O Governo enviou para Bruxelas uma lista a dizer onde pretende ir buscar mais de 2000 milhões de euros para reduzir o défice ao longo dos próximos quatro anos e diz que, mesmo com a saída de funcionários públicos que promoverá até ao final da legislatura, a fatura com salários do Estado volta a aumentar já em 2018. A receita para baixar o défice é a do costume: quase 2,5 mil milhões de euros em poupanças, não especificadas, em juros e consumos intermédios.

O Executivo enviou uma tabela à Comissão Europeia, ao Conselho das Finanças Públicas e à Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) a explicar – mas pouco – onde irá buscar a redução do défice dos próximos quatro anos. Depois de alguma polémica no Parlamento sobre o tema, o primeiro-ministro decidiu distribuir a tabela aos deputados, mas as explicações não são muitas.

Entre os números nessa tabela é possível perceber que o Governo promete um saldo líquido de 2.010 milhões de euros de consolidação adicional até 2020, sendo que 2019, ano em que termina a legislatura, é suposto ser o ano de maior contenção, com 706 milhões de euros de contenção previstos para esse ano. Ou seja, já depois dos acréscimos de despesa que prevê fazer – como com a reposição salarial e a eliminação da sobretaxa – o Governo ainda prevê poupar 2.010 milhões de euros.

As semelhanças com planos de anteriores governos são grandes na forma como o pretende fazer, já que a maior parte deste “esforço” é feito através de poupanças com juros e com consumos intermédios. Estas poupanças ao longo do período 2017 até 2020, nas contas do Governo, deveriam atingir os 2.492 milhões de euros.

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No entanto, o detalhe das tabelas é pouco. O caso mais paradigmático será o das despesas com pessoal que, apesar da anunciada redução do número de funcionários públicos que o Governo anunciou no Programa de Estabilidade para até ao final de 2019, aumentam logo em 2018. Ou seja, mesmo com a redução de funcionários públicos ainda em vigor, apesar de a um ritmo menos pronunciado que o de uma entrada por cada duas saídas deste ano, continua em vigor.

A poupança de 122 milhões de euros, de acordo com a tabela distribuída aos deputados, passa a um gasto de 122 milhões de euros já em 2018 e aumenta nos anos seguintes – 123 milhões em 2019 e 200 milhões em 2020.

O ministro das Finanças, Mário Centeno, explicou durante a apresentação do Programa de Estabilidade na conferência de imprensa que se seguiu à reunião do Conselho de Ministros da passada quinta-feira que a regra de 2 por 1 seria tornada menos exigente à medida que os anos passam, passando a ser três entradas por cada quatro saídas e depois quatro entradas por cada cinco saídas.

Para além disso, seriam colocadas em vigor medidas de incentivo à produtividade na Função Pública, que estão incluídas nesta tabela nos custos explicados acima. A única medida que o ministro anunciou como estando neste lote foi na verdade apenas o descongelamento da progressão nas carreiras dos funcionários públicos.

Poupar 150 milhões com prestações sociais?

Outra das poupanças prometidas pelo Governo a partir do próximo ano é na área das prestações. O Governo transmitiu à Comissão Europeia, ao CFP e à UTAO que espera poupar 100 milhões de euros com prestações sociais já no próximo ano e mais 50 milhões no ano seguinte, em 2018, mas não apresenta a forma como pretende fazer isto.

Numa nota lateral à tabela, o Governo refere apenas que isso deve ser feito com recurso a um maior controlo na atribuição das prestações e combate à fraude.

Na sequência das negociações com Bruxelas – no final de janeiro e início de fevereiro – a propósito do Orçamento do Estado para este ano, o Governo, para conseguir que o orçamento não fosse chumbado pelo colégio de comissários, já tinha prometido poupanças neste campo como medidas adicionais. Na altura, o Governo prometia poupar 60 milhões de euros com maior controlo na atribuição das baixas médicas, mas a Comissão Europeia só acreditava que o Governo fosse capaz de conseguir 30 milhões de euros.

O Governo prometia ainda poupanças de 50 milhões de euros com um novo sistema de declarações dos rendimentos dos chamados recibos verdes à Segurança Social, mas também aqui a Comissão Europeia acreditava que este sistema não daria mais que metade das poupanças que o Governo dizia que iria conseguir, ou seja, 25 milhões de euros.

…e mais 400 milhões de euros em impostos indiretos

O Governo mantém a redução da taxa de IVA na restauração de 23% para 13% e que a sobretaxa em sede de IRS é para desaparecer no próximo ano. Os custos também já eram conhecidos e mantêm-se: 175 milhões de euros extra no caso do IVA da restauração (custa um total de 350 milhões de euros anuais) e de 380 milhões de euros para o que resta da sobretaxa em sede de IRS.

No entanto, nas contas que o Governo enviou para Bruxelas e que deu agora a conhecer ao Parlamento, o Governo prevê encaixar mais 390 milhões de euros em receitas com outros impostos indiretos que não o IVA, que não tem detalhadas nesta tabela, dos quais 210 milhões extra já no próximo ano, e mais 90 milhões de euros por cada ano nos dois anos seguintes.

Crédito fiscal às famílias com baixos rendimentos só em 2018

O Governo prevê ainda o custo com o crédito fiscal que anunciou que irá criar para as famílias com mais baixos rendimentos. No total, são 200 milhões de euros, que só terão impacto nas contas do Estado em 2018.

Ou seja, a medida até pode ser para avançar no próximo ano, como o disse o Governo, mas só se deve refletir no ano de 2018 nas contas do Estado e dos contribuintes, provavelmente na altura de apurar o imposto.