O Bloco de Esquerda tem expectativas de ver a solução escolhida por António Costa para a banca inscrita no Programa de Estabilidade, sabe o Observador. O documento, que tem de ser enviado para Bruxelas até 30 de abril, compromete o Governo com os valores do défice orçamental e da dívida pública para os próximos quatro anos, por isso, é bom que inclua todos os riscos – e eventuais impactos – que as instituições financeiras venham a colocar aos cofres do Estado.

A pressão sobre o Governo socialista vai aumentar: para os bloquistas, apresentar já no Programa de Estabilidade a solução para a banca faz todo o sentido. Os riscos que as instituições financeiras colocam às contas públicas são considerados elevados já que, se não for encontrada uma forma de recuperar os ativos maus dos bancos, haverá um buraco a pagar, defendeu uma fonte bloquista ao Observador. E os bloquistas não querem compactuar com modelos que voltem a passar a fatura aos contribuintes.

Por enquanto, BE, PCP e Verdes desconhecem as medidas concretas do Programa de Estabilidade. O Executivo ainda não mostrou quase nada do documento aos seus parceiros no Parlamento, a não ser dados de contexto e algumas previsões macroeconómicas.

Do mesmo modo, no que toca à solução para a banca, as intenções do Governo são ainda obscuras para os bloquistas. Há alguma informação sobre o modelo italiano – uma espécie de fundo de salvaguarda criado com dinheiro do próprio sistema financeiro, para ajudar os bancos a reforçar capitais ou a desfazerem-se de ativos problemáticos – mas nada de muito concreto.

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Governo arrisca desiludir BE

O problema é que dificilmente o Governo vai satisfazer os seus parceiros parlamentares. Dentro do Ministério das Finanças reconhece-se que se a solução para a banca tiver impacto nos cofres públicos, deve vir já incluída e refletida no Programa de Estabilidade.

Contudo, a elaboração do Programa de Estabilidade está já em velocidade de cruzeiro, sem atrasos, e dificilmente vai poder esperar pela decisão de António Costa em relação aos bancos. Fonte do Executivo diz ao Observador que “não há nada fechado sobre o veículo” para resolver o problema dos ativos tóxicos da banca e responde negativamente quando confrontado com a possibilidade de a solução aparecer já incluída no documento a enviar a Bruxelas.

Ao que o Observador apurou, o Governo deverá esperar pela notificação oficial do Eurostat sobre o défice orçamental de 2015, agendada para 21 de abril, para entregar o documento na Assembleia da República. Mas deverá fazê-lo logo de seguida, até porque os dados de execução orçamental sobre o primeiro trimestre serão conhecidos a 26 de abril e o debate sobre o Programa de Estabilidade está agendado para o plenário do dia seguinte, 27 de abril.

Pressão sobe já esta sexta-feira

Catarina Martins deverá confrontar esta sexta-feira o primeiro-ministro com a questão sobre o Programa de Estabilidade e a banca, no debate quinzenal no Parlamento, onde pretende deixar já os seus “critérios políticos sobre o que deve ser o dispositivo” em Portugal.

Confrontada com os tempos difíceis que ainda estão para vir, de que o ministro das Finanças falou na reunião com o BE, Catarina Martins diz que “Portugal não está a viver uma situação fácil”. Em declarações à SIC-Notícias esta quinta-feira, a coordenadora do Bloco avisou, no entanto, que Portugal está a viver já restrições orçamentais. Se são restrições orçamentais para salvar a banca, talvez seja má ideia. Temos feito assim até agora sem ter grande resultado”, rematou.

A deputada não rejeita a solução de que António Costa falou no último fim de semana, em entrevista à TSF e ao Diário de Notícias. Mas não passa um cheque em branco:

Pode ser [uma solução] é preciso perceber como. É preciso que os acionistas assumam as perdas pelo que fizeram, é preciso que as regras mudem para que não volte a acontecer e é preciso que os bancos não sejam limpos com dinheiro público para que os privados lucrem e continuem a agir da mesma forma”.

Para Catarina Martins, a “experiência dos bancos maus tem pesado muito no erário publico e não têm tido nada de interesse público”, rejeitando a solução espanhola para estabilizar o sistema financeiro precisamente por ter trazido uma “fatura muito pesada” para as contas públicas espanholas, “até do ponto de vista social”, disse. “Pode existir um veículo, mas isso tem de ser feito sem pesar o erário público”, definiu.

Esta sexta-feira, o Bloco de Esquerda promove também um colóquio cujo enunciado sugere a posição do partido nesta matéria: “Outro banco mau?”. Não, muito obrigado, parecem dizer os bloquistas. O parceiro parlamentar do PS prepara-se assim para marcar uma posição política dentro da “geringonça” e avisar os socialistas de que não está disposto a embarcar em soluções a qualquer custo.

No Esquerda.net, órgão de comunicação oficial do partido, os bloquistas fazem essa relação: António Costa defendeu a constituição em Portugal de um “banco mau”; Carlos Costa, de quem o Bloco se tornou muito crítico, também o fez; Marcelo Rebelo de Sousa e os dirigentes das confederações patronais idem. Mas é preciso lembrar que a “criação de um ‘banco mau’” é “um caminho que já foi posto em prática em Espanha (em 2012) e também na Irlanda”.

O colóquio organizado pelo Bloco vai contar com as intervenções de Ricardo Cabral economista — vice-reitor da Universidade da Madeira e um dos convidados do Bloco de Esquerda para o grupo de trabalho criado para discutir a sustentabilidade da dívida pública –, Bruno Estrada, economista espanhol e diretor de estudos da Fundação das Comisiones Obreras, e de Catarina Martins.