Luís Marques Mendes aproveitou o seu comentário semanal, no Jornal da Noite da SIC, para dizer que ainda não há negociações entre o CaixaBank e Isabel dos Santos, como afirmou o ministro da Economia. O social-democrata aproveitou o tempo de antena para comentar o Programa de Estabilidade, o Plano B e a Presidência de Marcelo.

A venda do BPI continua na ordem do dia, mas Marques Mendes acredita que as negociações chegarão a bom porto e estão para breve. “Acho que não vamos ter muitas retaliações, vamos ter mais ameaças de concretizações e a minha convicção é que, mais dia, menos dia, vamos ter um acordo.”

O comentador afirmou também que não há ainda negociações em curso, mas pelo que conseguiu apurar, dentro de poucas semanas as negociações vão ser retomadas. “O ministro da Economia português, Caldeira Cabral, veio dizer, ontem [sábado], que já há negociações novamente entre o CaixaBank e Isabel dos Santos. Ao que eu apurei, isso não é verdade. Portanto, aqui o ministro precipitou-se.”

Depois de Portugal ter dado mais poder à banca espanhola, o Governo angolano ameaçou que iria criar um decreto que, caso o BPI passe para as mãos dos espanhóis, este banco tenha menos influência no Banco de Fomento Angola (BFA). Luís Marques Mendes confirmou que esse documento está em estudo, mas não está aprovado, “vai ser uma espécie de ameaça”. Se as negociações chegarem a bom porto, não há decreto. A ideia é reforçar a posição negocial de Isabel dos Santos.

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Marques Mendes acredita num acordo “porque é do interesse de todos e quando é do interesse de todos é do bom senso”. Os espanhóis não querem mandar no BPI sem conseguirem uma posição forte em Angola e Isabel dos Santos não quer cortar relações com Portugal, porque o capital angolano não está bem visto noutros países.

O Programa de Estabilidade é ambicioso, mas tem objetivos irrealistas

O comentador da SIC classifica o Programa de Estabilidade de ambicioso nos objetivos, em particular ambicioso na redução do défice durante os próximos quatro anos. Objetivos que Marques Mendes classifica de “muito parecidos com os que o Governo anterior apresentou”. “O caminho para lá chegar é que é diferente, mas também é diferente as previsões de crescimento económico, eu acho que aí não são ambiciosas, são irrealistas.”

E Marques Mendes justifica o comentário, porque não há nenhuma organização nacional ou internacional que aponte para um crescimento de 1,8%, “o que significa que provavelmente aí Bruxelas vai torcer o nariz”.

Mas António Costa é habilidoso, como referiu o comentador várias vezes. Piscando o olho a Bruxelas, enquanto mantém os partidos de esquerda na mão.

“António Costa foi pragmático. Ele quer agradar a Bruxelas e às agências de rating. Como é que agrada? Sobretudo com objetivos de redução do défice.” Por isso é que disse que o défice iria baixar de 2,2 para 1,4%, mas ninguém sabe como, referiu Marques Mendes. O que importa é que Bruxelas fique satisfeita. “Quanto às outras partes, Bruxelas provavelmente vai pedir correções, e ele naturalmente corrige.”

O Tratado Orçamental mostra, na opinião de Marques Mendes, a grande habilidade do primeiro-ministro, que foi “ter o PCP e o Bloco de Esquerda no bolso”. “Criticam por um lado, mas engolem por outro.” A habilidade de António Costa nesta matéria é que os deixa falar e criticar, mas de alguma forma obriga-os a apoiarem.

“Deve ser um certo embaraço, um certo incómodo, para o PCP e Bloco de Esquerda. Sempre defenderam menos austeridade – a austeridade aqui continua -, sempre defenderam que a prioridade não era a redução do défice – aqui dá-se a prioridade à redução do défice -, que não devia haver cortes na administração pública – pois bem, há. É tudo exatamente o contrário do que o PCP e o Bloco de Esquerda apresentaram.”

“António Costa faz aqui a quadratura do círculo que é: [primeiro] objetivos ambiciosos no défice para agradar a Bruxelas; segundo, não toca nas medidas do acordo para não colocar em causa a sua base parlamentar; e em terceiro lugar, obriga o PCP e o Bloco de Esquerda a falarem, mas a terem que engolir toda essa matéria.”

Este momento tem também um pouco de incómodo para a oposição, para o PSD e CDS, que não podem realmente discordar dos objetivos, como a redução do défice, porque as diferenças não são assim tão significativas. “E por isso é que PSD e CDS não estão muito ativos na contestação a este documento [Tratado Orçamental]. Estão a tentar desvalorizá-lo.”

Luís Marques Mendes concorda que limitar a despesa do Estado é uma melhor opção do que dar prioridade à redução do défice estrutural. Por um lado, porque todos os cidadãos conseguem perceber o que se entende por limitar a despesa do Estado, mas nem todos perceberão o que é a redução do défice estrutural. Por outro, é bom do ponto de vista do cidadão, porque se se limita a despesa do Estado cria-se condições para baixar os impostos. “E é mais exigente do ponto de vista dos Governos, porque os Governos para reduzirem o défice gostam sempre mais daquilo que é mais fácil, mas que é pior para as pessoas, aumentar impostos e não cortar na despesa do Estado.”

As referências à habilidade e pragmatismo de António Costa continuam – diz uma coisa e faz outra -, mas agora em relação ao Plano B. O Governo e o ministro da Economia continuam a dizer que não haverá Plano B, mas já esta semana foram tomadas medidas desse plano, referiu o social-democrata.

“Eu tenho para mim que os governantes negam sempre a realidade até ao momento que têm de se confrontar com ela e tomar decisões”, disse Marques Mendes. “Não tenha dúvidas de uma coisa, se houver um buraco e estes 350 milhões de cativação de despesa não forem suficientes, ele vai tomar outras medidas porque Bruxelas impõe. E uma coisa é certa, António Costa nunca vai comprar uma guerra com Bruxelas.”

A Presidência de Marcelo é semelhante à de Mário Soares

“Marcelo Rebelo de Sousa está a fazer uma Presidência que eu acho que é muito parecida com a primeira de Mário Soares, há 30 anos”, afirmou o comentador esta noite.

A Presidência atual, com esta espécie de Presidência Aberta, é “uma cópia” da de Mário Soares. Até obrigou o primeiro-ministro a ir ao Alentejo para a reunião semanal – “isto já não se fazia desde Mário Soares” -, disse Marques Mendes.

Outra semelhança é ter escolhido o Alentejo, o local onde terá reunido menos votos, assim como Mário Soares escolheu o Minho, para ganhar a confiança do eleitorado. A Presidência de Marcelo consegue, ainda assim, ser “mais interventiva e com mais iniciativa”.

O Presidente Marcelo é muito popular, muito próximo das pessoas, muito informal, muito pouco protocolar – tira selfies com qualquer pessoa -, mas ao mesmo tempo interventivo e a acumular poder. “E o poder num Presidente da República é a autoridade para quando um dia tomar decisões.”

Corrigido a 2 de maio: “as negociações chegarão a bom porto”