Esperar. Rui Vitória teve quase três anos para ver como Pep Guardiola põe o Bayern e jogar. Teve até hora e meia em Munique para, com os próprios olhos, ver como um dos problemas do futebol é haver apenas uma bola em campo e nesse relvado está uma equipa que joga como o catalão lhe manda. Por isso, o treinador do Benfica sabia que os seus tinham de esperar. Serem pacientes, abdicarem da inveja de ter menos de bola, verem o que os alemães faziam para só depois decidirem o que iriam fazer de forma rápida. A paciência era a virtude que os encarnados precisavam para o truque da espera dar resultado.
Mas esperem, porque em torno de uma virtude têm sempre que estar outras coisas. Como a concentração e o discernimento para perceber que estava na posição errada que Renato Sanches não teve. O médio tinha acabado de correr para a esquerda, mais um auxílio para ajudar Eliseu, onde viu de perto Douglas Costa a receber a bola mais ao centro para vagar os metros de relva por onde Philip Lahm aparecia a correr. O extremo desmarcava-se para o centro e o lateral arrancava para fazer de extremo, terceira vez que ambos faziam isto no jogo. Mas Renato ficou à espera do que a jogava dava, parado, e viu como o cruzamento de Lahm foi socado por Ederson, para a entrada da área.
O sítio onde Renato devia estar foi onde Arturo Vidal apareceu a rematar de primeira o ressalto. A espera impávida do médio foi uma das razões para o Bayern empatar na Luz e, ao fim de 38 minutos, começar a cortar a esperança aos encarnados. Até ali, a equipa obedeceu a Rui Vitória e esperou. O mesmo Renato manteve-se fiel a Fejsa, fez parecer que andava ligado ao sérvio por um cordel, enquanto ambos ficavam perto da defesa e encurtavam os espaços ao Bayern. Pizzi esperava até que a bola se aproximasse de Xabi Alonso, espanhol que dá notícia quando falha um passe mas que era o mais lento a reagir e a mexer-se com bola. Os alemães não estavam confortáveis porque dominavam a bola sem fazerem o que queria com ela.
E o Benfica esperava.
E esperou até ter uma hipótese de roubar um alemão e conseguir, o mais rápido possível, tirar a bola do local do roubo e levá-la ao lado contrário. Eliseu estava no carro de fuga e deu boleia à bola, pela esquerda, até a cruzar para o espaço que havia entre os centrais do Bayern e Manuel Neuer. O guarda-redes reagiu tarde e a fuga do assalto concretizou-se: Raúl Jiménez esticou-se e chegou com a cabeça à bola. O Benfica esperava e alcançava o Bayern na eliminatória, aos 27’. Três minutos depois, a única jogada em que Salvio ganhou espaço perto da linha deu ao mexicano o cruzamento que apenas rematou ao segundo toque. Neuer defendeu, o Bayern assustava-se.
Os alemães aceleraram. Antes e depois de Vidal voltar a marcar ao Benfica, o chileno ameaçou. Ao cabeceamento frouxo com que fez a bola chegar a Ederson seguiu-se o disparo de pé esquerdo que fechou a primeira parte. Os encarnados tinham 45 minutos para marcar dois golos à equipa que apenas sofrera nove em nove jogos na Liga dos Campeões. Passou a haver mais pressa, menos tempo para esperar.
E o Benfica não esperou.
A equipa continuava a tentar defender longe da área, só que os médios iam-se afastando dos defesas e quem atacava demorava a correr para trás, para junto dos médios. Os jogadores quiseram ir atrás dos adversários e deram aos alemães o que eles queriam: pressão. Porque quem tem melhores jogadores e quer atrair os outros para o sítio onde tem a bola está habituado a livrar-se disto. Thiago Alcântara, Vidal, Lahm e Alaba trocavam muitos passes para depois precisarem de poucos para fazerem a bola chegar a Ribéry ou Douglas Costa. O francês rematou duas vezes e o brasileiro disparou uma bola contra o poste, numa altura em que os encarnados já não podiam mesmo esperar.
Porque Xabi Alonso adormeceu-os antes de bater um canto com o passo lento e demorado com que caminhou até lá. A bola caiu ao segundo poste, Javi Martínez chegou-lhe sem problemas com a cabeça e passou-a para a pequena área, onde atrás de Thomas Müller ainda estava outros dois jogadores do Bayern, sozinhos.
O alemão marcou e o Benfica deixou de esperar pelo que fosse. Arriscou, foi pressionar à frente, pôs-se bem a jeito de contra-ataques. Mas recuperava mais bolas, como a que sobrou para Gonçalo Guedes correr, desde a linha do meio campo, e só parar à beira da área com uma rasteira de Javi Martínez. Ainda Rui Vitória se ajeitava na bancada, expulso por ver um vermelho no cartão amarelo que o árbitro mostrou ao espanhol, quando Anderson Talisca marcava o livre que deixou Neuer sem hipótese de tocar na bola. Agora ficava fora de questão esperar pelo que fosse.
E o Benfica não esperou e foi atrás dos Müllers, dos Lewandowskis, dos Thiagos e dos Lahms com Carcela, Gonçalo Guedes, Talica, Jiménez e Jovic, o sérvio que se estreou pela equipa. Ainda fez três remates à baliza alemã e os últimos apitos do árbitro não se ouviram porque os adeptos acabaram a saudar com gritos o esforço que viam os encarnados a fazerem. Rui Vitória ficou “triste com o resultado, mas feliz com a postura” que o Benfica teve ao cair pela quarta vez nos quartos-de-final da Liga dos Campeões, enquanto o Bayern de Munique seguia, pela quinta época seguida, para as meias-finais. O elogio para os encarnados será escrever que pareceu sempre possível os muito bons eliminarem os melhores. Mas não chegou ficar à espera do que eles faziam.