O presidente executivo da EDP voltou a afirmar a sua oposição ao novo modelo de financiamento da tarifa social de eletricidade, que retira a responsabilidade do orçamento do Estado e a passa totalmente para as elétricas.

A elétrica estima que a fatura atinja os 40 milhões de euros, valor que pode ser o dobro se for alcançado o objetivo do governo de levar os descontos na fatura de energia a um milhão de titulares de contratos que têm rendimentos mais baixos.

António Mexia volta a invocar as melhores práticas europeias, segundo as quais estas medidas sociais são financiadas pelos impostos ou socializadas (financiadas pelos restantes consumidores de energia). Mas quando questionado diretamente pelos jornalistas portugueses sobre o que vai a EDP fazer contra esta medida que diz ser única na Europa, António Mexia responde: “Vocês conhecem a EDP, vamos trabalhar numa solução. Nós não gritamos, procuramos encontrar soluções e depois apresentamos os resultados”. Declarações que são feitas depois de António Costa, primeiro-ministro, ter agradecido à EDP por suportar esta fatura, que na verdade só vai doer a partir deste ano. As novas regras entram em vigor em julho.

O impacto da tarifa social nas contas da empresa também foi levantado pelos analistas durante a apresentação do plano de negócios para 2020, que se realizou esta quinta-feira em Londres. Outro tema sensível para a rentabilidade da maior e mais lucrativa empresa portuguesa foi a contribuição extraordinária sobre os ativos da energia.

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António Mexia realçou que a EDP aceitou ” esta medida extraordinária para uma situação extraordinária”, lembrando que a contribuição foi apresentada (pelo anterior governo) como temporária e em nome do esforço de consolidação orçamental. Aliás, a elétrica foi a única que não contestou a taxa em tribunal, como fizeram a Galp e a REN (Redes Energéticas Nacionais).

Mas quando o transitório passa a permanente e outras medidas extraordinárias são revertidas, a EDP reivindica também o fim desta contribuição, sublinhando o caráter discriminatório desta taxa sobre os ativos. “A energia é o único setor que tem um imposto sobre o investimento”. Mas também “temos noção” do que pensa o outro lado, neste caso o governo socialista, que optou por manter a contribuição sobre a energia, ao invés de a reduzir para metade como estava previsto este ano. E avisa os compromissos assumidos com os acionistas que participaram na privatização da EDP, ou seja, a China Three Gorges.

A EDP quer, contudo, ver um sinal de redução progressiva. Aos investidores a empresa sinalizou que esta taxa, responsável por uma receita da ordem dos 200 milhões de euros anuais, poderia ser eliminada até 2020. E aos jornalistas portugueses admitiu que até gostaria que fosse mais rápido. Mas o PE (Programa de Estabilidade) até 2020 é omisso quanto à eliminação desta contribuição.

As medidas fiscais e legislativas em Portugal custaram já mais de 200 milhões de euros, o grosso deste valor resulta da contribuição. António Mexia reconhece ainda que os resultados da EDP seriam outros sem estas medidas e defende que não se pode olhar apenas para o valor dos lucros e dos ativos da empresa, mas para o retorno do capital do capital investido.

Nos últimos oito anos, a EDP tem apresentado quase sempre lucros na casa dos mil milhões de euros.

Crise no Brasil não assusta

O plano para os próximos cinco anos prevê que os resultados continuem a ganhar força com investimentos superiores a sete mil milhões de euros até ao final da década. As energias renováveis vão continuar a ser foco da EDP, que mantém ainda a aposta no Brasil, apesar das dificuldades que este mercado tem vivido. Primeiro, com uma crise energética provocada por uma seca e pelo atraso na construção de centrais. E agora com uma crise política e económica que está a fazer cair a procura e a disparar os valores por cobrar.

O presidente da EDP Brasil, Miguel Setas, admite contudo que a situação económica até pode evoluir positivamente se o processo de afastamento de Dilma Roussef permitir alguma clarificação política do país. Essa é pelo menos a previsão dos analistas.

Sinal de compromisso com este mercado foi o recente aumento de capital de 1.500 milhões de reais da EDP Brasil.

Renováveis fornece multinacionais americanas

Os Estados Unidos são outra geografia de eleição, sobretudo pela estabilidade da remuneração e o baixo risco. A EDP Renováveis vindo a fechar contratos de venda de energia eólica a longo prazo com grandes empresas, como a General Motors, a Amazon e a Bloomberg, referiu o presidente da EDPR, João Manso Neto. “Não vamos inventar nada, vamo-nos concentrar onde já estamos”.

A estabilidade das regras do jogo no mercado americano foi ainda apontada como exemplo para a Europa onde são precisos investimentos de biliões euros que dificilmente serão feitos se se alterarem as regras do jogo a meio. Um recado do presidente da EDP para países como Portugal e Espanha.

“A mensagem é clara. Mais custos fixos e menos custos variáveis na produção de eletricidade”, exigem algum tipo de mecanismo que remunere o investimento em geração, quer se chame garantia de potência, que Portugal cortou nos anos da troika, ou reserva estratégica como na Alemanha. “O debate só tem uma direção”, avisou António Mexia.

Reduzir custos, mas não pessoal

Ainda nesta conferência, o gestor esclareceu que o programa de redução de custos e poupanças de 700 milhões de euros até 2020, apresentado no plano a cinco anos, não vai implicar rescisões e ou reduções de efetivos, para além dos que resultem do processo normal de reformas dos colaboradores. Mas é normal, admite, que no futuro sejam necessárias menos pessoas para as mesmas funções, por via da desmaterialização das relações comerciais. O grosso destas poupanças deverá resultar dos fornecimentos e serviços externos.

No ano em que a EDP assinala os 40 anos, a empresa estabeleceu ainda o objetivo de ser mais feminina, quer reforçar em 15% o número de trabalhadoras que atualmente representam 24% dos 12 mil trabalhadores a nível global.

A jornalista viajou para Londres a convite da EDP.