A pergunta é simples: e se, numa dada localidade, se verificar que não há necessidade de haver demasiada oferta para o número de alunos, o Governo deve optar pela escola pública ou pela particular com contrato de associação? “Deve terminar o contrato com a particular e defender a escola pública”, responde Maria de Lurdes Rodrigues. “Temos de ver qual serve melhor os interesses das famílias e qual tem melhor desempenho”, responde Marçal Grilo.

Dois ex-ministros da Educação de Governos PS, mas duas respostas diferentes sobre a discussão do momento. Maria de Lurdes Rodrigues não tem dúvidas sobre a decisão do atual Governo de avaliar a situação dos contratos de associação no ensino particular e cooperativo. “O que este Governo está a fazer é a controlar danos”, diz ao Observador, acusando o anterior Executivo de ter “escancarado a porta ao aumento de despesa pública”, ao alterar as regras destes contratos que os socialistas tinham restringido nos anos anteriores.

O anterior Governo cedeu em toda a linha e aumentou os custos por turma e alterou a lei de regulação do ensino privado, que definia critérios para atribuição de contratos. Aboliu critérios para celebração de contratos e também acabou com os mecanismos de controlo de avaliação do ensino”, acusa a ex-ministra.

O atual ministro, diz Maria de Lurdes Rodrigues, “está a rever os contratos um a um tendo em vista o controlo da despesa pública. Não é ilegal nem é ilegitimo”. “Estes contratos comprometem a despesa pública nos cinco anos seguintes”, avisa.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Já Marçal Grilo, que teve a tutela da Educação entre 1995 e 1999 (era António Guterres primeiro-ministro), não entra pelo ataque ao Governo anterior, nem pela defesa do atual. “O debate está muito distorcido”, diz o ex-ministro ao Observador, defendendo que “nem umas nem outras devem ter privilégios, na hora de optar pelo público ou pelo privado. “Neste momento há que racionalizar a rede e isso deve fazer-se fechando escolas estatais”, sejam as públicas, sejam as com contratos de associação — o ex-ministro insiste que ambas são estatais.

Temos vindo a assistir a um confronto entre a defesa da escola pública — que se confunde com escola estatal, que engloba também as privadas e o ensino cooperativo — e a defesa do ensino particular. Não estou nem de um lado nem do outro”, diz o ex-ministro.

“Por que se criaram os contratos de associação? Fizeram-se quando o sistema educativo teve de dar resposta ao aumento demográfico. Criaram-se condições para as escolas privadas poderem albergar estudantes”, argumenta Marçal Grilo para logo a seguir dizer que “o que acontece hoje é que o número de alunos está em decréscimo constante. As escolas estatais têm fechado às centenas”, afirma.

E neste ponto os dois ex-ministros socialistas encontram-se, nenhum se choca com o fecho de escolas. “A rede de escolas não é estática, como a população também não é”, sublinha Marçal Grilo. Maria de Lurdes Rodrigues coloca estas decisões de encerramento de escolas de ensino público como argumento para desvalorizar decisões sobre o ensino particular. Durante o seu mandato como ministra (de 2005 a 2009), a rede escolar foi reajustada e fecharam 2.500 escolas do primeiro ciclo do ensino básico.

Os dois estão também de acordo sobre uma questão que tem sido usada como argumento à direita. A revisão dos contratos de associação reduz a liberdade de escolha. “Não tem nada a ver com a liberdade de escolha. Os contratos de associação fizeram-se para cobrir a rede, tal como se fossem escolas públicas”, diz Marçal Grilo.

“Não há liberdade de escolha nenhuma, não são as famílias que ficam com a liberdade de escolher as escolas, mas as escolas que ficam com liberdade de escolher os melhores alunos”, para não arriscarem posições nos rankings, defende Maria de Lurdes Rodrigues.

E Marçal Grilo ainda acrescenta mais um tiro à argumentação da direita, nomeadamente à acusação de se estar a tentar atacar a Igreja Católica, impondo limites que também se aplicam a escolas Católicas que têm contratos do mesmo género. “Sou católico, não me sinto nada afetado por isto”.

Os dois ex-ministros dos Governo PS não têm dúvidas de que há necessidade de rever a rede de escolas, a diferença fica no alvo desta decisão. Se Maria de Lurdes Rodrigues não mostra dúvidas sobre que estabelecimentos deve o Estado proteger, Marçal Grilo pede uma decisão baseada “no resultado do trabalho das escolas e no bom senso, que não é inimigo do Estado de direito”, afirma.