disse, realçando que não devem ser alvo de discriminação enquanto pessoas. “Mas em termos cristãos não a acompanhamos”, rematou.
Manuel Clemente ressalvou que esta foi uma primeira apresentação do documento “que tem de ser lido e relido muito mais vezes”.